A imprensa desportiva portuguesa está para a revista satírica Charlie Yebdo como um monte de merda está para a Declaração dos Direitos do Homem. Ou seja, qualquer semelhança entre as duas coisas nem sequer é fruto de coincidência…é fruto de impossibilidade.
A coragem para dizer o que ninguém diz, fazer de cada palavra intervenção, a desconstrução da hipocrisia, a desmontagem das grandes mentiras, a capacidade de rir de tudo e todos, até de si própria…todas estas virtudes podem ser relacionadas com a polémica edição francesa. Aquilo que eu relaciono com a nossa imprensa desportiva é a antítese de tudo isto. Cobardia, especulação sem profundidade ou interesse, alinhamento em todas as grandes teorias que vendam continuamente os olhos dos adeptos, incapacidade de se auto-criticar…enfim, podia estar aqui todo o dia a adjectivar negativamente e mesmo assim ficaria aquém do sensacionalismo acéfalo sobretudo dos nossos 3 grandes diários (ABola, Record e OJogo).
É claro que o resto da imprensa, dita genérica, não está melhor. A inoperância de desafiar os grandes poderes, de denunciar os grandes escândalos e manter por exemplo isenção face aos lobbys partidários ou financeiros, cega e amordaça a capacidade de qualquer bom jornalista de destemidamente usar fontes, pistas ou denúncias para chegar ao que se pode chamar uma “bomba” noticiosa. É claro que também não se pode exigir aos media que sejam os fiscais da honestidade dos portugueses, mas convém que no meio do processo não se tornem eles meros informantes (alguns pagos) da propaganda dos poderosos. Para isso é preciso coragem. Precisamente o que o Charlie Hebdo tinha. Precisamente o que vai faltando mais a cada ano que passa.
Não alinho em teorias do caos, mas também não sou dos que permanentemente acham que um ligeiro tilt na mesa vai colocar tudo no sítio. Há mais de 20 anos que assisto a um país cada vez mais incapaz de se reinventar, incapaz de definir prioridades e de respeitar na sua identidade. 10 anos de apertos no cinto, de cortes na esperança, de falência de segurança e felicidade acinzentou Portugal de tal forma que olhamos para os nossos líderes como se estivéssemos a ver um cartaz de um circo, olhamos para o nosso futuro como se estivéssemos a contemplar um electrocardiograma sem qualquer registo de pulsação. E chego sempre à mesma origem…a coragem. A minha, a tua, a nossa, a de todos nós.
Numa terra onde cada vez é mais difícil condenar criminosos influentes, um cidadão opor-se a uma empresa, alguém ser independente sem que lhe conspurquem a reputação, a educação e investigação são “despesas” e as regras de gestão são afuniladas em cortes salariais e despedimentos. Numa terra onde um contribuinte de poucas posses espera 1 ano por uma cirurgia urgente enquanto um politico acumula 2 e 3 reformas estatais…há tremenda falta de coragem. Há falta de justiça, solidariedade, democracia genuína, porque para que estas existam e sejam inatacáveis, tem de existir sempre, coragem.
Muitas das personalidades que adoptaram o chavão “Je suis Charlie” em Portugal fazem parte deste circo, são parte dos que nos estimulam diariamente a ter medo, a adoptar rotinas de aceitação, alguns dizem-nos na cara que Portugal não nos quer, que emigremos enquanto ele e os seus amigos, uns mais relvas que outros, se divertem a brincar às elites, ou aos pobrzinhos nas herdades da Comporta. Muitos dos que se dizem “Charlies” estão se a cagar para a liberdade de expressão, muitos já ameaçaram jornalistas ou insultaram comediantes, alguns já pediram a “cabeça” dos poucos que ainda se atrevem a ignorar que os media são empresas que fazem parte de grupos de empresas onde o cão, jamais morderá ao dono.
Perguntam-se vocês “mas o que é que esta merda está relacionada com o Sporting”. Nada. E tudo. Tenhamos nós a coragem de pensar.
*às quartas, o Leão de Plástico passa-se da marmita e vira do avesso a cozinha da Tasca
14 Janeiro, 2015 at 13:38
Excelente texto LdP. Muito bom.
14 Janeiro, 2015 at 13:46
Acabando (pela minha parte) a discussão religiosa, gostaria de salientar a resposta lúcida e sensata que o líder da comunidade muçulmana deu aos ataques, condenando – os sem hesitar. Não foi apenas um ataque à liberdade de expressão. Foi um ataque à Humanidade. Qualquer pessoa inteligente deve reconhecer isso. Temos de estar cientes disso, mesmo que achemos e bem que o Charlie Hebdo pode muitas vezes ser excessivo e não ter piada.
14 Janeiro, 2015 at 13:57
De acordo.
E, da minha parte, acabo com uma pergunta: posso ser anti-terrorista sem ser Charlie?
Que é o mesmo que dizer que odeio terrorismo e não concordo com as práticas da Charlie Hebdo.
14 Janeiro, 2015 at 14:04
Ok. Aí encontramos um consenso. Podes sempre ser o que quiseres até porque acabas de condenar o acto daqueles animais. Eu também apenas sou Charlie enquanto lhes reconheço direita à liberdade de expressão e à existência. Não que concorde com muito do que publicam. Alguém já aqui citou e muito bem Voltaire (lutar para que mesmo quem expressa opiniões divergentes da nossa as possa exprimir) que encerra um dos maiores tributos à democracia que se podem fazer. Saudações leoninas
14 Janeiro, 2015 at 15:33
Claro que podes…eu sou Charlie para defender a liberdade de expressão mas nao sou Charlie pela ofensas feitas com algunas caricaturas.
14 Janeiro, 2015 at 16:43
+++++++++++++++++++++++++++1
14 Janeiro, 2015 at 13:50
“off-topic”
Para quem gosta de teorias da conspiração pode visitar este artigo https://caminhoalternativo.wordpress.com/2015/01/10/charlie-hebdo-e-sua-propaganda-sionista-contra-o-isla/ que tenta desmontar mais um crime de falsa-bandeira perpretado contra inocentes e que é aproveitado pelos media dominantes usando o medo e o terror para instrumentalizar os povos a caminhar para a guerra…
Declaração de interesses: Sou ateu, pela paz, contra a guerra e contra todos que promovem a guerra.
14 Janeiro, 2015 at 15:08
Esta é a teoria que mete Mossad ao barulho? Acho que deixa de ser válida a partir do momento em que o ramo AlQaeda no Iémen reivindica o plano do atentado. Contudo, acho que não sou parvo nenhum e sei reconhecer o quão benéfica tem sido a situação para um governo ultra-conversador como o Likud, na figura máxima do *#*$P% Netanyahu, que assim refresca um pouco a sua imagem na comunidade internacional, principalmente na ideia macabra do “voltem todos para Israel, que só em Israel estão seguros”. É o chamado poder político de merda, um mal transversal à política que se faz no mundo.
14 Janeiro, 2015 at 14:03
“Caganda” texto.
É javardice atrás de javardice.
14 Janeiro, 2015 at 14:09
Meus amigos…
Este espaço é um espaço onde maioritariamente descutimos futebol ou o desporto em geral…
Mas nós somos seres dotados de inteligencia e por isso não nos é vedada qualquer outra discussão…
Sou católico, mas o “meu” Deus é o mesmo Deus dos outros (que acreditam e também dos que não acreditam -tembém respeito esses -…) porque só há um Deus, embora O possam chamar por outro nome…
Uma das coisas que aprendi “tentando” seguir os Mandamentos “do meu” Deus…foi o de que devo respeitar todos os seres (com os humanos na primeira linha…)…
O Deus em que acredito…é um Deus que é “Amor” e em nome do Amor…jamais poderá ter lugar a violencia…
Sim…eu assumo os erros cometidos pelos homens que seguiram noutras épocas a mesma religião que eu sigo…mas não posso dissociar esses gravíssimos erros de uma época que felizmente já passou…(todos nós somos em parte, fruto das ideias que “nos rodeiam” e por isso no passado, esses erros também foram cometidos num determinado contexto…mas não deixaram de ser erros )…
Mas o homem teve a possibilidade de evoluir e embora ao longo da historia de quando em vez se tenha “animalizado” …nem todos se deixaram afundar na escuridão do ódio…
O Corão como a Bíblia “devem ser lidos” à luz do progresso civilizacional dos povos…
Em todas as religiões existem pessoas “que não foram capazes de evoluir” e continuam hoje em dia, a fazer interpretações erradas desses Livros…
Compete àqueles que tenham maior abertura de espírito, “chamá-los” à razão…
Mas nem o maior disparate que possa ser cometido…poderá ser razão para “andar para trás” e entrar na “barbárie”…
E nunca o nome de Deus poderá ser justificação para cometer crimes…mesmo quando somos violentados nas nossas convicções…
Desculpem-se ter entrado noutros temas…
Mas somos pessoas civilizadas e por isso…”capazes” de assumir se necessário, outras discussões…
É necessário é que saibamos respeitar-nos e para isso há um remédio…
Tolerância…tomada nem que seja às colheres…!!
SL
14 Janeiro, 2015 at 14:13
o jornalismo custa dinheiro e o povo prefere a publicidade disfarçada.
não é isso que acontece nas tv’s?
14 Janeiro, 2015 at 15:25
Je suis dos que se estão a cagar para putas e francesinhas !
14 Janeiro, 2015 at 15:31
Ainda estou um bocado hesitante em dar a minha opinião, mas prontos, aqui vai:
Estes temas são muito sensíveis e complexos…
Vou dar a minha opinião:
Primeiro tivemos as religiões animistas
Depois politeístas
A seguir monoteístas
Desde o iluminismo existe a liberdade de ser ateu. Tal foi feito com muitas blasfémias (desde Galileu…)
Os modernos estado-nação já não são teocracias mas separam o Estado da Religião. A actual liberdade de imprensa, reunião, e pensamento foram em grande medida o fruto da secularização.
Sou contra qualquer censura a críticas a qualquer religião
Sou a favor da liberdade de culto
Sou contra qualquer acto de racismo
Sou contra a guerra “preventiva” e a invasão de países por petróleo a pretexto de mentiras
Sou contra ataques terroristas
Condeno os ataques ao Charlie Hebdo
Defendo o seu direito a criticarem qualquer religião, inclusive blasfemar.
Defendo o direito à blasfémia. Defendo a liberdade de expressão e blasfémia de Nietzsche, dos iluministas, dos anti-clericais e um longo etc.
Sou contra a profanação de símbolos religiosos e limitações à liberdade de prática religiosa
Tenho dúvidas sobre se algumas caricaturas eram ou não racistas ou roçavam tais práticas. Se eram condeno, e deviam ser admoestados. Seja como for, nada justifica os ataques armados.
A hipocrisia dos líderes mundiais revolta-me.
Em nome das religiões já morreram milhões de pessoas. Não alinho na ideia de que o Corão é “menos tolerante”. Nem faço contabilidades macabras.
Tenho orgulho no contributo dos árabes e muçulmanos para a Língua Portuguesa, “civilização”e costumes, bem como outros.
Não quero mais guerras, atentados e mortes nem viver num Estado Policial.
Se nos concentrássemos em abolir a fome e diminuir as desigualdades sociais, penso que grande parte destes problemas se resolveriam mais facilmente.
7-1
14 Janeiro, 2015 at 16:45
Eu também
14 Janeiro, 2015 at 15:39
Sabem qual sera a punição destes terroristas? E que quando chegarem ao céu, nao encontrão là ninguém (deus nenhum)!! E isto è valido para todas as religiões.
14 Janeiro, 2015 at 15:48
A religiao é o opio do povo. Enough said….
14 Janeiro, 2015 at 15:53
Uma coisa são inergúmenos usarem a religião como arma de combate. Outra bem diferente são pessoas, ditas, inteligentes e tolerantes, a usarem a mesma arma.
14 Janeiro, 2015 at 16:00
Sao opinioes Sà e eu recuso-me a ter uma discussao sobre isso na tasca mas….
Em termos historicos esta frase é exacta. O maior genocida é a religiao e quem dela se serviu para justificar as inumeras guerras.
PS. Nao sei onde é que o pessoal leu que estavas a justificar os actos barbaros de Paris. Nao foi assim que entendi o teu comentario.
SL
14 Janeiro, 2015 at 16:57
Era para usar essa frase mas nao quis ser insultado de populista mesmo se concordo contigo Barbosa.
14 Janeiro, 2015 at 16:28
Li noutro local um post que tem algumas semelhanças com o publicado pelo Leão de Plástico e que recomendo.
https://sportingpt.wordpress.com/2015/01/14/a-corneta-do-diabo/
SL
14 Janeiro, 2015 at 17:01
Grande post LdP, o melhor do ano até agora. Entra directamente para o TOP10 dos post 2015.
SL
14 Janeiro, 2015 at 22:23
Muito bom!!!
14 Janeiro, 2015 at 22:31
Mais um para dizer que o conteúdo deste tupperware é gourmet.