Ser do Sporting é cada vez mais ser contra qualquer coisa. Estamos a fomentar uma identidade de sócio e adepto invertida, que funciona sempre por oposição a algo. Descartes teria alguma dificuldade em processar isto, mas será qualquer coisa como um “sou contra isto, logo…devo ser a favor de alguma coisa”. A verdade é que se torna cada vez mais difícil saber como criar uma base estável de diálogo entre os sportinguistas, entre adeptos que há muito já deixaram de se preocupar com as consequências que estas batalhas terão para o futuro do clube.

A intriga ou aquilo que podemos chamar como a sectarização informal e formal dos adeptos, nunca foi tão evidente no universo leonino. Apesar de achar até bom que todos partilhem a sua visão, que a debatam e que a confrontem junto de outros, chamo particularmente à atenção dos mais ingénuos e menos informados, que há muita gente interessada a patrocinar certo tipo de linhas de pensamento, com firme vontade de criar um caldo de contestação tão apurado que os venha a colocar na linha da frente de uma sucessão. Será errado que o façam?

Idealismos à parte, ter poder ou chegar ao poder terá sempre uma base de confronto associada. Isso não está errado, é simplesmente uma condição natural ao processo de agregação de confiança. “Eu sou mais hábil que aquele” ou “eu sou mais forte que aquele” sempre foi e será a forma de definir uma liderança. Mas causa-me espécie que este princípio se estabeleça cada vez mais através da desinformação e não da constatação de factos comprováveis. Denegrir outros para que a opinião se concentre no “mal menor” não é bem o paradigma do funcionamento democrático. Esta reflexão nunca fez tanto sentido como na atualidade do status quo do Sporting.

As redes sociais são o palco ideal para esta “guerra suja”, para facções “desinteressadas” congregarem oposição “contra” alvos específicos. Vale tudo para denegrir o próximo. Verdades, mentiras, meias-verdades, meias-mentiras…há todo um caudal de ódio a percorrer os likes e as partilhas, todo um dispersar de “pós-verdades” alimentadas com um fim específico e muito determinado. Quem consegue separar a “opinião genuína” de “cartilha” afasta-se destes canhões de toxicidade, quem não consegue, lentamente transforma-se numa câmara de ressonância do “contra”, cada vez mais incapaz de entender que a sua oposição promove objetivos ou propósitos que não conhece, mas existem.

A única solução que vejo racional é parar este ciclo de destruição. Parar de estimular o ódio e a rejeição como ferramentas únicas de viver o Sporting. A solução nunca poderá ser continuar a alimentar a divisão, esperando que por artes mágicas alguém desça dos céus e se torne magneticamente superior ao estado geral de desacordo e divisão. O que vejo como lógico é construir, é pensar, idealizar, planear, trabalhar – não contra alguém – mas a favor do que acreditamos ser um caminho válido e necessário. A democracia é um sistema falho, mas alberga espaço interminável para aquilo que se chama “alternativa”.

Em vez de continuamente nos imaginarmos como agentes marginais de uma qualquer resistência, a minar ou denegrir o status quo ou quem contesta o mesmo, porque não imaginarmo-nos como patrocinadores de um novo Sporting? Porque não juntarmo-nos à volta da ideia do clube que sempre desejámos, do Sporting que vive dentro de nós e que nunca vemos espelhado dentro do clube. O que nos impede de recusar a via do ódio e abraçar a luta pelo amor ao clube, não elegendo a guerra contra ninguém, mas a batalha a favor do Leão Rampante? O que nos impede de arregaçarmos as mangas e por uma vez tentar criar uma alternativa às sucessões de propostas assentes no poder e não no talento, assentes no Esforço, assentes, assentes na Dedicação, assentes na Devoção e sempre assentes na Glória? O que nos impede?

Dará infinitamente mais trabalho que fazer tweets e posts no facebook a ridicularizar pessoas, a duvidar de notícias ou a navegar na indignação crónica, mas o real fruto desta construção, desta tentativa de trabalhar em função de um bem global, não será mais objectivo, mais útil e mais recompensador? Não será já mais que tempo que coloquemos a nossa paixão clubística ao serviço de um património que sirva para mais que apenas odiar estes ou aqueles? Não será esta a única via eficaz para contrariar as lógicas de sucessão de pessoas e não de projectos vazios? Não será este o caminho mais simples para colocar os parasitas de linhagem fora da agenda do Sporting? Não será mais forte e confiável a junção de valor de pessoas que defendem uma ideia do que passar os dias à procura de “alimento” para contestar ou despromover quem achamos ser da espécie errada de Sportinguismo?

Eu creio que sim. E lembro aos mais descrentes, desacreditados e desapaixonados que o paraíso pode estar sempre ao virar da esquina, mesmo para os que acham que estão condenados ao inferno. É na força das ideias, na capacidade humana e no respeito por um emblema mais que centenário, que esta nossa geração provará o seu valor e a capacidade para levantar a peida do sofá e…construir o Sporting que os nossos filhos e netos herdarão.

*às quartas, o Zero Seis passa-se da marmita e vira do avesso a cozinha da Tasca