Esta é a pergunta que eu faço quando olho para a questão dos empresários. E, se calhar, pensando bem já encontrei a definição certa. Empresários. Porque o trabalho que fazem é o trabalho de uma empresa, que se destina a gerar dividendos para distribuir entre os seus acconistas. Portanto, sempre que ouvirem, na mesma frase, as expressões “empresários” e “gestores de carreira” desconfiem. Porque se um jogador projectar a sua carreira num único clube, já não serve ao empresário porque lhe dá pouco a ganhar. Em contrapartida, se estiver nos seus horizontes jogar em vários clubes terá no seu empresário um verdadeiro aliado.

A grande questão não tem a ver, pelo menos directamente, com a definição correcta que lhes deve ser dada. Tem a ver com aquilo que realmente fazem. E é aqui que está o busílis. Umas vezes aconselham, outras negoceiam, por vezes manipulam e, se calhar, até há situações em que não fazem rigorosamente nada. Mas ganham sempre. Sempre. Seja numa transferência de 100.000 ou de 100M. E é isto que devia preocupar as instâncias internacionais. Ninguém quer deixar de lhes pagar, apenas queremos pagar o valor justo para o trabalho que fazem.

Olhando novamente para o título, cada uma das definições encerram direitos e deveres diferentes entre si. Se o papel for de Intermediário, então como diria um conhecido super héroi da Marvel “com grande poder vem grande responsabilidade”, ou seja, tem de fazer o melhor negócio possível para os clubes. Para mim, um bom Intermediário é uma espécie de vendedor da banha da cobra ou um gajo capaz de enfiar barretes com facilidade. Porque não é só de Ronaldos que se faz o futebol, é também de Mangalas. E se um é pacífico e consensual, o do outro é um barrete autêntico. E o clube que vende ambos tem sempre a pretensão de fazer o melhor negócio possível. É esse melhor negócio possível que é a prorrogativa única de um bom intermediário. E, como tal, na intermediação, faz sentido o empresário ganhar uma fatia do bolo porque contribui (ou devia) directamente para que o clube vendedor consiga o encaixe que pretende. O grande conflito desta actividade é o facto dos intermediários estarem ao serviço dos jogadores, para quem o valor pago pela transferência conta pouco ou nada, quando deviam era estar ao serviço dos clubes vendedores. É assim que funciona, por exemplo, no sector imobiliário. A minha solução para esta actividade é cada clube ter o seu intermediário, ao serviço exclusivo do clube. Até porque o mesmo intermediário estar ao serviço de vários clubes pode gerar conflitos de interesse.

Por outro lado, se for gestor de carreiras, há coisas que é preciso definir. Porque se é uma entidade externa que gere a carreira do jogador, e pressuponho que “gerir carreiras” significa tomar as decisões sobre os clubes para onde vai jogar, então não pode nem deve ter direito a fatia alguma da transferência. Porque a decisão acaba por ser unilateral. Logo, tem de ser o jogador a pagar o valor adequado a esse serviço. Às vezes, mete-se um nome pomposo às coisas sem perceber o que é que significa. Obviamente que para mim, o clube actual de cada jogador é o único que tem o direito de gerir a sua carreira (em conjunto com o próprio, claro). Porque investiu nele, pagou o valor que lhe pediram (ou investiu na sua formação) e, como tal, tem todo o direito de gerir a sua carreira da forma que melhor convir ao clube e ao jogador.

Se for um tutor, e aqui englobo tutores, acessores, conselheiros, advogados, etc., então também não deve receber valor nenhum da transferência e apenas o valor adequado ao serviço de aconselhamento que prestam.

O grande problema é que o empresário quer ser isto tudo. Quer ser Intermediário porque quer intervir nas negociações, quer ser Gestor de Carreira porque quer decidir quando o jogador fica ou sai e quer ser Tutor porque quer influenciar o jogador a tomar a decisão que melhor lhe serve. O denominador comum disto tudo? Ganha sempre uma percentagem da transferência. É caso para dizer que o crime compensa. Compensa manipular os jogadores, compensa colocá-los contra o clube, compensa negociar à revelia do clube, compensa fazer tudo isto e muito mais. Porquê? Porque sabem que o tempo joga sempre a seu favor e contra os clubes. Os contratos têm duração definida e um conflito entre clube e jogador acaba quase sempre na saída do mesmo. Ganha sempre. Nem que seja pelo cansaço.

Mais recentemente, e porque essa malta faz da ganância a sua ferramenta de trabalho, já não lhes chegam estas 3 funções. Abocanharam uma quarta que é a de Investidor. Agora, até já compram passes (ou percentagens) de jogadores! Chegou-se ao cúmulo de uma mesma entidade comprar um jogador, vendê-lo a um clube, manter uma percentagem e depois decidir o que fazer com ele no momento que bem entender. E ainda ganhar todas as comissões de intermediação. Tudo isto para “aumentar a qualidade das equipas pequenas”, dizem eles. E o seu raio de influência é tão grande que chegaram ao ponto de convencer uma estrutura do futebol que devia zelar pelos interesses dos clubes (Liga de Clubes) a interpor uma queixa no tribunal contra o fim dos fundos. Ou de influenciarem uma lista de convocados de uma selecção nacional. Isto é absolutamente pornográfico, não faz sentido nenhum e só serve os intereses de uns, os tais que geram valor zero para a indústria do futebol.

Para mim, existe espaço para todos, desde que se limitem as suas funções. Se um Intermediário for só isso, só vai olhar para o seu core-business que é criar valor monetário para os clubes. Se for Gestor de Carreira, só vai olhar para as necessidades do jogador e tentar encontrar soluções para que estas sejam satisfeitas. Se for Conselheiro, só vai investir no fornecimento de toda a informação jurídica (e não só) para ajudar o jogador a tomar a melhor decisão. Mas como tudo isto já está pervertido, entendo perfeitamente uma eventual decisão da FIFA em abolir os Agentes. Para se começar um sistema novo é preciso, em primeiro lugar, acabar com as perversões do sistema velho. E depois, a partir daí, evoluir para um ciclo onde realmente exista espaço para todos. Com delimitação de poderes, com regulação e legislação adequadas e com punição de quem infringe as regras.

O meu sonho (utópico, eu sei) é que os clubes invistam na formação académica dos seus jogadores, não só em tenra idade, mas continuadamente durante o seu percurso no clube. Um jogador de futebol tem de deixar de ser visto como um bronco que é facilmente manipulável por falta de conhecimento sobre matérias relacionadas com a sua carreira. Quando isso acontecer, o dinheiro circulará apenas entre os verdadeiros criadores de valor para a indústria: Clubes e Jogadores. Quem é que não quer isto?

 

* todas as sextas, directamente de Angola, Sá abandona o seu lugar cativo à mesa da Tasca e toma conta da cozinha!