Faltam já poucas semanas para se iniciar a nova época e o tremor de terra institucional desencadeado pela revelação dos famigerados e-mails pouco ou nada alterou. Os processos de averiguação estão em curso, dizem, e até que sejam concluídos a postura oficial da Liga e da FPF é…esperarem sentadas.

Por mais absurdo que pareça ao adepto mais desavisado esta é a forma mais fácil e indolor de lidar com este “futebol caos” à portuguesa. Mas será a melhor? Compreendo a necessidade de provar o conteúdo dos e-mails e todos nós podemos imaginar quanto tempo isso pode levar até ser apurado, especialmente num país com uma cultura de celeridade processual abaixo de zero. Aceito até que os dirigentes e o clube visado não devam ser condenados sem hipótese de apresentar a sua defesa.

O que não consigo mesmo entender é a ausência de explicações e quais os procedimentos que vão ser adoptados para assegurar os adeptos que não há qualquer hipótese de existirem “missas”, “padres”, “primeiros-ministros” ou “meninos queridos” a distorcerem a verdade desportiva. Parecendo que não, há uma completa inexistência de um compromisso público e formal por parte das instituições em mostrar que estão a fazer o máximo para exterminar os bastidores mais paralelos do futebol. Não. Há apenas silêncio e notas de imprensa, formalismos anónimos decorrentes de um qualquer início de temporada.

Todos falam da indústria do futebol, do negócio, da defesa de um ambiente saudável, da credibilidade e profissionalismo. Pena que perante um dos maiores escândalos da história do nosso desporto rei, ninguém dê a cara e explique como podemos confiar em árbitros favorecidos por agradarem a um clube, em delegados com carreiras patrocinadas por firmas com ligações a um clube, em observadores que nunca são chamados a avaliar jogos de determinados árbitros ou membros dos órgãos de disciplina e justiça a serem ofertados com bilhetes para compensar a “moral elevada” de decisões a beneficiar determinado emblema. Ninguém. Como se não abordar publicamente o tema fosse sinônimo de estar tudo bem. Tudo calmo.

Não sei se vou ser desmancha prazeres e estragar as merecidas férias aos altos dirigentes da Liga e da FPF, mas a mais pura das verdades é que todas as nossas competições internas vão ser barris de pólvora prestes a explodir e vai ser quase impossível que não o façam. Mais tarde ou mais cedo um árbitro irá errar e desencadear uma ira que por agora está latente, mas que nessa altura varrerá as bancadas, o relvado, os media e todo o espaço social do desporto. E depois? Quem virá dizer que os adeptos podem ter confiança? Quem terá a moralidade de pedir respeito? Quem terá a lata de defender a posição de passividade das entidades responsáveis por regular as competições? A resposta é a sempre a mesma: ninguém.

A verdade é que a lama sujou todos, e não há impolutos. Todos estão ligados pelas enormes mentiras que os suportaram e suportam e tenho tanta confiança na vontade destes senhores limparem o futebol português como na bondade e altruísmo de um ditador sanguinário. As leis e os regulamentos podem por agora definir uma linha de conduta discreta e burocrática, mas não resolvem absolutamente nada quanto à suspeição, quanto à presunção que todo o sistema fervilha de compadrio e tráfico de influências e este problema arrastar-se-á até que existam decisões. É sobre este cenário que os responsáveis imaginam vir a ter competições a decorrer com normalidade?

Torna-se óbvio que a estratégia de low profile foi adoptada por todos, até pelos próprios árbitros que deveriam ser os primeiros a exigir clarificações e protecção. Na recepção ao Mónaco há poucos dias em Alvalade, alguns dos árbitros “suspeitos” compuseram a larga equipa de arbitragem (que já incluiu os VAR e mais um árbitro principal), correu bem? Sim, tão bem que me veio à memória aquele ditado popular “quando a esmola é demais, o pobre desconfia” e não consigo deixar de pensar na espetacularidade que seria ter uma Liga Portuguesa com aquele nível de competência, rigor e respeito pelos princípios da arbitragem. O pior é que normalmente o primeiro milho é dado aos pardais e não há nada como levar alguém a perdoar uma ofensa do que fazer uma oferta (generosa) de boa vontade. E aquele golo invalidado ao Mónaco soube tanto a “estão a ver como até somos capazes de fazer as coisas bem… que tal umas tréguas?”.

*às quartas, o Leão de Plástico passa-se da marmita e vira do avesso a cozinha da Tasca