Por muito que tentasse ir-me deitar para deixar arrefecer o assunto antes de escrever, os loopings mentais que o mesmo me provoca impedem-me de fazê-lo. 24 horas volvidas sobre a primeira vez que vi as capas dos jornais da Cofina, parece certa a contratação de Jorge Jesus, uma verdadeira bomba e que faz estremecer todo o tabuleiro sobre o qual assenta o nosso futebol. E, como bomba que é, vou tentar seguir os estilhaços.

O inesperado golpe de génio
Pinto da Costa andava a tentá-lo há três anos (tal como tem tentado levar o Rui Patrício para a casa de putas). Bruno de Carvalho consegue-o ao fim de dois. Ir a casa do maior rival e roubar-lhe o treinador que permitiu ver luz ao fundo de um túnel que ameaçava ser demasiado longo, tem muito que se lhe diga. No fundo, é um levantar do kilt, sem cuecas, claro, apontando em direcção às duas nádegas. O maior impacto, obviamente, é sobre o benfica, que se vê obrigado a ir buscar um treinador que entra sob a enorme sombra deixada pelo mister chiclete.

Outro treinador português? Só se fosse Mourinho.
Jardim, Marco Silva, Jesus. Se dermos continuidade às letras, o próximo será Mourinho. Piadas parvas à parte (também têm aquela do Jesus do Deus e do dinheiro ser desbloqueado pelo Espírito Santo), a verdade é que Bruno de Carvalho consegue contratar, consecutivamente, os três melhores treinadores portugueses disponíveis. E, sejamos sinceros, depois da vitória na Taça de Portugal, só um nome com tanto impacto poderia diminuir a turbulência da saída de Marco Silva.

Investidores não são fundos
A partir de amanhã, quinta-feira, dia 4 de junho de 2015, passará a tentar vender-se a ideia de que para financiar a chegada de Jesus, o Sporting corre o risco de perder a maioria da SAD. Pura especulação, tendo em conta que, neste momento, a Holdimo é detentora de cerca de 30% dessa mesma SAD e, mais importante ainda, tendo em conta a promessa feita de que, pelo menos enquanto esta direcção estivesse à frente do Sporting, essa maioria nunca cairia nas mãos de terceiros. Tendo eu votado nesta direcção, obviamente que acredito que a promessa será cumprida.
A propósito de promessas, não deixa de ser irónico que esta aparição tão forte da Holdimo, investidores e não um fundo, recorde-se, recupere uma das promessas eleitorais que ainda era cobrada: a existência de investidores prontos a injectar dinheiro.

O desafio
No meio de tudo isto, o lado bonito da história: Jorge Jesus é aquele gajo que até já apareceu numa foto, em plena bancada do Jamor, a torcer pelo Sporting. Não vou fingir que não continuo a olhar para ele como um Sportinguista que parece talhado para incorporar o espírito lampião, mas não deixa de ser curioso que o treinador esteja prestes a aceitar /tenha aceitado o desafio de vir para Alvalade ganhando menos do que ganhava na luz, só disparando para esses valores no caso de conduzir o Sporting às vitórias. Fala-se em desejo antigo, fala-se no pai, fala-se em muita coisa. É um enorme desafio desportivo e pessoal.

O que não faz sentido
Ameaças de deixar de pagar quotas, ameaças de devolver cartão de sócio, ameaças disto e daquilo. Peço-vos, sinceramente, que não se esqueçam que o Sporting não é um presidente nem é um treinador. Somos nós. Se já não fazia sentido virar as costas ao clube quando estávamos no buraco, menos sentido faz numa altura em que a recuperação salta à vista (fair play financeiro praticamente conseguido, regresso às conquistas no futebol, crescimento claro nas modalidades, entre vários outros pormenores). Digam o que vos vai na alma, opinem, deixem críticas construtivas, mas calma lá com os exageros.

O que me diverte
Ouvir imbecis como o Bruno Prata afirmarem que o Rui Vitória é o treinador certo para dar ao benfica a dimensão desejada nas competições europeias. Se dúvidas restassem sobre o impacto desta contratação, basta ver a forma como os paineleiros passaram a tratar Jorge Jesus como um treinador banal e sobrevalorizado. Até já se preocupam com o facto de ser um treinador que não aposta na formação. É divertido e elucidativo. Aliás, alguém que mostre ao técnico este exemplo do que o espera.

As minhas dúvidas
Defendi, em mais do que uma ocasião, que seria importante termos um treinador experiente. Jesus é um treinador experiente, provavelmente o mais experiente cá do burgo. E tem provas dadas. Mas, diga-se em abono da verdade, que essas conquistas, para lá do mérito de colocar as equipas a jogar à bola e de conseguir potenciar jogadores para suprimir ausências, perdas e vendas, têm a si anexadas aquele perfume a limpinho e a colinho. E essas ajudas de terceiros, para que a equipa embale numa série de bons resultados, é coisa que o Jorge não terá em Alvalade.
Também não terá uma torneira aberta para brincar aos defesas esquerdos e para importar catrefadas de jogadores que mais não são do que lavagem de dinheiro. Estará ele preparado para essa mudança de realidade?
A propósito de mudanças de realidade, estará Jorge Jesus preparado para apostar na formação? Essa é a bandeira do Sporting e é nesse projecto que votei. Mais, é nesse projecto que me revejo. Claro que podem dizer-me “estás a esquecer-te que temos renovado com os putos quase todos?” ou “porra, se o gajo está a ser contratado é porque aceitou todas essas condições!”. Talvez. Mas seria hipócrita se não vos dissesse que temo que o investimento da Holdimo vá além do treinador e que Brian Ruiz seja o primeiro de uns quantos. Isso eu não vou engolir.
Estou, também, curioso, para confirmar a saída de Inácio, o que representará deixar o futebol nas mãos do presidente e do treinador. Ora, inverte-se o paradigma de que a estrutura é que trabalha o futebol independentemente do treinador? O treinador passa a escolher os reforços?
E, fica desde já escrito, que me custa engolir a entrada de Jesus no Sporting. O comportamento tido ao longo destes anos vermelhos, ofereceu-me a imagem de uma pessoa que é totalmente a antítese do que eu defendo para o Sporting. E não, não estou a referir-me aos problemas com o português (há quem diga que era de propósito para ser entendido no reino dos orcs), antes ao chico espertismo, à má formação, aos resvalamentos de carácter, ao comportamento a roçar o ordinário. Eu não me identifico com este tipo de personalidade e, penso, maioria dos Sportinguistas também não se identificará. Esperemos que, tal como acontece com treinadores que chegam ao dragão ou à luz, o respirar dos ares de Alvalade permita ao técnico adaptar a sua postura ao clube que representa.

O que me entristece
Não gosto que tentem fazer-me passar por parvo e o que aconteceu, ontem, com as capas do record e do correio da manhã (já percebi porque raio o CM estava presente na festa da Taça, em Alvalade), foi tentar passar-me um atestado de estupidez. Encomendar capas para deixar bem claro que não existia a mínima possibilidade de Marco Silva continuar, é algo que me envergonha e que me entristece. Não me identifico com essas jogadas de bastidores a la House of Cards, muito menos quando me tentam fazer engolir um modus operandi idêntico ao que espoletou aquelas malditas semanas no Natal. O Sporting, pelo menos o meu Sporting, não é isso. Se há algo a dizer, há que ser homenzinho e dizê-lo, sem rodeios, aos sócios, ao invés de tentar vender ideias e manipular a opinião pública através dos jornais que tantas vezes criticamos. E há que ser homenzinho e colocar um ponto final desta relação, agradecendo a Marco Silva o que, mais ou menos bem, fez pelo Sporting (para todos os efeitos, passou a fazer parte da nossa história e fá-lo através de uma importantíssima e épica conquista).
Podem dizer-me que estamos apenas a aprender a jogar o jogo. Eu respondo que, por mais romântico e estúpido que possa parecer, eu quero que o meu clube e quem o dirige, continuem a fazer-me acreditar que o jogo se joga na relva e nos pavilhões. Podemos ganhar menos vezes, é verdade, mas é por defendermos que para ganhar não vale tudo que ganhamos o direito de dizermos que somos diferentes.