Não sei se somos 11 milhões, como temos ouvido nas últimas semanas, mas sei que Portugal é geograficamente e demograficamente o que se chama um pequeno país. Sei que não somos a Espanha, a França, a Inglaterra ou Alemanha e muito menos um Brazil, uma Rússia, uns EUA ou uma China. De todos os países que venceram competições internacionais em futebol senior, talvez nos possamos apenas comparar com a Grécia, Uruguai ou a Dinamarca.

Sei também que somos um dos países com melhores resultados quer em clubes quer em selecções. Não teremos o poderio dos emblemas espanhóis ou a preponderância da “mannschaft”, mas fazemos parte de um 2º pelotão atrás dos clubes ingleses, espanhóis italianos e alemães e em selecções só temos andado atrás de países como a referida Alemanha, a Espanha, a França, a Argentina, a Colombia, o Chile e o Brazil. Ou seja, é muito fácil de entender que Portugal está em todos os rankings colocado como um dos maiores países na prática do futebol.

A nossa Liga é considerada por muitos como um trampolim perfeito para os grandes campeonatos, a formação dos clubes portugueses está cotada como das melhores do mundo e os treinadores portugueses têm cotação máxima no mapa de qualquer liga Europeia. O que falta ao futebol português para sermos uma potência na plenitude da expressão é…escala e organização.

Escala: com 10 milhões de habitantes e uma população bastante envelhecida, os clubes portugueses têm pouca capacidade de expansão comercial. As vendas de merchandising, lugares cativos, as receitas de cotização e direitos de tv são só interessantes se olharmos à contabilidade dos 3 grandes. O resto são números deprimentes que facilmente poderíamos antecipar olhando para o pouco público presente nas bancadas de estádios a precisar de melhoramentos. A verdade é que a fragmentação do nosso mercado por inúmeros clubes de futebol faz com que 95% dos emblemas nacionais sejam pouco mais que um terreno de jogo e uma direcção, normalmente demissionária. O futebol português não quer ser um peixe pequeno num aquário grande, nem um peixe grande num aquário pequeno, prefere ser um peixe pequeno num aquário pequeno.

Organização: Parece mentira, mas é a mais pura das verdades – a concentração de poder nas mãos de apenas 3 clubes que vão alternando fases de hegemonia reduz a pó toda a competitividade da nossa liga, da nossa formação, do nosso crescimento. Os clubes confundem evolução com perda de status e mudanças com perdas de poder. Instintivamente ou não, Sporting, Benfica e Porto gerem o futebol luso como um terreno de batalha, esgotando as ideias e a energia em eternas campanhas por obter mais poder sobre os rivais. Dificilmente encontraremos daqui a 20 anos, adeptos que se digam “eu sou do Vitória, só do Vitória” e isso pode ser o princípio de um fim que se anuncia quando ouvimos e vimos este ano adeptos do Sp.Braga, no seu estádio, a celebrar o título do Benfica na Luz.

Há tanta, mas tanta coisa por mudar no nosso futebol que vou só enumerar as 10 que considero mais fundamentais.

1/ Redução do número de clubes da I Liga para 14 clubes
2/ Criação de uma II Liga dividida em 2 zonas (Norte e Açores + Sul e Madeira) cada uma com 10 clubes, apurando 3 clubes cada para um play off final
3/ Centralização dos direitos de TV na Liga
4/ Arbitragem + Justiça e Disciplina num super magistério independente que supervisiona também o lote de observadores + delegados e com escolas de árbitros fora da alçada das Associações Distritais
5/ Restrição ao número de contratação de jogadores estrangeiros (Não EU) por época.
6/ Centralização das operações de transferências na Liga (à semelhança do modelo da MLS)
7/ Alteração dos modelos competitivos dos escalões de formação (fim do playoff)
8/Restrição do nº de atletas sob contrato profissional (ou partilha) por clube
9/ Regras tácitas e cumprimento real das mesmas quanto ao endividamento dos clubes ou SADs e
10/ Fim da regra de empréstimos (é inconstitucional) que proíbe o atleta emprestado de actuar frente ao clube de origem e criação de penalizações com perdas de pontos para quem realizar acordos extra-regulamento.

Muitas mais medidas urgem no nosso futebol, mas se fossemos capazes de aplicar apenas estas, garanto que dentro de 4 ou 5 anos os nossos clubes estaríam bem mais ricos, mais competitivos e sobretudo mais transparentes aos olhos dos adeptos.

Decretar o fim da chico-espertice, da aldrabice, do esquema, do tráfico de influência, dos mind games de roupa suja e sobretudo o fim do amadorismo empresarial é o princípio de um país que pode ser muito mais do que é no futebol… e acreditem que coisas como sucederam no dia 10 de Julho, poderiam ser mais prováveis.

Ficar de barriga para o ar, a arrotar este título durante anos a fio é a coisa mais estúpida que podemos fazer. Aproveitar o balanço para ambicionar cada vez mais (e em modo festa) introduzir algumas destas alterações seria o mais sensato. Ao contrário do que muitos pensam, não cabe apenas aos dirigentes pensar e encontrar soluções para os problemas, cabe-lhes a eles implementar, cabe-nos a todos usar a cabeça e a nossa cidadania para (se tiver de chegar a tanto) agarrar mão de toda e qualquer forma de “ajudar” a que o nosso futebol seja aquilo que os praticantes e os espectadores desejam: bons valores, equilíbrio e espetáculo.

O actual, pouco consegue emergir de toda a negociata, enriquecimento ilegal e marginalidade que os dirigentes nos seus feudos privados realizam, ao abrigo da cumplicidade com as forças políticas e judiciais. Quem não entendeu o que é esta “ditadura” que continue a alimentar os “pravdas” diários e os politburos de paineleiros das tv´s. Enquanto as letras e as palavras morrem nesses espaços, há um director ou um secretário na FPF, na Liga ou nos clubes a engordar uma off-shore pessoal, com os ganhos de um “Mensalão” mais ou menos organizado. Mas peço desculpa pelo acesso revolucionário… voltemos à festa. Haverá sempre tempo numa próxima geração para acabar com isto. Ou não. #QueSaFoda

*às quartas, o Leão de Plástico passa-se da marmita e vira do avesso a cozinha da Tasca