456696608O seu nome é Ana Borges e a sua profissão é jogar futebol. Isso mesmo, no século XXI existem mulheres que fazem do futebol a sua vida, e não apenas no sentido metafórico da questão. Ana Borges é defesa direito, mas também pode jogar em zonas mais adiantadas (uma espécie de Schelotto mais bonito) e, de momento, defende uns leões mais ricos e mais poderosos, num clube chamado Chelsea. Ana Borges é sportinguista. Daquelas tão loucas que torceu pelo Sporting no dia que nos deslocámos a Stanford Bridge, contra o seu empregador. «O nosso coração é verde sempre».

Certamente que a Ana, outras anas que andam pelo mundo do desporto, daria tudo para ter a sorte de William, Mané ou Rui Patrício, e poder vestir as cores do clube do seu coração. Um previlégio que, infelizmente, apenas pertence a 50% da população, que ainda têm a sorte de enriquecer com isso. A Ana nunca será rica a praticar a sua profissão, isso é uma loucura que já não será do tempo dela. Nunca vai ser capa de jornal, nem será polémica, nem terá os seus golos e passes a passar em loop nas redes sociais. A Ana continuará a ir apenas aos seus treinos e a fazer o que mais gosta, com contratos mais reduzidos e mais baratos, com menos títulos relevantes e com poucas fotografias no Estádio de Alvalade.

Porque hoje, no Dia Internacional da Mulher, em 2016, a diferença entre homens e mulheres já só não se nota nas bancadas e nas roulotes. Ainda se nota em tudo o resto que orbita em torno do mundo do futebol, que com a importância social que tem perde todo o tempo a integrar crianças desfavorecidas (apenas meninos, claro) ou a juntar toda a espécie de fundos para curar doenças, e esqueceu de ser parte importante do fim da discriminação contra a mulher na sociedade ocidental. O futebol potencia o afastamento das mulheres, porque sem o querer apenas eleva a deuses homens. O futebol esqueceu-se de ser parte das alterações que se fazem sentir em quase todas as profissões e em muitos dos desportos que se praticam, porque o futebol gosta de perpetuar o estado das coisas até que o ar se torne irrespirável.

Não sei se Ana Borges algum dia jogará com o verdadeiro Leão ao peito. Sei que no país onde está pode pelo menos cumprir alguns dos seus sonhos de criança. Sei que passamos horas e gastamos milhões a reforçar equipas B que nunca enriquecerão o nosso palmarés, ao invés de sermos rosto da mudança, num país que precisa urgentemente de valorizar as suas mulheres. Sei que onde quer que estivesse uma equipa do Sporting, mesmo de futebol feminino, teríamos festa, casa cheia e muito apoio vindo da bancada.

O Sporting é a maior potencia desportiva nacional, mas o futebol é a maior potencial desportiva mundial, que mais paixões move. Não seria altura de dar oportunidade a mais 25 atletas de ganharem títulos com a camisola mais bonita do mundo?

*às terças, a Maria Ribeiro mostra que há petiscos que ficam mais apurados quando preparados por uma Leoa