Alguém deve ter aconselhado aos membros da Comissão de Gestão e a alguns dos candidatos às próximas eleições do Sporting, que a melhor comunicação era tentar fazer o oposto da linha seguida pelo ex-presidente BdC. Nota-se o esforço com que se contêm para transmitir um ar tão Gandhi quanto possível, somam-se usos inflacionados de expressões como paz, serenidade, consenso, amizade, constroem-se bolinhos e pirâmides de açúcar sobre conceitos como “discutir com elevação”, “concertar entre todos”, “unir”, “pacificar”, “aglutinar”.

Certamente os curadores de imagem destes senhores concluíram que tinha sido a comunicação uma das lacunas que mais serviram para derrotar BdC e dentro dela, a “tal” forma com que o mesmo se fazia entender no espaço mediático. Ora, o que se pode dizer sobre isto é que há uma enorme confusão entre o que realmente falhou no diálogo entre a presidência e a massa associativa.

Um. Não foi o espírito combativo que esteve errado, mas sim a falta de outros registos que equilibrassem a imagem de BdC.
Passar mais de 5 anos de faca nos dentes sem resultados importantes no futebol, foi caducando a validade e a razoabilidade do esforço, foi desgastando a capacidade e convicção com que se aderia à luta. Mas convém relembrar que continua a existir toda a necessidade de haver combate e capacidade para não virar as costas a nenhuma minorização, algo que BdC entendeu de forma exemplar ser gravíssimo não enfrentar com todo o arsenal disponível.
Em última análise nem sequer foi o modo de constante agressividade que “tramou” o ex-presidente, mas sim as lutas que foi perdendo e os títulos que faltaram no futebol. É que podendo ter (e tinha) toda a razão do mundo, nunca encontrou forma de dobrar os seus grandes inimigos, alvos desde a primeira hora do primeiro mandato: os notáveis leoninos, a imprensa, 2 ou 3 poderosos empresários e os rivais (com toda as suas primazias na imprensa e nas influências sobre da FPF, Liga ou APAF).

Dois. Preferimos sempre a paz à guerra. Bem, pelo menos a maioria dos seres humanos prefere. Mas a verdade é que há guerras necessárias.
Dizer que o Sporting vai pacificar as suas relações com clubes como o Benfica é o mesmo que prometer que vamos apertar uma mão cheia de espinhos. Mais uma vez o erro é entender que os sportinguistas querem o inverso a BdC, ou seja, boas relações com todos os outros agentes do futebol. Acho um retrato estupidificante do que são os sócios leoninos.
Talvez não seja preciso abrir tantas frentes de batalha como o presidente cessante abriu, talvez baste apenas que não sejam tão públicas, talvez com um pouco mais de método e consistência na arte de fazer diplomacia, seja mais gerível a quantidade de forças opositoras ao clube. Acima de tudo, não vamos conseguir derrotar os nossos adversários com palavras e entender isso já é um passo à frente do que tem sido feito. As vitórias conquistam-se em reunir consensos e influência em todos os palcos, em reunir boas equipas em todas as áreas do clube.

Três. Sim, é verdade. A estratégia de comunicação, principalmente durante as últimas épocas, foi errática – mudando sistematicamente os meios, os focos e os objetivos. Foram excessivamente dependentes do peso mediático do presidente e mais importante que tudo, foram desenhadas para fins que não atingiram. A estratégia falhou e, como o próprio BdC já admitiu, todos pagaram um preço elevado.
Costuma dizer-se que “Se ganhas, trabalha. Se perdes, trabalha ainda mais“ e embora a comparação seja pobre, faltou sempre ao anterior líder do Conselho Directivo entender que tudo se pode dizer e fazer sobre a esteira de vitórias, e tudo deve ser medido ao detalhe com muito mais descrição quando se somam desaires.

Quatro. A comunicação não é um somatório de declarações públicas dos dirigentes de um clube e muito menos se reduz à capacidade para “plantar” notícias” nos jornais e tv’s. Tanto quanto comunicar não é abrir a boca para sairem palavras ou redigir uma carta ou um e-mail. Aquilo que se denomina “Comunicação” dentro de uma grande estrutura é um vasto, e necessariamente concertado, bloco de objectivos que se pretendem alcançar num ou mais anos de atividade. Mas para definir as tais metas que servirão de baliza à comunicação é preciso saber qual o Sporting que se idealiza ou se quer ter no futuro e aqui, tanto a CG como a esmagadora maioria dos candidatos às eleições, peca por ter olhado o futuro como um “agora continuado” e não o que será uma visão definida em futuro, definida no contraste para o que temos hoje.

Cinco. Ouço e leio muita gente encher a boca para dizer “…isto é o que os sócios desejam”, “aquilo é o que os Sportinguista escolheram”, argumentos que servem como legitimação para gestos e actos como a estúpida e absurda presença dos membros do CD transitório na tribuna do Estádio da Luz. Para quem se arroga de ter devolvido o clube à “tradição democrática” é bom que deixem de usar aquilo que acham que os sócios do Sporting querem como justificação para as suas vaidades e saudosismos. Igualmente aconselho todos os candidatos a ouvir diretamente o máximo de sócios possíveis, para que entendam de uma vez porque razão se extinguiu o anterior CD e qual os seus desejos e prioridades para o futuro do nosso clube. Talvez se o fizessem nos poupariam a propostas como as senhas digitais para ir à casa de banho de Ricciardi ou a extensão extraordinária do contrato de catering com a empresa de José Eduardo (vejam lá os estatutos e as leis da atividade comercial).

Concluo com uma ideia que penso ser fabulosa e útil para todos os que ocupam e vão ocupar cargos de relevo no Sporting: O capuchinho vermelho foi mesmo comido pelo lobo e toda a sua candura serviu para “bola”. Foi preciso um outro personagem e uma faca para que a história tivesse um final feliz. Se o caçador quisesse pacificar a narrativa e pedisse ao lobo que “jogasse limpo”… acabam todos os personagens na sua pança. A paz constrói-se quando há espaço e personagens que o queiram. De outra forma, toda a paz é conquistada na guerra e não há ninguém melhor que os sócios e adeptos sportinguistas para entender o que sobra das pacificações oferecidas ou das alianças forjadas com desprezo e ódio.

*às quartas, o Zero Seis passa-se da marmita e vira do avesso a cozinha da Tasca