O ano passado, na Madeira, este ano, nos Açores. O Sporting voltou a sentir o sabor de uma derrota interna pela primeira vez, numa visita às ilhas, e se na época passada ficou fora da Taça, este ano tem tempo para perceber o som das sirenes e corrigir o que há para corrigir

 

“Algum dia isto teria que acontecer”. As palavras são de Palhinha e, acredito, terão povoado as mentes de muitos de nós mesmo antes do médio as proferir, mesmo que nada o fizesse prever quando o médio arrancou um remate seco de fora da área, levando a bola a ganhar velocidade na relva e a entrar na baliza antes que o redes tivesse tempo de lá chegar.

Aos 10 minutos de jogo o Sporting adiantava-se no marcador e tudo parecia bem encaminhado para uma jornada onde, mesmo sem Amorim no banco, os Leões conquistarem mais três pontos. Acontece que, ao contrário do que normalmente acontece, o golo não foi o mote para os verde e brancos pegarem no jogo, até porque do outro lado esteve uma equipa extremamente agressiva com e sem bola (basta ver o número de faltas final), capaz de desassossegar o campeão constantemente, nomeadamente pelo lado direito.

É impossível passar ao lado do peso que essa ala, órfã de Pedro Porro, teve no desfecho da partida. A atacar, Sarabia recebia muitas vezes aberto no corredor direito, pedindo a presença de Esgaio em zonas interiores. Esse movimento aconteceu no remate de Palhinha que abriu o contador, mas esse é um movimento que resulta da incapacidade de Esgaio de ganhar a linha ou de partir para o 1×1, algo em que Porro é o melhor da nossa Liga e onde até o puto Esteves é bem melhor que o nazareno. Claro que pode dizer-se que a equipa se torna mais imprevisível, mas perde Sarabia como homem a explorar o espaço entre os centrais e os laterais. A defender, então, “foi a morte do artista”. Jean Patric, o endiabrado Lincoln e o homem com nome de shapoo da década de oitenta, foram caindo tantas e tantas vezes sobre um Esgaio numa das noites mais miseráveis de que há memória (está nos três golos sofridos), que o próprio Neto acabou por ser arrastado para esse buraco que ia ficando cada vez maior.

Cryzan ameaçou uma vez, furando como quis antes de mandar uma biqueirada, Patric jogou ao toma lá dá cá com Lincoln antes de falhar na cara de Adán, e à terceira foi mesmo o Patric a ficar a rir, depois de um cruzamento a não sei quantos metros de distância ao qual Esgaio respondeu com um momento de contemplação.

Perdendo a vantagem, o Sporting teve o seu melhor período na partida, algures entre os 30 e os 40 minutos. Encostou o Santa Clara lá atrás, rodou a bola, encontrou espaço para marcar. Mas não marcou porque as sirenes que andam a tocar em redor da cabeça de Peter Potter voltaram a acender-se. O homem que tantas e tantas vezes foi o abono de família leonino, o rapaz que faz passes para a baliza que acabam em golo, teve dois festejos na chuteiras e mandou-os para parte incerta, impedindo o Sporting de chagar ao intervalo em vantagem.

O 28 redimiu-se logo a abrir a segunda parte, metendo açúcar na assistência para Sarabia, com o espanhol a marcar um golaço, rematando cruzado com o pior pé, sem deixar a bola cair. O Sporting voltava a adiantar-se, mas cerca de 20 segundos depois da bola ter ido ao meio campo, chegava o 2-2, num momento que resume bem a estranha ausência de intensidade com que os verde e brancos se apresentaram nesta partida: em 12 segundos a bola vai da linha lateral esquerda à direita, com direito a regressar ao meio para o remate de Lincoln. Mais ridícula, só mesmo a forma como surge o terceiro golo, um pontapé do caraças de um tal Ricardinho que não volta a fazer outra tão cedo, mas que nasce de uma perda de bola a meio campo capaz de tirar anos de vida ao mais saudável adepto leonino.

Nos 25 minutos que mediaram esses dois golos, Tabata veio para o lugar de Neto, assumindo com total inoperância o papel de falso lateral que no fundo seria extremo, numa opção táctica que puxou Esgaio para terceiro central (porquê? para quê?) e deixou muitos de nós a pensar porque raio Gonçalo Esteves continuava no banco. Sarabia quase marcou novamente, Cryzan também ameaçou, mas a imagem que ficava era de um Sporting esquisito, nomeadamente no processo defensivo que sempre foi uma das suas maiores armas e que, depois do que se viu no jogo contra o Portimonense, voltava a ser colocado em causa nos Açores (sofrer em dois jogos tantos golos como os sofridos nas 15 jornadas anteriores, é algo que merece reflexão interna).

E depois da cambalhota no marcador, Coates lá foi para ponta de lança, aquela solução que continua a ser a única quando é necessário alguém que faça o que Paulinho raramente faz, mesmo que no banco esteja um Tiago Tomás que parece totalmente descartado para essa posição. O capitão tentou tudo, desde vir marcar lançamentos de linha lateral para acelerar o processo até oferecer o empate a Paulinho quando faltava um minuto para os descontos dos descontos e o Sporting já jogava com dez por expulsão de Daniel Bragança, que além de ter sido lançado demasiado tarde ainda foi a tempo de entrar de sola e ver vermelho directo.

E foi neste mar de equívocos e de falta de intensidade, que o Sporting saiu derrotado.O ano passado, na Madeira, este ano, nos Açores. O Sporting voltou a sentir o sabor de uma derrota interna pela primeira vez, numa visita às ilhas, e se na época passada ficou fora da Taça, este ano tem tempo para perceber o som das sirenes que tocam há dois jogos consecutivos e corrigir o que há para corrigir.