A nível interno o Sporting dominava a seu bel-prazer, mas o futebol português continuava a atrasar-se em relação ao que se fazia lá fora, principalmente agora que a paz tinha voltado ao mundo. Assim a Direção concluiu que seria necessário ter uma equipa de reservas com um nível próximo da dos titulares, mas por outro lado o preço das transferências em Portugal atingira valores incomportáveis, principalmente atendendo ao facto do Sporting estar empenhado no projeto do novo Estádio.
A aposta num trabalho mais profundo na área da formação, ou na contratação de jogadores estrangeiros eram assuntos na ordem do dia, mas mesmo assim o Sporting conseguiu algumas aquisições, com destaque para Hugo um jovem extremo de Vendas Novas que já estava a treinar no Clube desde a temporada anterior e principalmente para João Galaz que veio do Vitória de Setúbal como a contratação mais cara da época. Para além disso Lourenço chegou do Vitória de Guimarães por troca com Rola, enquanto Bento Couceiro regressou do Luso do Barreiro e ainda foram recrutados mais alguns jovens que não se conseguiram impor.
A nível de saídas Décio Mendonça e Gervásio foram dispensados, enquanto o veterano Veríssimo era mais um histórico a chegar ao fim da linha.
Álvaro Cardoso passou a ter uma maior intervenção no que diz respeito aos treinos, enquanto o Mestre Joseph Szabovalidou a contratação de Janos Hrotko e de Iosif Fabian, dois experientes internacionais húngaros que vieram para o Sporting não só como jogadores, mas também para ajudar como treinadores assistentes nas camadas jovens. Curiosamente logo se levantaram vozes contra a contratação de jogadores estrangeiros, isto numa altura em que já havia muitos a jogar em diversos clubes portugueses.
Este foi um campeonato que teve um início penoso para o Sporting, que foi assolado por um invulgar número de lesões e castigos, terminando vários jogos em inferioridade numérica. Joaquim Pacheco e Albano tinham sido operados no final da época anterior e ainda estavam em recuperação, Iosif Fabian lesionou-se logo na 1ª jornada, Armando Barros, Caldeira, Vicente Camilo, João Martins e Janos Hrotko também sofreram lesões que os afastaram da equipa durante algum tempo, enquanto Travassos esteve 6 jogos de castigo, 4 deles por responder a uma agressão de um adversário e outros 2 por protestos no final jogo do Porto, castigo que também foi aplicado a Vasques e Armando Barros. Janos Hrotko também teve um jogo de castigo depois de ser expulso na Covilhã.
Com tantos impedimentos a equipa sofreu constantes alterações, principalmente no ataque onde há que referir o facto de Hugo ter agarrado o lugar de extremo direito, que estava em aberto desde o abandono de Jesus Correia. Inicialmente Iosif Fabian ocupou a posição de avançado centro, derivando João Martins para o lugar de extremo esquerdo, enquanto Janos Hrotko fez várias posições e até João Galaz jogou no ataque. Lá atrás Vicente Camilo foi o escolhido para a posição de defesa esquerdo, que ocupou até se lesionar, enquanto no meio campo João Galazcomeçou a afirmar-se, aproveitando os impedimentos de Armando Barros.
Nas primeiras nove jornadas do campeonato o Sporting perdeu três vezes e empatou uma e depois da polémica derrota na Tapadinha ficou no 5º lugar da classificação a 3 pontos do líder de então, o Belenenses. Assim, no dia 22 de Dezembro de 1953 Álvaro Cardoso pediu a demissão, uma situação que inicialmente foi olhada com algumas reservas da parte da Direção que estava em fim de mandato, mas depois das goleadas sofridas nos jogos do Natal frente aos clubes argentinos que visitaram Lisboa, a situação tornou-se insustentável e Góis Mota aceitou a saída do Orientador Técnico do futebol leonino, que no início do ano foi substituído pelo Dr. Tavares da Silva, um distinto jornalista que já tinha sido Selecionador Nacional e que veio trabalhar com o velho “mestre” Joseph Szabo que se manteve como treinador.
Esta mudança de comando que foi classificada pelo Presidente do Sporting como uma chicotada psicológica resultou em cheio. Tavares da Silva recuou João Galaz para a posição de defesa esquerdo e Janos Hrotko passou jogar como médio direito, enquanto o ataque beneficiou com os regressos à boa forma de Travassos e João Martins e da afirmação de Mendonça no lugar de extremo esquerdo, substituindo a contento o azarado Albano, que depois de regressar tinha voltado a lesionar-se.
Ano novo, vida nova, e daí até ao final do Campeonato foram 14 vitórias e 2 empates, que levaram o Sporting ao seu 9º título nesta prova. Bastaram três jogos sob a nova liderança para os Leões alcançarem o Belenenses no topo da tabela classificativa, depois de derrotarem o Benfica na última ronda da 1ª volta. Na jornada seguinte o Belenenses perdeu em Marvila enquanto o Sporting ganhou em Coimbra isolando-se no 1º lugar para não mais o largar, aumentando progressivamente a sua vantagem.
Na 20ª jornada o Sporting recebeu o Belenenses que ocupava o 2º lugar a 4 pontos do líder, naquela que era a última hipótese de reavivar a luta pelo título, mas a vitória dos Leões foi categórica e a seis jornadas do fim o Sporting passou a ter 6 pontos de vantagem sobre os segundos classificados, pelo que a festa do tetra-campeonato ficou apenas à espera da confirmação matemática, que viria a acontecer na 23ª jornada com uma vitória sobre o Oriental em Marvila.
João Martins com 31 golos marcados foi o melhor marcador do Campeonato, numa época em que sofreu um acidente que poderia ter sido grave, quando viajava com Vasques no descapotável deste, cuja capota se soltou batendo-lhe na cabeça e deixando-o sem sentidos. Felizmente foi só um susto.
As lesões regressaram no final do Campeonato. Manuel Passos foi operado sendo substituído por Mário Gonçalves, Hugo teve uma rotura que também o afastou dos jogos da Taça cedendo o seu lugar a Galileu, Janos Hrotko também se lesionou e o seu substituto Armando Barros teve a mesma sorte, de tal forma que Travassos chegou a jogar no meio campo, abrindo espaço para o regresso de Albano no lugar de interior esquerdo e finalmente Caldeira ficou de fora na Final da Taça por castigo, sendo substituído por Lourenço.
Como se não bastassem todos estes contratempos, o Sporting para ganhar a sua 5ª Taça de Portugal teve de ultrapassar os seus grandes rivais da época. Primeiro foi o Benfica com necessidade de um terceiro jogo para desempate, que o Sporting ganhou por 4-2. Seguiu-se o FC Porto, 2º classificado no Campeonato e, o empate a uma bola no jogo de Lisboa deixou os portistas convencidos de que em casa iriam finalmente derrubar os Leões, mas nas Antas o Sporting voltou a mostrar a sua superioridade vencendo também por 4-2. Nas meias-finais uma derrota em casa por 4-2 com o Belenenses, foi anulada com uma épica goleada de 6-0, e assim se chegou à Final onde o Vitória de Setúbal vendeu cara a derrota por 3-2, com dois golos de Mendonça e um de Vasques.
Fechava-se assim com chave de ouro o melhor período da história do futebol leonino, numa época que terminou com uma longa digressão a África, que teve paragens em Moçambique e Angola, onde os Campeões de Portugal foram recebidos de forma apoteótica e brilhantes passagens pela África do Sul, onde o Sporting obteve uma épica vitória por 5-4 depois de estar a perder por 4-1 com a Seleção de Transval Sul e, pelo Congo, onde os Leões derrotaram a Seleção de Leopoldville por 3-1. No total foram 11 vitórias e 1 empate em 53 dias que elevaram bem alto o nome e o prestigio do Sporting Clube de Portugal.
16 Maio, 2023 at 14:54
Essas viagens por terras fora de Portugal para promover o Sportinguismo lá por fora é sempre uma boa idea….
16 Maio, 2023 at 15:01
Gosto muito desta rubrica. Mas fico sempre nostálgico. Não desses outros tempos, em geral, mas, isso sim, desse clube que fomos.
16 Maio, 2023 at 15:16
Interessante.
Tudo muito diferente agora, no mundo actual!
17 Maio, 2023 at 8:45
“Fechava-se assim com chave de ouro o melhor período da história do futebol leonino”. Em 1954.
Sintomático do que é o clube hoje em dia, quando falamos do fim das épocas de ouro ser há… 70 anos atrás.