Na semana que antecedeu a recepção ao Braga, disse, várias vezes e em diversos locais, que, atendendo ao calendário e aos jogos extra que vermelhos e azuis têm para disputar, íamos entrar nos cinco jogos decisivos para este campeonato. E que, caso conseguíssemos vencê-los todos, dificilmente deixaríamos de lutar pelo título até à última jornada.

Começámos bem, vencendo de forma sofrida mas convincente os arsenalistas, ficando com mais quatro jogos a disputar, para fechar esse ciclo decisivo: Setúbal (f), fcp (c), Marítimo (f), Guimarães (c). Aos nossos rivais, esse mesmo ciclo traz Belenenses (f), Estoril (c), Nacional (f), Académica (c), Braga (f), no caso do Benfica; Guimarães (f), Arouca (c), Sporting (f), Belenenses (c), Nacional (f), no caso do fcPorto, e o arranque foi dado, como eu esperava, aos soluços: o frutinhas empataram em Guimarães, os lampiões não empataram em Belém porque a equipa de arbitragem assim não quis.

No final desse jogo do Restelo, dizia-me o meu pai «o Sporting tem é que continuar a fazer o seu trabalho, a ganhar os seus jogos e, depois, logo se vê». O problema, respondi eu, é que o Sporting está a fazer o seu trabalho, mas, ao que parece, isso não chega.
E é este o grande problema. Aquilo que se passou em Belém foi vergonhoso, com a agravante de ter sido, apenas, mais um episódio sem decoro dos que temos tido oportunidade de assistir ao longo desta época. E, este, com direito a novela e tudo: Belenenses não quer adeptos encarnados na sua bancada de sócios; benfica mostra-se indignado; fazem as pazes deixando o melhor jogador pastel de fora e mais outros dois com ligações ao benfica. Nojo? É pouco.

Obviamente que, para o comum adepto do benfica, o que se passou foi ou perfeitamente normal, ou um ajuste de contas em relação à primeira volta, ou tudo isto não passa de conversa de quem não está em primeiro e eles são os maiores porque jogam muito à bola e até estão em todas as competições (lá está, a falta de vergonha na tromba fá-los achar normal a forma como, por exemplo, garantiram a continuidade na Taça de Portugal). Mas, sinceramente, estou-me a cagar para o que os adeptos rivais pensam. Estou bem mais preocupado com o que nós pensamos ou, mais especificamente, com o que o nosso presidente pensa.

Vê-lo abandonar, ontem, a reunião de clubes ao lado de LFVieira, deixou-me, senão preocupado, pelo menos incomodado. E quando ouvi o presidente encarnado afirmar que «o futuro do futebol português passa por Benfica e Sporting», soaram todos os alarmes. Eu não sei qual é a estratégia de Bruno de Carvalho e, que fique escrito, confio plenamente no seu trabalho. Percebo, até, que seja mais fácil virar o tabuleiro de jogo tendo uma parceria de peso. Mas, e é fundamental que nunca nos esqueçamos, não é por mandar as peças de cangalhas que o jogo deixa de estar viciado! Aliás, o maior desejo de LFVieira é, precisamente, que o tabuleiro vire para ocupar ele o lugar que, nas últimas décadas, foi de Pinto da Costa. É por essa “verdade desportiva” que o líder encarnado tem lutado ao longo dos seus mandatos. E é dela que está cada vez mais perto, com o bobo Jesus a animar as hostes com os seus “limpinhos, limpinhos” e as célebres e repetidas “foi uma excelente arbitragem”, de cada vez que lhe dão colinho.

E há outro pormenor do qual não podemos esquecer-nos: nesta luta pela “verdade desportiva” que mais lhe convém, o Benfica não está só. Há toda uma máquina montada, que os torna mais perigosos do que o clube da fruta. Essa máquina passa, obviamente, pela comunicação social, para quem a verdade jornalística e o apurar/noticiar factos, passou a traduzir-se em vendas ou audiências. Das manchetes do CM aos dias inteiros dedicados ao funeral de Eusébio, das capas patéticas como a que, hoje e mais uma vez, a Bola faz, passando pelas manhosices do Record ou por pormenores propositados como aquele com que o lampião Sobral nos brindou, no fim-de-semana, ilustrando uma goleada sofrida por Domingos, na Turquia, com uma foto em que ele aparece… de Leão ao peito.

No fundo, depois de termos feito frente ao sistema, temos perante nós um desafio bem maior: fazer frente a uma máquina que, à descarada, foi sendo oleada. Hoje, com Pinto da Costa encurralado nos seus próprios erros (ir buscar Marco Silva será passar um atestado de incompetência a si mesmo) e sem dinheiro para tentar um golpe de teatro, está aberto o caminho para LFV e sus muchachos avancem para a tomada do poder sem se preocuparem, sequer, em disfarçar as artimanhas. Afinal, andamos há mais de uma década a ser preparados para o que aí vem.

Não admira, por isso, que me chame a atenção ouvir um vice do Estoril, a dois dias de ir à Luz,  afirmar que o jogo vai ser muito complicado porque “O Benfica aprendeu muito com o que aconteceu a época passada. Hoje a equipa tem alternativas para gerir a sua vantagem”.
Claro que tem alternativas ao futebol de merda que vem jogando e que a comunicação social (lá está) transforma num Benfica “mais maduro e mais virado para o resultado do que para o espectáculo”. Essas alternativas ficam bem explícitas no passado fim-de-semana. E, a julgar pelo discurso canarinho, podem voltar a ser utilizadas já nesta jornada.

A nós, cabe-nos ganhar em Setúbal, com onze Leões em campo e milhares nas bancadas. Desejando que, mesmo que nos impeçam de chegar às tão desejadas conquistas, a nossa direcção perceba todo este jogo de bastidores em que, tal como aconteceu no passado em que os azuis nos quiseram como parceiros, os senhores que buscam conquistas a qualquer preço apenas nos olham como um aliado perfeito na tomada do poder.

windsofchange

 

artwork: Ricardo Tadeu