A verdade é que o Senhor meu Pai é um Homem que liga pouco à bola, sempre foi assim. Não que não aprecie um bom jogo de futebol, um bom lance, uma jogada fantástica, um golaço, mas é-lhe efémero e desinteressante todo o circo que o futebol gera. Os jogos importantes não interessam mais que os outros, e a seleção nada lhe diz. É um Homem de letras, mais interessado noutros temas, na História, na Psicologia, na Política, na Sociologia, no Direito, nas Humanidades, nas ideias e nos ideais. Mas se tiver mesmo que apontar uma preferência clubística dirá sem grande entusiasmo que é simpatizante do Sporting Clube de Portugal.

É por isso estanho que tenha sido ele que me tenha incutido o meu Sportinguismo, mas a verdade é que sem o querer e sem o saber plantou a semente e fez nascer e crescer, nos anos em que se toldam as mentes das crianças, essa vontade de ser do Sporting. Tenho nos rincóns da memória algumas recordações de muito tenra idade, e esta de ter nascido para o Sporting é-me cristalina.

A minha família, como muitas, vieram retornadas das Áfricas aquando do pós-25 de Abril, mas antes disso tiveram lá uma vida que construíram e perderam e que depois tiveram de reconquistar cá. Mas um desses episódios dessa vida passada ficou eternizada numa fotografia que eu vi, com estes que a terra há de comer, pela primeira vez deveria ter uns 3 ou 4 anos. Pousavam lado a lado no centro de um campo de futebol para a fotografia da praxe, antes do desafio, duas equipas de futebol de 11. Numa das equipas da fotografia estava o Senhor meu Pai, o meu heroi, o Homem que tudo sabia no mundo, o meu modelo, o meu protetor, e envergava um equipamento listado verde e branco, calção preto e umas meias listadas verde e brancas.

Sporting-L.M.1965

“És tu Pai?” – inquiri eu.
“Sim filho…” – disse-me sem perder muita atenção do seu afazer.
“Que equipa é esta?” – perguntei.
Mirando a fotografia de relance, vendo a cor e as listas, respondeu sem grande ponderação naquelas respostas que os pais dão aos miúdos a despachar:
“Então? É o Sporting!”

“É o Sporting…” – escrevi eu na minha mente.
Nesse ano tive a minha primeira e única caderneta de cromos, que acho que não completei, e que se calhar ainda deve estar guardada algures na casa dos meus pais, e onde percebi que o Sporting era uma grande equipa, e se o meu Pai tinha jogado no Sporting então eu tinha de ser do Sporting.

“O meu Pai jogou no Sporting!”- dizia eu.
“Eu tenho um dinossauro em casa!” – dizia outro.
“O irmão do meu vizinho tem uma mota que voa!” – dizia outro.
Aos putos a imaginação é o que eles quiserem, não há limites.

Claro que enquanto os anos passavam a fotografia foi perdendo a seu encanto inicial… o Sporting jogava num estádio com relvado, e a fotografia era de um campo da bola pelado, o verde das camisolas não era bem o mesmo verde do Sporting, e aliás as listas do equipamento eram verticais e não horizontais como as do Sporting… a verdade é que o meu Pai nunca tinha jogado no Sporting! Mas isso já não importava… os anos tinham passado, o Sporting ganhava um par de títulos a no início da década de 80 e eu já era Sportinguista!

A vida deu as voltas que deu e só há poucos anos tive o prazer de levar o meu Pai a Alvalade, lembro-me que ganhámos e foi um bom dia. Devo-lhe muito na vida, da vida, do que sou, a educação, os valores e princípios, o que me deu e ainda dá… e o meu Sportinguismo a ele lho devo, mesmo sem ele o ter feito conscientemente.

Feliz dia do Pai meu Pai! A ver se vamos ver o nosso Sporting!

Texto escrito por Nuro de Matos Carvalho