Uma vitória do Sporting é meio caminho andado para se andar bem disposto. Mas nem todas as vitórias são iguais. Para lá daquelas vitórias em jogos grandes que têm, sempre, um sabor especial, há as vitórias em que um dos nossos jogadores preferidos parte a louça toda, ainda por cima com a equipa a dar uma belíssima resposta em termos colectivos e a matar vários borregos de uma assentada. Claro que nem tudo foi perfeito e a lesão de Nani ensombra tão divertida vitória, mas falaremos do 77 lá mais para a frente. Quer dizer, se calhar temos que ir falando, até porque a primeira meia-hora ainda teve a sua assinatura. Menos explosivo do que é habitual, é verdade (fico na dúvida se já estaria tocado se estaria a defender-se do sintético), Nani teve como momento alto uma jogada de entendimento com Montero, que resultaria na primeira oportunidade de golo do jogo. Pouco passava dos 15 minutos de jogo, quando o colombiano falhou o desvio de difícil execução técnica, como que sacudindo um jogo mastigado, mal jogado, com os jogadores leoninos a tentarem adaptar-se ao terreno de jogo e a sentirem a má entrada de William Carvalho. E os do Boavista a mandarem charutadas para a frente, à espera de algum milagre.

Milagre, mesmo, foi não terem sofrido o primeiro golo dez minutos depois, no lance que marca o arranque do Sporting para uma hora de futebol onde não podia acontecer outra coisa que não a conquista dos três pontos. William faz uma fantástica abertura, lançando Mané (novamente em bom plano); este contemporiza e oferece o golo a Adrien (excelente movimento, a criar supremacia atacante). O falhanço deixa o mundo verde e branco de mãos na cabeça e o grito de golo atravessado na garganta. Seguiu-se a lesão de Nani e às mãos na cabeça juntou-se preocupação. Entra Carrillo e o Sporting não abranda, mesmo com os avisos deixados por Jorge Sousa, asqueroso na forma de usar o apito e exibindo o amarelo a Fredy Montero de forma patética.

Slimani zanga-se e tenta um golaço, mas o remate sai com a direcção da serra do Marão, quando Mané estava isolado. O argelino grita, lixado consigo mesmo, e tenta redimir-se logo a seguir: grande cruzamento de Miguel Lopes (temos aqui um problema, ó Cédric) e Slimani a fazer o movimento perfeito (onde é que eu já o vi fazer isto? ah, já sei, cópia do golo ao Nacional, que o Mota anularia). Grita-se golo, mas a p&$# da bola vai ao poste e em vez de girar para dentro volta ao terreno de jogo. Depois é Montero, de fora da área, ao lado. Já só dava Sporting (seja bem aparecido, Sir William Carvalho, capaz de engolir o meio campo durante uma hora) e qualquer tentativa axadrezada esbarrava na classe de Paulo Oliveira, guarda de honra do Sr 300, Rui Patrício (parabéns, meu! que faças mais 300, de Leão ao peito).

Intervalo e acabou-se a brincadeira. A bola já gira mais rápido, as chuteiras já perceberam como deslizar na relva a fingir. Montero baixa e coloca com classe em William. William lança Carrillo. «Vai, meu! Vai, Carrillo!» e ele vai, acelerando mais com a bola nos pés do que quem vem com eles livres. Pum! Com a violência seca da investida de uma cascavel, a bomba, perdão, a bola anicha-se, finalmente, na rede! Mas não terminou. «Passa por um, passa por dois, toma lá, Mané», diz o peruano. 0-2, jogo praticamente resolvido, com a assinatura de quem aceitou a espinhosa missão de substituir o melhor jogador do plantel. E, lixem-se os críticos do costume, esse alguém só podia ser Carrillo (toma, Ruca Jardim! nunca te perdoarei o que fizeste na última jornada, quando promoveste o enxovalho do puto).

A equipa baixa o ritmo, adormece o jogo, leva um aviso, na sequência de uma das mãos cheias de bolas paradas que Jorge Sousa ia inventando para que o Boavista pudesse colocar a bola na nossa área. Marco Silva volta a ser exemplar nas substituições, primeiro João Mário para o lugar de Slimani, depois André Martins para o lugar de Adrien. O primeiro ameaçou uma vez, depois de grande envolvimento com Montero, Mané e Carrillo, e marcaria mesmo, no seguimento de mais uma arrancada e assistência do peruano. Pelo meio, o Sporting voltaria a ensaiar o carrossel que matou o Schalke, aquele Lion-Taka em que a bola roda toda a equipa, com o extra de, desta vez, ela ter começado a girar no meio-campo do Boavista. O cruzamento de Jonathan encontraria Montero fora de jogo e o remate de Carrillo não contaria como golo, mas ficou mais uma nota do trabalho que é feito por Mister Marco. Onde é que eu ia? Ah, André Martins. Que grande entrada em jogo, ó meu! Ganhando bolas divididas (diz que o Boavista pondera protestar o jogo, por teres ganho uma bola dividida a um trauliteiro de 1,85), colocando-a redondinha, com uma rotação e uma agressividade como há muito não se te via. Bem-vindo de volta, a tempo de festejar o golo de João Mário e de fazer ar de enjoado com mais um autogolo.

Sorrisos, muitos, na noite em que se maratam vários borregos à base de veneno. Em que a equipa voltou a dar provas de qualidade e de maturidade. A maturidade que vamos ter que demonstrar, face à lesão de Nani. Duvido que jogue em Londres e, na melhor das hipóteses, também duvido que jogue na recepção ao Moreirense. Vai fazer falta? Oh, se vai. Mas é uma boa altura para os restantes jogadores calarem a boca de quem diz que, sem Nani, o Sporting seria uma equipa banal. Eu diria que quem tem Patrício, Oliveira, William, Adrien, João Mário e Montero, só para citar alguns, nunca poderá ser uma equipa banal. E Carrillo, claro. Mas isso sou eu, que não me importo de ser apelidado de palerma quando digo que, se fosse treinador, seria sempre Carrillo e mais dez.