De cada vez que recordo aquela sua presença na SportingTV, na entrevista conjunta ao presidente do Sporting Clube de Portugal, Bruno de Carvalho, vem-me sempre à memória o facto de praticamente ter focado as suas intervenções (sim, porque perguntas devem ter sido uma ou duas e o resto foi repisar) na temática da dignidade.

Talvez recuando aos seus tempos de jogador, o José mostrou-se profundamente indignado por, no tal comunicado posterior à derrota em Guimarães, Bruno de Carvalho ter questionado a dignidade com que se vestiu a camisola do Sporting. E disso fez montada ao longo de toda a entrevista. A verdade é que, desde esse momento, tenho tido vontade de perguntar-lhe se a dignidade que tanto preza é de ocasião? E não o conhecendo pessoalmente, a pergunta deve-se, única e exclusivamente, à forma como a linha editorial do jornal A Bola vem sendo gerida.

Podia pegar em tantos exemplos que ficaria empanturrado. Da promoção de uma aliança entre benfica e fcPorto, onde se acha normal que um deles queira financiar a Liga (já agora, era porreiro ter investigado de onde apareceu o dinheiro para regularizar a situação dos árbitros), à transformação de um jornal diário, supostamente independente, em peça incontornável da máquina de propaganda benfiquista – as vitórias são sempre vistas pela positiva, procurando relegar para o miolo os casos gritantes de favorecimento ou a não utilização, propositada, de jogadores adversários e ignorando as exibições paupérrimas;  a promoção da formação encarnada é doentia; os jogadores nem precisam de vídeos no youtube para serem inflaccionados (e, depois, saem capas patéticas como aquela da melhor época de sempre do Gaitán quando o Carrillo está a fazer o que faz) – é fácil perceber o papel a que o senhor e o jornal pelo qual é um dos responsáveis se sujeita.

Mas nem é por aí que eu quero pegar, até porque bastaria fazer uma compilação de capas para dispensar mais palavras. O que me traz aqui é o facto de, hoje, passarem duas semanas sobre o dia em que A Bola, na sua versão online, avançava com a notícia do despedimento de Marco Silva. «Marco Silva ainda não foi informado que foi demitido», podia ler-se num título prontinho a cair que nem uma bomba no já de si inquieto universo de adeptos leoninos. Entretanto, há dois dias, como se estivesse a lidar com pessoas desmemorizadas, eis que A Bola avança para uma capa com uma foto de Bruno de Carvalho e de Marco Silva, na Academia, a assistir ao dérbi entre equipas B. Escreve-se que a paz está relançada, pouco importando o que se escreveu antes. Até porque pouco importa a impunidade com que se noticiou um despedimento. E pouco importa o facto, no mínimo curioso, de se ter revoltado quando, na tal entrevista na SportingTV, foram questionados os artigos de opinião de Miguel Sousa Tavares e, agora, depois de, aposto, se ter deliciado com o que escreveu José Eduardo, não ter hesitado em utilizar a capa para o transformar em alvo fácil.

Chamem-lhe contingências do mercado e necessidade de vender, coisa que vai transformando o jornalismo em qualquer coisa questionável. Eu chamo-lhe ausência de respeito pelos profissionais que para si trabalham e que, no dia-a-dia, têm que dar a cara e ser confrontados com essa revoltante linha editorial à qual, na maioria dos casos, são totalmente alheios. Perante tudo isto, sou obrigado a perguntar-lhe: e a dignidade, José Manuel Delgado?