Ainda me lembro como tudo começou desde tenra idade. Um amor desmesurável, sem igual. Parava tudo o que estava a fazer para te ver jogar. Ainda não tinha ido uma única vez a Alvalade e já vibrava eloquentemente com as tuas vitórias e chorava nas derrotas, mas sempre com um orgulho tremendo em ser Leão, independentemente de qualquer tentativa de chacota à qual respondia com uma defesa incessante deste amor.

Baptizado com o associativismo leonino desde os 4 meses de idade, o ponto máximo foi atingido com a estreia a ver o Sporting Clube de Portugal ao vivo. Um Sporting CP vs União Desportiva de Leiria há precisamente 20 anos, em que a equipa venceu por 2-0 com 2 golos do Matador Beto Acosta, numa época em que viemos a quebrar um jejum de 18 anos sem sermos campeões nacionais. Não podia ter pedido melhor época para ir ao nosso paraíso terreno.

Não há palavras para descrever o orgulho que era estar com o leão rampante e levá-lo comigo para todo o lado. A genuinidade e a inocência de uma criança que vibrava com todas as modalidades do clube, mesmo sem ter a sorte de poder vê-lo ao vivo com a frequência que desejava.

2001/02, provavelmente a melhor época que vivi como Sportinguista. Uma época em que éramos pujantes com o grande André Cruz a comandar as operações na defesa, dois laterais de topo, um meio campo equilibrado e um ataque temível com João Vieira Pinto a fazer sociedade com Mário Jardel e Marius Niculae. Bons velhos tempos… Neste mesmo ano, tive o privilégio de fazer uma visita de estudo ao Estádio José Alvalade, onde tive o privilégio de pisar o relvado e marcar um golo numa peladinha que a guia permitiu que a minha turma fizesse num dia chuvoso para compensar a mágoa de o treino da equipa principal ter sido adiado para a tarde. No entanto, permitiu que fossemos à antiga nave, onde pudemos ver de perto a equipa de Andebol, em que se destacava o Ricardo Andorinho, jogador que admirava imenso. Um dia que jamais esquecerei apesar do autógrafo que consegui, se ter perdido no tempo e de não ter uma foto que pudesse perpetuar aquele dia que estará para sempre guardado na minha memória e no coração.

Fui crescendo e, infelizmente, rapidamente percebi que nem tudo no desporto era um mar de rosas e que era preciso resiliência e ter muito estômago para ver campeonatos perdidos devido a golos marcados com a mão na nossa casa e a títulos perdidos com penaltis assinalados contra o clube, com base numa bola no peito fora de área. Estar a ver um jogo de juniores em Alcochete e ver pedras a chover na direcção dos adeptos leoninos, saber que houve um adepto do Sporting assassinado num estádio e não houve nenhuma acção veemente na defesa da essência do desporto e dos verdadeiros amantes do desporto, tornou-se deveras chocante e intrigante.

Apesar de tudo, continuava a vibrar com o Sporting, mesmo sem o número de títulos desejado, mesmo nos momentos de adversidade e sem poder ver sempre ao vivo todos os jogos de todas as modalidades do clube como sempre desejei. A saudade de Sporting era amenizada pelas vezes que familiares e amigos cediam a gamebox para poder saciar esta vontade de ver o Grande Sporting. A todos eles, uma palavra de gratidão por me terem ajudado a incutir, a fomentar e a aprimorar o Sportinguismo.

O olhar genuíno para o desporto foi-se esfumando à medida que ia observando os interesses que pairam no desporto em Portugal, e não só. Contudo, a inocência permanecia e continuei a acreditar seriamente de que uma verdadeira união poderia derrubar os interesses no desporto. Mesmo no decorrer da época em que o Sporting caminhava para a pior classificação de sempre, nunca deixei de acreditar e defender incessantemente o clube.

Foi nessa mesma altura que apareceu um ”maluco” que começou por dar um murro na mesa, galvanizar os adeptos, incentivá-los a ser pro-activos e novos raios de esperança chegaram ao universo leonino. A aposta na formação leonina voltou a ser uma realidade, a gestão passou a ser mais cuidada, o passivo começou a descer e a entrega desse ”maluco” era um espelho dos adeptos que sempre se mantiveram fiéis ao clube mesmo nos momentos de tormenta.

2014/15
Depois de uma época extremamente positiva após um ano horroroso, conseguimos conquistar a glória na Taça de Portugal com base no esforço, na dedicação e devoção. Mesmo numa época com altos e baixos, haviam jogadores que personificavam os atributos com que os adeptos se identificavam e faziam com que a crença na equipa fosse uma realidade.

Mentalidades revigoradas, voltávamos a incomodar e na comunicação social deixara-se de ouvir a frase banhada de hipocrisia ”faz falta um Sporting forte ao futebol português”, um de muitos sinais de que o clube retomara o caminho certo. Fruto disso, e após anos de interregno sem ser associado por não ter autonomia financeira, voltei a associar-me de novo com muito esforço financeiro da minha parte.

2015/16
Via novamente uma equipa em que acreditava, que dava gosto ver jogar, sabia que não era fácil, mas estava cada vez mais perto de voltar a celebrar o tão ambicionado título nacional. As ”boas aventuranças” nos bastidores do futebol português impediram-nos de comemorar, mas não há dúvidas de que vivemos momentos sem igual nessa temporada, ao contrário de outras muito penosas.

Seguiram-se duas épocas em que tínhamos plantel para almejar o tão desejado título, mas tal não foi possível por múltiplas circunstâncias. Mesmo apesar dos intentos, continuei a acreditar no rumo traçado e decidi recuperar os anos de associativismo perdidos e que correspondiam à eloquência e fidelidade que sempre tive depois de conquistar a autonomia desejada.

Meses depois surgiu uma hecatombe inesperada que manchou o orgulho leonino, uma hecatombe que ainda hoje suscita várias interrogações e dúvidas. Mas adiante…

Depois de tudo isto, procurei manter o foco e a compostura, mesmo sabendo que o clube poderia enveredar por caminhos indesejados, uma vez mais. Procurei ter a assiduidade que nunca pude ter e conquistei por mérito próprio, aproveitar ao máximo a nossa casa das modalidades que contribuí juntamente com muitos outros Sportinguistas para que ganhasse forma e para não virar as costas às modalidades que personificavam tão bem o que é ser Sporting Clube de Portugal. Decidi dar o benefício da dúvida, mas cedo percebi que não haveria um futuro risonho, mesmo que pelo meio tivéssemos alcançado conquistas importantes.

Mas há algo que as conquistas não trazem, o respeito e orgulho de tudo o que envolve o Sporting Clube de Portugal. No meio disto tudo, discuti com amigos, surgiram novas amizades, outras foram-se perdendo, mas foi tudo dito e feito com base naquilo que considerava ser benéfico para o clube.

Nem sempre foi possível ser frio como desejava a lidar com determinadas situações, mas no entanto acabei sempre por reconhecer quando não estive tão bem e tentar que tudo servisse de aprendizagem futura.
O Pavilhão João Rocha passou a ser um refúgio e um abrigo para viver Sporting, o estádio representava uma memória de amargura pelo contraste com o passado recente.

Contudo, por muito amor, resiliência e foco que se tenha, há sempre coisas incontroláveis e com as quais não dá para lidar sem se manter um certo distanciamento. Começaram as perseguições, os dirigentes deixaram que o mau ambiente se alastrasse ao Pavilhão pelas ordens tiranas que deram aos responsáveis de segurança nos últimos tempos e gerou-se um efeito bola de neve.

Começou por revistas e ordens para proibir objetos permitidos na lista facultada para os adeptos, em jogos onde nem sequer haviam adeptos rivais e em que não podiam alegar alto risco. Pedidos para que estivessem 30 polícias de intervenção em jogos onde não havia um único adepto rival e onde se preparavam para exercer abuso de força, unicamente devido ao facto de serem exibidas faixas com nomes de claques.

A política de desgaste e saturação incrementou-se e passaram para a revista de cachecóis, um modus operandi similar ao de uma ditadura pura e a contrastar com o regozijo da comunicação social e Governo, de que Portugal é o 3º país mais pacífico do mundo.

A gota de água foi o facto de, no passado dia 18 de Dezembro. Ter-me dirigido educadamente à zona da guarda de materiais, num dia de temporal em que cheguei quase em contra relógio, depois de um dia de trabalho. Pedi para me fazerem o favor de guardar o chapéu de chuva. A resposta que obtive foi a de que não guardavam guarda chuva e pediram-me que saísse, depois de ter apelado ao bom senso e que não custava nada guardarem, quando o espaço é consideravelmente grande e bastaria colocar um autocolante e fazer um registo simples.

Fui para o pavilhão, fui revistado por um segurança com quem já falei várias vezes e que me disse educadamente que não poderia entrar com ele para o pavilhão. Eu disse que tinha conhecimento e deixaria no lado esquerdo do pavilhão por trás das baias de segurança, algo que acontece frequentemente e que não põe nada em risco, tudo se resume a bom senso e ao qual o mesmo respondeu afirmativamente.

No entanto, depois de passar por dois seguranças e de ter dito boa tarde a todos, uma segurança decide ser reles e dirigir-se a mim com arrogância, respondendo às saudações com ”o chapéu não entra aqui”. Eu disse que iria deixá-lo no sítio do costume, que sempre deixaram que ali ficasse, ao qual a mesma responde novamente com prepotência dizendo que não entrava.
Esgotado com a falta de respeito e consideração por parte de indivíduos a quem pago salários e que não demonstram qualquer tipo de ética, deitei o chapéu de chuva e disse para ela o meter lá fora então.

Após essa acção, sou interpelado por dois agentes de autoridade que me disseram para me dirigir com educação e aos quais respondi que já havia me dirigido com educação 3 vezes e que estava saturado pelos episódios constantes de abuso de autoridade e falta de bom senso nos palcos desportivos, quer pelos dirigentes, quer pelas forças de segurança. Um deles diz que percebe e que me devia manifestar, não indo aos recintos desportivos ou usando livros de reclamação, se já sei que a direcção é assim.

Respondi novamente, questionando se tinha de ficar privado de apoiar o meu clube por tiranos abusarem da autoridade e dizendo que não respondem a qualquer tipo de reclamação. O agente não me soube dar qualquer tipo de resposta, previsível…Fui lá fora e atirei o chapéu para o chão da rua depois de nem no caixote do lixo me terem deixado colocar o chapéu de chuva. Surreal… Mas no meio de tudo, o chefe de segurança decidiu aparecer e dizer para eu parar de ser mal educado e ir ver o jogo. Pergunto-me o que ele merecia, quando ele e outros não revelam qualquer tipo de noção do espectáculo desportivo e enxovalham as pessoas que lhes dão trabalho e ajudam no seu ganha pão…

Entrei completamente revoltado para o pavilhão, ao ponto de nem sequer conseguir cantar O Mundo Sabe Que e de estar completamente alheado do jogo por pressentir que não me queria sujeitar mais a isto.

É triste estar num espaço que significava o refúgio e vivência de Sportinguismo e até este espaço ter sido convertido em martírio pela forma como maltratam os associados do clube.

Por muito que doa, não voltarei a frequentar qualquer tipo de recinto desportivo por tempo indeterminado, para não incorrer em qualquer tipo de revolta que me possa prejudicar a vida. Fico extremamente revoltado por estes pseudo agentes desportivos não terem a mínima noção do esforço que uma pessoa faz para ter a assiduidade que tenho e chegou a hora de me afastar por completo para bem da minha sanidade mental.

E não é só por estes motivos que cheguei a esta decisão. Deve-se, também, ao facto de estar farto da mesquinhez de algumas pessoas, que tentam transformar o meu orgulho em pavoneio e arranjar defeitos porque causo incómodo. Poder viver imensos jogos do clube de perto, depois de ter estado privado de o fazer por motivos alheios à minha vontade, é um motivo de grande orgulho para mim. Ter conseguido a autonomia por mérito próprio, sem depender de outros era um desejo e foi com suor que atingi isso mesmo. Falam muito de peito cheio, sem saber o que é trabalhar na vida para atingir o que quer que seja, se tenho este orgulho é porque trabalhei para isso. Quando souberem o que é estar em Lisboa às 23h, sair para o Sudoeste de África, sair de lá de madrugada e chegar a Lisboa para ver um jogo do Sporting a fazer direta após tantas horas de trabalho, avisem. Vozes de burro não chegam ao céu e deviam pensar que não vão ter sempre os papás e os avós para vos sustentar.

A mim ninguém me dá lições de vida. Fiquem com as guerrilhas e o deserto de valores que vos assiste, no vosso mundo em que são sempre donos e senhores da razão. Vão afundar o clube com esta futilidade múltipla e eu não ficarei para assistir.

Bem haja se ainda existir alguém que consiga salvar isto do descalabro total e me faça considerar voltar a vibrar com o clube e com o desporto em Portugal, mas não tenho muita fé nisso, mataram-na… Só pagarei quotas por enquanto, por respeito a atletas das modalidades que deixam tudo no terreno de jogo e para lutar nos locais onde não me conseguem calar. Até breve ou até sempre.

Um grande abraço para todos aqueles que merecem toda a consideração e que não vêem o Sporting como um entreposto para colher contrapartidas financeiras ou promocionais. Foi um prazer conviver com todos vós.

Texto escrito por Leão Eterno no site Rugido Verde

*“outros rugidos” é a forma da Tasca destacar o que de bom ou de polémico se vai escrevendo na blogosfera verde e branca