Se é verdade que somos um clube que tem, na sua longínqua identidade, o sofrimento e acreditar até ao último minuto, também é verdade que nos habituámos a ver as equipas de baixo da tabela como jogos relativamente acessíveis onde, na grande maioria das vezes ganhamos sem muitos problemas.

Se é verdade que a formação faz parte do nosso ADN, também é verdade que associado a estes jogadores está parte de uma irreverência e falta de experiência que nos tem levado a extremar posições relativamente aos jovens. Ora são o próximo Ronaldo ora são o próximo Djaló, tudo numa semana.

Se é verdade que, antes de Bruno de Carvalho, não assistíamos a tantos conflitos com jogadores e seus empresários, também não deixa de não ser mentira que isso é justificado pelo esbanjar de fundos e pouca vontade negocial do Sporting dos últimos 20 anos.

E, se é verdade que somos um clube enorme, com 18 títulos portugueses conquistados, também é verdade que desde 96 que o Sporting não tinha 13 pontos à quinta jornada, igualando a posição com o Porto, no topo da tabela, e deixando o bi-campeão a 4 pontos.

Todos nós fomos aceitando os vários Sportings que se formaram ao longo dos tempos. Uns mais contidos, outros mais gastadores. Uns que prometiam mais, outros menos. Os que vendiam os nossos capitães, os que compravam João Pintos e Super-Mários. Os de Bala e Figo, que ganhavam pouco mas jogavam muito. E a todos esses projectos nos rendemos e em todos esses momentos apoiámos, porque o Sporting é sempre muito maior que os egos e as opiniões pessoais.

Mas, a bem da verdade, é que todos estes pontos temporais tinham algo em comum: a verde e branca nunca foi uma regular campeã, e poucas eram as vezes que a própria equipa era regular. Desde os 5 Violinos que não conseguimos uma verdadeira época verde, marcada por anos de vitórias seguidas, por Taças e Campeonatos que envergonhavam os rivais. Porque nos últimos 31 anos o Porto venceu 22 campeonatos, porque no entretanto estivemos numa seca de 18 anos, seguida por uma de 13, e porque nos últimos tempos o Benfica de Jesus conseguiu, internamente, ganhar quase tudo.

Onde quero eu chegar com tudo isto?
Quero que o Sporting lute por títulos, mas pretendo que o faça de forma sustentada e que sinta que existe um projecto que nos permita sonhar com um clube regular e não um vencedor por acaso. Quero que se aposte na formação, mas não que façamos dos jogadores deuses ou sacos de pancada. Quero ganhar, mesmo que para isso tenha de se sofrer, mas sem ter de entrar em conflito com todos os sportinguistas com que falo por este ou por aquele jogador, por esta ou por aquela decisão.

É isso que se pretende construir, pelo menos é isso que sinto que se tenta construir. E Jorge Jesus pode ganhar todos os jogos que quiser com sofrimento, desde que os ganhe regularmente. Os jogadores podem perder qualidade durante os 90 minutos, mas nunca o sentido de compromisso. Podemos ser prejudicados, mas isso não pode guiar a nossa equipa. Um jogador pode ser afastado, mas os seus companheiros têm de querer ainda mais um Sporting campeão. E no fundo, perante uma história recente tão diferente da que agora está a ser construída, pergunto-me se algum dia nos habituaremos.

*às terças, a Maria Ribeiro mostra que há petiscos que ficam mais apurados quando preparados por uma Leoa