Hoje não me apetece mandar pedras para dentro do fosso que separa as bancadas do relvado no nosso estádio, numa tentativa vã de conseguir afogar a mágoa da sua existência e o preenchimento do vazio que lá existe. Hoje não… hoje a cena é outra. Há fossos mais urgentes que urge fechar de vez, mais ainda que aquela exemplar “godinhice / taveirice” que herdamos de outros tempos. Adiante.

No dia em que se realizou treino aberto em Alvalade, e enquanto apreciava a forma pronta e solicita como o nosso Bruno mergulhava num mar verde das nossas gentes (caguei para as formalidades… para mim, mais que o “titulo” de Sr. Presidente, merece-me mais respeito o seu Sportinguismo… por isso, trato por Bruno e mais nada!), parei para pensar o enorme fosso que foi criado entre sócios e dirigentes do Sporting. Recuei, recuei e recuei… e o mais próximo que me lembro ver dum presidente nosso ter esta abertura para com os sócios (e afinal de contas, seus consócios) é o Sousa Cintra (Como alguns saberão, o meu Sportinguismo só ficou verdadeiramente “online” desde 89, ano em que deixei a Venezuela quando esta ainda era um pais minimamente decente e digno desse nome, pelo que de presidentes só posso falar daqueles que sucederam ao Bigodes. Por este motivo, nem ouso tocar no nome de João Rocha).

E todos se lembram de como era o Sousa Cintra… Claro que os tempos também eram outros (estamos a recuar, no mínimo, 20 anos, atenção), ainda se respirava o ambiente de Clube-Clube e não a história mal amanhada de Clube-Empresa que nos fez emprenhar pelos ouvidos vindo das cantigas de sereia do Roquettismo. Sousa Cintra era aquilo que estava à vista… “what you see is what you get”! Duma simplicidade desarmante, não acredito que ao fim destes anos todos haja alguém que tenha alguma coisa a apontar ao seu genuíno e explícito Sportinguismo. Quem não se lembra de episódios como os de Pacheco/Paulo Sousa, dos seus “loucos” festejos e das suas gargalhadas quando a vida corria bem ao Sporting, das fumaradas via-charuto vindas da central (acho que nessa altura as claques não precisavam de fumos e pirotecnias!), das garrafas atiradas contra o vidro do próprio carro… Tínhamos Sporting em grande enquanto Clube… um Clube (CLUBE!!!) vivo, apesar da falta de títulos no futebol. Tínhamos casas brutais no velhinho Alvalade, tínhamos a Nave, tínhamos o tartan, tínhamos a mítica “10A” a bombar na altura dos treinos e dos jogos… Certamente muitos de vos saberão, muito melhor do que eu, como decorriam as sessões do “tribunal de Alvalade”, onde se julgavam diariamente os jogadores. Não me refiro à Central… refiro-me precisamente ao caminho que se fazia entre os campos de treino e o Estádio… era ali que os jogadores do Sporting nesse tempo sentiam o pulso do que era o Sporting… era ali que se elevavam os heróis e se sentenciavam os vilões…

Voltando à vaca fria. Foi desde a saída de Sousa Cintra que se começou a construir o fosso no Sporting. O verdadeiro fosso. Não me refiro a aquele que lá está hoje (eternos agradecimentos ao Godo e ao Taveira! Muito obrigado!), para nosso desgosto, a separar o relvado das bancadas. Não… falo do FOSSO entre quem tinha o futuro do Sporting nas mãos (os sócios)… e aqueles que eram mandatados (quando eram… sim, porque chegamos a ter presidentes cooptados!) para gerir esse mesmo futuro.

Não me vou alongar sobre o que foram estes largos anos em que o croquete se sobrepôs à “sande” de courato, o espumante à “mine”… Não estou minimamente tentado a isso. Não estou tentado a comparar o que eram as inaugurações de núcleos nessa altura ou as “maracadas” em que nos vimos metidos, na tentativa pífia e artificial de trazer(?!) as tais elites(?!) do clube até aos comuns associados… sim, esses mesmos sócios que foram quase “esquecidos” e que eram tão desnecessários e inconvenientes que houve quem achasse que só atrapalhavam, procurando, por tudo, retirar-lhes o poder supremo de serem eles a escolher, em última instância, o que poderia ser o futuro do Sporting (para o Bem e para o Mal)… Enfim, o Sporting, de certa forma, vivia numa época de “Chavismo de colarinho e gravata”…

Quantos de vocês conseguem fazer este exercício fantasista e mirabolante (O “WE ARE” não vale para estas contas, ok… ) de recuar a aquela sexta feira em que houve treino aberto e colocar um dos ex-presidentes do SCP, desde Sousa Cintra (PSL não vale pois esse sujeitava-se a tudo para conseguir o que queria e conseguia ser bastante convincente no seu aparente afincado Sportinguismo. Sabia muito o Pedrinho. Haja misericórdia, não é, Pedrinho?!…), no meio daquele mar verde de sócios e adeptos? Aguardo com ansiedade os vossos exercícios… eu e João Quadros!

Um outro fosso que urge fechar quanto antes é o que separa a nossa necessidade desmesurada e quase auto-fagica por títulos (refiro-me sobretudo no futebol, claro) e a nossa realidade. A actual. Aqueles que disseram que era possível “fazer mais com menos” através do “culto da exigência” merecem que lhes demos apoio (critico, sempre… botabaixista, nunca!) ou, no limite, para quem não conseguir, o benefício da dúvida. Não podemos andar sistematicamente a construir os nossos castelos de areia mesmo à beirinha do mar sob pena que a inevitável maré suba… o nosso castelo tem de ser feito com a necessária calma e com o imprescindível tempo… mas lá mais junto ao areal. Vai demorar mais tempo, porque temos de carregar a água num “baldinho” menor que outros e fica mais longe? Vai… Mas vamos chegar lá. Afinal, ser (d)o Sporting é isto mesmo… Lutar e acreditar!

O fosso do estádio?… Bem, esse, para já, vamos tapando com apoio aos nossos jogadores, com palmas, cantares e gritos de incentivo (mas sempre com exigência máxima… não há cá meninos!), com orgulho restaurado e com o acreditar que o futuro se encarregará de nos fazer a devida e merecida justiça! Não estou preocupado sobre quando e como o fosso será fechado… sei que vai sê-lo. E sei-o porque sei que no comando está um Sportinguista que vive o Sporting como poucos (muito poucos… porque este vive Sporting e faz acontecer) e sabe bem o que o Sporting necessita. Nem imagino que seja de outra forma…

O maior fosso de todos, aos poucos, vai sendo fechado… o fosso que separava muitos sportinguistas do sentimento de pertença que deve guiar todos aqueles que sorriem quando vislumbram algo verde, que adoram ver um leão, que não conseguem deixar de sentir alguma repulsa pelo encarnado “basófias” e desdém pelo azul “aputalhado”. O SPORTING É NOSSO OUTRA VEZ não pode ser nunca uma frase feita… foi esta a primeira “pedrinha”, o primeiro grão de areia que foi atirado para amenizar o FOSSO da nossa alienação leonina. Um FOSSO que continuará a ser fechado à custa de esforço, dedicação e devoção de muitos que acreditaram neste novo Leão… Um FOSSO que vai sendo coberto com o restauro do nosso orgulho leonino, com o aumento da nossa família, com um novo pavilhão, com fazer mais com menos, com poder andar de cabeça levantada. Esse sim, é o FOSSO que urge fechar…

ESCRITO POR Ricardo Sampaio aka Sasquatch do Bussaco

*às quartas, a cozinha da Tasca abre-se a todos os que a frequentam. Para te candidatares a servir estes Leões, basta estares preparado para as palmas ou para as cuspidelas. E enviares um e-mail com o teu texto para [email protected]