Não sei de lhe podemos chamar texto de despedida, mas sei que, passado o choque, a irritação, e intolerância inicial, consigo passar para “o papel” o que me vai na alma.

Um dos meus filmes preferidos tem precisamente o título que escolhi para este texto. O argumento é simples: Céline, uma estudante francesa, e Jesse, um norte-americano em viagem pela Europa, conhecem-se num comboio, entre Budapeste e Viena, e, quando chegam à Áustria, Jesse convence Céline a passar com ele as últimas horas que lhe restam em solo europeu.

O que se segue, é uma obra prima na arte de nos prender a um filme através dos diálogos entre os protagonistas, que, vão vagueando por Viena enquanto trocam ideias, fazem confissões pessoais e deixam surgir uma paixão, mesmo sabendo que passada essa dúzia de horas irá cada um para seu lado.

Se existe algum tipo de magia neste mundo... deve ser na tentativa de compreender alguém, de compartilhar algo. Eu sei que é quase impossível ter sucesso... mas quem se importa, realmente? A resposta deve estar na tentativa.

Ora, é mais ou menos isso que eu sinto em relação ao Rúben: fizemos uma viagem incrível, repleta de momentos inesquecíveis, alguns irrepetíveis, e sabemos que, neste momento, restam-nos seis dias e dois jogos juntos.

Quando olho para trás, e por muito que me incomode saber que Amorim interrompe a ligação por opção totalmente consciente, obviamente que o sentimento é um e apenas um: ainda bem que este gajo veio para o Sporting. Discordei muitas vezes das suas opções, irritei-me ainda mais vezes com a sua teimosia, mandei-o várias vezes para o caralho quando, por entre aquela capacidade ímpar de comunicar, me oferecia incongruências.

Mas as horas que passámos juntos, criaram uma ligação à qual não estava habituado e, mais do que isso, permitiram que a minha filha e tantas outras crianças tivessem direito a um Sporting que, futebolisticamente falando, rima com vitórias, rima com conquistas, rima com virar o tabuleiro nesta nossa Liga viciada, rima com Campeão (e pensar que eu esperei 23 anos até saber o que isso é). Isso não tem preço, e é precisamente por isso que me incomoda tanto que Amorim saia assim, sem estarmos preparados (Céline e Jesse sabiam que havia uma hora para cada um deles apanhar o respectivo comboio que os iria separar, porra).

“Será que tudo o que fazemos na vida, não é uma forma de sermos um pouco mais amados?”

Haverá sempre duas formas de nos despedirmos de Rúben Amorim, aquele gajo a quem quase todos torcemos o nariz quando chegou de Braga: achar que o gajo é um mestre na arte de nos convencer com o que diz, e que só está a mentir-nos mais uma vez; ou, mesmo aceitando essa ou outras possibilidades, deixar falar mais alto aquilo que construímos juntos.

Eu não tenho dúvida que opto pela segunda hipótese. Eu não tenho dúvida que me sinto como se estivesse em Viena, e que tudo o que quero é que estes seis dias e dois jogos que nos restam juntos, antes do amanhecer da próxima segunda feira, me façam sentir todas aquelas coisas boas que senti nos últimos quatro anos, mesmo que isso amplie ainda mais o sentimento de abandono. Afinal, há coisas que só se sentem quando nos apegamos a alguém, certo?