Basta entrarmos – por engano, por ironia do destino ou por obrigação profissional – num dos veículos de apoio dos adeptos aos outros dois grandes nacionais para percebermos que existe uma diferença abismal entre o Sporting e a concorrência. Regra geral – e estas coisas da generalização têm que se lhe diga, mas sublinhem aí a expressão “regra geral” – os adeptos dos outros clubes orientam o seu discurso por uma lógica do “quero é ganhar”, o que reduz a escolha do clube do coração de cada um destes “ganhadores” a uma questão geográfica. Quem é do Porto opta pelo FCP, quem é de Lisboa ou sul apoia o SLB, porque são clubes que “querem é ganhar” e lá vão fazendo tudo (usem a mesma caneta para sublinhar “tudo”) para fazê-lo. Depois há os outros.

Os outros são os que optam por apoiar um clube que, ganhe ou não, opta pela via da formação como premissa de estar no futebol, independentemente dos resultados imediatos, das facadas nas costas de atletas com menos escrúpulos ou das ondas momentâneas dos mercados de transferências. Os outros são os que, acreditando que é desportivamente que as vitórias devem ser alcançadas, o fazem a seu próprio custo, lutando com armas desiguais contra quem acha que colocar uma pessoa num órgão dirigente é melhor que contratar um craque ou quem controla os meandros obscuros do futebol nacional há anos. Ainda assim, o caminho é este. Apontar o dedo aos que não jogam limpo fora de campo, lutar contra eles dentro de campos inclinados e nunca, mas nunca, baixar a cabeça (a não ser para beijar o Leão Rampante). Mesmo que isso implique jogar só com juniores e juvenis na Taça de Liga daqui para a frente. Mesmo que isso nos faça perder os pontos necessários para estarmos lá em cima, na luta, durante o tempo necessário para verdadeiramente fazer cair o castelo de cartas em que as realidades desportivas dos outros clubes grandes assentam.

É nessas alturas que devemos apoiar mais este clube que, verdadeiramente, tem os melhores adeptos do mundo, pura e simplesmente porque cheiram à distância quem queira seguir a via facilitista dos outros e tratem de emendar a mão, colocando à frente dos seus destinos alguém que sente o clube como um verdadeiro sportinguista. Foi assim que chegámos à realidade de pessoas certas nos locais certos que devemos pugnar por manter muitos e bons anos.
Por isso, o que eu quero não é ganhar.

O que eu quero é um clube diferente, com adeptos diferentes e todo um paradigma que se destaca da conjuntura lamacenta que conspurca o futebol nacional há décadas. Quero cagar naquele tipo de amarelo com o apito na boca, porque sei que lá foi posto de propósito porque não consegue – não quer? – ver os lances com a imparcialidade dos bons profissionais. Quero um clube que pugne pela verdade desportiva e use os meios ao seu dispor para aplicá-la, mesmo que estes estejam viciados, e depois tome uma posição digna e firme, mesmo que isso implique não passar da fase de grupos daqui para a frente de uma competição nacional. Quero ler os jornais desportivos com os olhos cínicos de quem conhece os valores meramente comerciais e tendenciosos que os orientam. Quero adeptos com massa crítica suficiente para fazer uma página com a qualidade e a dimensão social e de mobilização da Tasca. Quero um clube que me dê todos os motivos para viver as suas cores todas as semanas, nas mais variadas competições, sempre orientado pelos mesmos objectivos e valores. Ganhe ou perca. Porque quando – se – chegar a altura em que estivermos todos em pé de igualdade, vai haver quem já não saiba o que é competir na verdadeira acepção da palavra. E aí, os que “querem é ganhar” vão apoiar quem?

Texto escrito por Fernando Reis

 

*às quartas, a cozinha da Tasca abre-se a todos os que a frequentam. Para te candidatares a servir estes Leões, basta estares preparado para as palmas ou para as cuspidelas. E enviares um e-mail com o teu texto para [email protected]