Se existissem Deuses do Futebol, Jorge Jesus poderia considerar-se uma espécie de protegido dos mesmos. Não por ser divino, não por ser maior que outros homens, mas por ter uma espécie de estrela que o acompanha nos momentos de maior aperto e que o leva, de uma forma ou de outra, a conseguir quase sempre aquilo que pretende. Podemos dizer, meio em estilo cliché, como se fossemos um jogador já acabado, que a sorte dá muito trabalho, e que esse trabalho se chama treino. Podemos referir que a sua experiência fez com que percebesse exactamente os momentos do jogo, como quebrar as equipas fechada lá atrás, ou as mais atrevidas que acreditam noutro resultado frente aos grandes, mas esta é a apenas a mais recente versão de Jorge Jesus.

De um treinador obcecado com a linha defensiva e com carrossel ofensivo, vemos agora a sua nova versão, conseguida essencialmente no último ano. JJ consegue agora ser o treinador que olha para o seu plantel e que percebe que até ter a famosa “nota artística” vai demorar, que não tem ao seu dispor todas as opções que pretendia (se tivesse o Capel era lateral esquerdo) e que tem primeiro de trabalhar sobre um onze base que seja eficaz. As exibições do Sporting têm, mais que nunca, duas partes completamente distintas. Uma primeira virada para o ataque, com excelentes trocas posicionais e futebol muito bem jogado, e uma segunda mais estratégica, de controlo e posse que, pelo pouco tempo de trabalho, tem resultado em algum sofrimento e muito acreditar das equipas que defrontamos. É uma estratégia clara, montada pelo treinador, que pretende que a sua equipa seja mais fria e calculista, deixando os brilhantismos apenas para alguns artistas, e mantendo uma obsessão táctica importante.

Quase todos os jogos têm sido assim, alguns mais que outros, mas a história repete-se tantas vezes que muitos poderiam dizer que se trata de uma lição que terá de ser aprendida. Da minha parte, adoro aprender lições de humildade e apanhar grandes sustos, desde que no fim os três pontos regressem para Alvalade. O ano passado assistimos a um futebol ofensivo incrível a espaços, mas também alguma falta de atitude que ditou os 11 empates no final da temporada. E, na verdade, existiu desde muito cedo a convicção de que o Sporting não entraria na disputa pelo campeonato, mesmo dentro dos próprios adeptos. Algo que se viria a confirmar naquele fatídico empate, em Alvalade, frente às águias de Carnide.

Tentar resolver cedo, gerir segundas partes e pensar mais no resultado e menos nas estatísticas pessoais. Pode não ser uma estratégia que atraia o mais purista do amante do futebol, que tem a tendência de fazer da sua equipa e jogadores algo que não são (ainda), mas é a estratégia que Jorge Jesus nos pretende apresentar. Se o fizer em prol do título, juntando a isto aquela que é a nossa filosofia de aposta na formação e conseguindo a estabilidade interna que outros treinadores não conseguiram, perfeito. Caso o campeonato esteja perdido muito antes do fim, será um preço demasiado caro para se pagar. Mas isto, é futebol.

*às terças, a Maria Ribeiro mostra que há petiscos que ficam mais apurados quando preparados por uma Leoa