Cherba, se fosse hoje voltavas a votar no Bruno de Carvalho?
Obviamente que sim!

Peço desculpa se comecei por aquele que poderia ser o final do post, mas creio ser importante partir desse dado. Um dado que aqui é escrito sem reservas, tal e qual o podem ler e que assenta em quase cinco anos de trabalho que está à vista de todos. É verdade que o cabrão do futebol profissional teima em ser mais pesado do que tudo o resto, mas parece-me de todo injusto olhar para esta mão cheia de tanta coisa e resumi-la a um “epá, mas no futebol…”.

Mas mesmo no futebol há muito que pode ser dito. Obviamente que não me chega uma Taça de Portugal, uma Supertaça e uma Taça da Liga. Tenho saudades de ir para a rua festejar campeonatos, tenho saudades de ver o país e o mundo pintados com as nossas cores, tenho saudades de ver uma festa como não há igual. E, enquanto pai, tenho um raio de um nó na alma por não poder celebrar tudo isto com a minha filha às cavalitas, mas, dizia-vos eu, mesmo no futebol há muito que pode ser dito. Há o trabalho de chegar a um balneário em cacos, ir buscar o melhor treinador português possível, pegar na prata da casa e voltar a fazer brilhar o Leão Rampante. E voltar a fazer isso na época seguinte. E na seguinte, a tal de um campeonato de mentira fechado em malas e mails. E com todo esse trabalho, reaproximar os adeptos do estádio. É natural que estejamos saturados de esperar, mas não é menos verdade que, hoje, qualquer empate ou derrota nos incomoda ainda mais por sentirmos que a nossa equipa pode ganhar em qualquer campo, em qualquer estádio, a qualquer adversário. Isso deu trabalho, ó seu deu.

E mais trabalho deu, ainda, quando teve que ser feito contando tostões. Mérito na escolha do homem para dirigir as finanças do clube, mérito no par de colhões para bater de frente com a banca, mérito para ameaçar deitar tudo cá para fora quando hienas que ainda rondavam quiseram puxar o tapete e manietar o projecto (honra, também, às centenas de Sportinguistas que nesse dia cancelaram as suas contas no Bes). Foi nesse rugido a pés firmes que eu votei, que tu votaste, que uma maioria votou e voltou a votar. Tinha que ser assim; à bruta. Com palavras feias, sem medo de lidar com a merda de mãos nuas. Um dos nossos, no fundo, uma pedrada no charco ao nível do futebol português. Ou, melhor dizendo, um problema para o futebol português. Porque, sim, Bruno de Carvalho foi e continua a ser um problema para o futebol português onde dois corruptos viram os alicerces dos seus bairros abanarem. Pior (e mais triste), onde aqueles Sportinguistas que tratavam estes estercos como amigos viram fugir-lhe a panelinha onde esturricavam o seu clube.

Vem a reestruturação financeira, vem o regresso das modalidades históricas, o lançamento de novas, o pavilhão, as conquistas europeias, a SportingTV e tantas outras pequenas grandes conquistas que trazem de volta algo de que tinham tentado fazer-nos esquecer: o Sporting como Clube de Portugal, como clube eclético, como uma força transversal onde, sim, tem enorme peso o futebol, mas que é capaz de superá-lo. Foi sempre assim, ou quase sempre, muito por nossa culpa que deixámos que nos roubassem tanto do que nos torna únicos. Esse tanto do que nos permite passar de geração em geração uma paixão que cresce e cresce e cresce… cresce tanto que os outros sabem lá, cresce tanto que dás por ti a sorrir quando vês uma criança de três anos, camisola listada, a assistir a um jogo de ténis de mesa…

Perguntas-me tu, por esta altura, “então… porque raio é que um Presidente que vos trouxe tanto está a ameaçar demitir-se?“. Não duvido que exista um lado de saturação, não tanto pelos ataques directos, mais pelos ataques às pessoas que lhe são mais chegadas. Tem valido tudo, tanto por parte de benfica e fcporto como por parte de quem está a trabalhar na sombra e a utilizar os Madeiras Rodrigues desta vida como fantoche para ir apalpando terreno. Mas existe, também, um lado de Bruno de Carvalho que não lhe tem permitido ser um presidente tão unânime como poderia ser.

Se recuarmos a 2014, ainda a recuperação do Sporting dava os primeiros passos, encontramos um Bruno de Carvalho como capa de um livro intitulado “O Presidente Sem Medo”, algo que não fazia sentido algum ao fim de tão pouco tempo. É verdade que Bruno é um presidente moderno, disponível para selfies, pronto a dizer o que lhe vai na alma nas redes sociais, mas esse atracção pelo lado mais pop da cena tem os seus riscos. E, é minha opinião, o Presidente do Sporting perdeu a capacidade de dosear esse lado, essa vontade de estar muito próximo dos adeptos, essa vontade de que todos eles gostem dele. E reage mal quando constata que o que faz não é assim tão aceite, não é assim tão aplaudido, não provoca assim tantas gargalhadas (fazer humor não é para todos). Ele próprio já disse que aprendeu com o episódio do vídeo em que, nos ecrãs de Alvalade, anunciava que ia ser pai, numa tentativa frustrada de lançar uma campanha de marketing, mas é clara a dificuldade em lidar com o menor número de palmas. O recente discurso de abertura da AG, carregado de ironia corrosiva, é um bom exemplo do quão incomodado e irritado fica quando a reacção de apoio não surge em massa. A facilidade com que apelida sócios e adeptos de pouco inteligentes (e estou a ser simpático no termo utilizado), uma constante de cada vez que o seu discurso ou as suas ideias são questionadas, é meio caminho andado para afastá-los de si.

E neste afastamento, perde-se, inúmeras vezes, o que de bom tem sido feito. Bruno de Carvalho já devia ter percebido que a sociedade em que se move é muito mais célere em enfatizar o lado mau do que a glorificar o lado bom. Se transportarmos isso para um universo futebolístico onde ele é figura a abater, é fácil entender que Bruno não tem sabido resguardar-se com a agravante de, inúmeras vezes, tratar quem está do lado dele como inimigo ou passar uma mensagem, errada, grotesca, de que devíamos estar-lhe gratos e ao mínimo espirro somos uns ingratos. Se não fosse ele não havia clube, se não fosse ele não havia Pavilhão, se não fosse ele não havia a puta da gala que é tão puta que se dá à festa em qualquer dia.

Creio que seria fundamental Bruno de Carvalho perceber isto: nós não precisamos que ele nos diga o que fez, muito menos em tom de atirar-nos à cara. Nós sabemos, presidente! Aliás, foi por isso que votámos em si! Foi por muitas dessas conquistas fazerem parte do seu programa que o escolhemos! E tem sido com um enorme sorriso de felicidade que as temos visto passarem do papel à prática! E é por isso que comecei este texto da forma como comecei. Porque neste homem de apelido Carvalho, existe um Sportinguista do qual me orgulho, mas também existe um Sportinguista que consegue irritar-me a sério. Porque quando peso os dois lados, consigo distingui-los e continuo a ter a certeza de que estou perante a pessoa cuja obra ainda nem a meio vai. Porque nesta conjugação de Good Bruno e Bad Bruno, ainda continuo a ver My Bruno.