Porque levavas aquela bandeira no fim do UTMB?

Antes de mais, e para que fique esclarecido, eu sou sócio do Sporting Clube de Portugal, e não de qualquer sociedade anónima desportiva. Sou sócio, não sou adepto, o que significa que eu não gosto do Sporting, eu faço parte dele. Este texto é a minha visão sobre um clube e os valores que esse clube quer representar e não sobre um qualquer desporto que se pratique em determinado momento, ou seja, não pretende ser um texto actual, mas uma declaração de princípios, os meus princípios enquanto sportinguista.

Esforço, dedicação, devoção e glória – Eis o Sporting Clube de Portugal! Este é o lema do Sporting, o nosso emblema. É como nos apresentamos é aquilo em que, enquanto sportinguistas, acreditamos. E o lema está construído com uma ordem, esforço, dedicação, devoção e glória. Não se pode trocar esta ordem. Nunca. É por isso que sou do Sporting, pelo lema. Também o sou pela família que sinto e tenho desde o velhinho Estádio de Alvalade. Mas sou, sobretudo pelo lema.

Acredito no esforço. Sei que o primeiro passo para qualquer objectivo desportivo será aceitar o trabalho, com custo, com dor. O trabalho que pode ser desconfortável. Sei que a dedicação é o que guia este esforço, é o que faz com que o esforço conte. E não seja só um dia, para depois deixar cair, destruir. A dedicação implica a continuidade. Implica seguir o plano. A dedicação obriga, sobretudo, a mais que esforço, obriga a direcionar o esforço, é o que lhe dá sentido. Esforço sem dedicação é uma pena. É um talento desperdiçado, um livro não escrito, um quadro escondido.

Entramos na devoção. Esse afecto especial. Para um sportinguista não basta o esforço e a dedicação. É preciso querer, gostar, sentir. Sim doi, sim custa, não só o esforço, mas também, às vezes até mais, a dedicação. Mas é isso que somos. De cada vez que preparo um objectivo acusam-me de estar obcecado. Amigos, sou do Sporting, é veneração. Eu quero até me enjoar a mera ideia de não conseguir. Eu quero até me arrepiar com a ideia de lá chegar. Eu quero. Muito. É esse querer esse amor que tenho pelo que faço que me permite ter a dedicação e o esforço. Por isso é que eu começo no esforço, mantenho-o com dedicação, que sinto com devoção. E a glória? Não se confunda a glória com a vitória. A vitória sem esforço, dedicação e devoção não é glória. É vitória. E no desporto a vitória faz parte, como a derrota, como começar e acabar. A vitória, no ideal de nobreza desportiva conta pouco. Desporto não é guerra, não é ganhar que interessa. Quando os meus filhos me dizem que são os melhores em algum desporto, pergunto-lhes se são os que se esforçam mais a fazê-lo e se gostam suficiente do que fazem para ajudar os que não têm tanto jeito, e, sobretudo, se são os que se divertem mais com esse desporto.
Menos que isso, não há glória. A glória está em chegar, olhar para trás e ver que cumprimos com esforço, dedicação e devoção.
Não, não sou advogado das vitórias morais. Acredito é que possa existir glória, mesmo na derrota. E haverá maior glória do que perder com dignidade, aprender, levantar e recomeçar, melhor e mais forte? O lema não é só Glória, é o caminho para a alcançar. Sei que para muitos, talvez para quase todos, o Sporting é “só” uma equipa de futebol, gostem ou não. Mas por um segundo, pensem que não fosse, pensem que o Sporting (se quiserem chamem-lhe outro nome qualquer) é uma escola dos valores que enumerei em cima.

É que foi nisso que eu pensei quando consegui chegar ao fim dos 170kms. Naqueles segundos, comovido, enquanto colocava a bandeira no bastão para avançar para a meta, lembrei-me das dores que tive na fisioterapia em 2011, quando diziam que não voltava a fazer desporto, dos primeiros treinos a correr, naquilo que tive de abdicar em casa, com a minha família e filhos, que ainda assim me ajudavam a montar a bandeira, pensei nos amigos que fiz pelo caminho, nos treinos na preparação, nas derrota, muitas, que tive pelo caminho, pensei também no amor que pus em cada passinho que dei, um de cada vez e que me fizeram chegar ali. A 100 metros de cortar a maior meta da minha vida, achei que ainda que a minha glória fosse pequena, não havia melhor maneira de a mostrar do que levantando a bandeira que me guiou, aquela que representa tudo o que eu acredito e defendo, Esforço, Dedicação, Devoção e Glória – Eis o Sporting Clube de Portugal!

texto sacado daqui