Num jogo onde teve que dar o que tem e procurar o que não tem, o Sporting empatou 2-2 com o Arsenal e manteve viva a chama da esperança na Liga Europa 

Quando escreveu a canção que dá título a esta crónica, Phil Collins enfrentava um processo de divórcio que o afastou da mulher e do filho, transformando o vazio que sentia num dos temas emblemáticos dos anos 80. Ora, foi precisamente em sentimento de afastamento entre Clube e Adeptos, que o Sporting recebeu o Arsenal, líder da Liga inglesa e uma das mais entusiasmastes equipas da actualidade, em partida a contar para a primeira mão dos oitavos de final da Liga Europa.

O final de tarde que se viveu em Alvalade acabou por ser, para mim, a primeira conquista desta equipa. Há largos meses que não se sentia um ambiente assim em Alvalade, mesmo que apenas tenham sido ocupadas 36 mil cadeiras, duas mil delas por ingleses, e, sou-vos sincero, fazia-me falta um jogo em que sentisse a voz a faltar-me.

Com o favoritismo todo do lado dos ingleses, até foi o Sporting o primeiro a estar perto do golo, ainda com as bancadas muito despidas e com milhares de adeptos, eu incluído, à espera de entrar. Pote meteu Jorginho no bolso, veio para dentro e ensaiou um remate em arco daqueles remates em arco que o Pote fazia e que entravam sempre. Passou ao lado.

Aos poucos, o Arsenal foi tendo a bola, naquela pinta de escola guardioliana, gerindo ritmo, quase sempre médio baixo, até ensaiar trocas de pé para pé que aceleravam a chegada à área adversária. Saka e Reiss estavam encarregues dos esticões, mas acabou por ser na sequência de um canto que os ingleses se adiantaram no marcador, com Saliba a saltar completamente sozinho no coração da área.

Coates reclamou o agarrão a Matheus Reis e viu amarelo, momento que parece ter catapultado o capitão para uma primeira parte onde limpou tudo o que havia para limpar, sempre bem acompanhado por Gonçalo Inácio, impecável a jogar em antecipação, e por Juste, que parece ter exorcizado as lesões e começa a mostrar ser um central de gama alta.

Foi quando estes três homens subiram um pouco, empurrando o resto da equipa para uma pressão mais alta, que o Arsenal começou a sentir-se mais desconfortável e a cometer alguns erros. Inácio ensaiou um remate de longe, o redes defendeu para canto e o camisola 25 completou a ideia inicial, desta vez de cabeça, numa espécie de remate do golo inglês, desta vez a favor dos verde e brancos. 1-1 e primeira grande explosão de alegria em Alvalade.

Edwards, que tinha marcado o canto, ensaiou novo remate de longe, obrigando o redes e ir ao relvado, antes de ficar a trocar pensamentos com Paulinho enquanto a bola pedia uma buja ali no meio da área. Do outro lado, novo canto marcado em modo balão controlado, com Adán a segurar mesmo em cima da linha. Foram os últimos momentos de relevo até ao final dos primeiros 45 minutos, onde o Sporting tinha feito das fraquezas forças e, mesmo com Trincão e Paulinho a serem incapazes de servir de elos ou de esticar o jogo, tinha conseguido manter tudo em aberto.

O ritmo mudou no segundo tempo, e logo a abrir Zinchenko colocou Martinelli na cara de Adán, com o redes leonino a fazer uma daquelas manchas que é festejada como se num jogo de futsal estivéssemos. O cenário ampliou-se quando o mesmo Martinelli foi por ali for, correu meio campo, deixou dois pelo relvado, contornou Adán e quando os bifes já se ajeitavam para gritar, apareceu Juste a cortar e a festejar como se estivesse a imitar o João Matos.

Pelo meio, Edwards assumiu ser o mais talhado para proporcionar futebol champanhe e fez um passe YouTube para Pote. O 28 não hesitou em disparar, o redes defendeu, a bola sobrou para a pequena área onde Paulinho encontrou o caminho para a felicidade. Abraços, sorrisos, punhos no ar, que eles até caem quando Alvalade assim festeja. 2-1.

O mesmo Paulinho teve as portas do paraísos abertas, quando, isolado por Pedro Gonçalves, decidiu tentar meter a bola em arco ao ângulo e acabou a meta-la na bancada. Alvalade colocava as mãos na cabeça, antes de meter os dedos à boca para ampliar o assobios a uma equipa de arbitragem que vestiu na perfeição o fatinho de quem quer favorecer a equipa que todos esperam que passe. A falta sobre Pedro Gonçalves é clara, antes do remate que tabela em Morita e acaba dentro da baliza para o 2-2, sendo realmente inacreditável que o lance tenha estado em análise no VAR e tenha sido validado.

Os ingleses voltaram a impor o ritmo, conservando um resultado que não lhes desagradava, o Sporting entrava na dança das substituições (e a de Fatawu terá direito a post próprio) sem tirar daí grandes dividendos, pese toda a vontade de quem vestia a verde e branca, lutando contra todas as probabilidades.

A determinado momento, também os Leões perceberam que não havia pernas, nem força, nem qualidade para ir lá mais para a frente, e que era preferível guardar a alma para segurar o 2-2, já com um Diomande cheio de pêlo na venta em campo, e com Juste a lateral direito, tentando estancar aqueles movimentos dos gunners que lhes permitiam entrar constantemente por aí.

A batalha vai para intervalo empatada, e resta esperar que os jogadores tenham interiorizado a mensagem com que os adeptos se despediram deles no final: nós acreditamos em vocês, mesmo que tudo pareça indicar em sentido contrário.