Quando defrontámos a Juventus, para a Champions, aconteceu aquilo que já havia acontecido aquando do embate com o Real Madrid: o mundo rendeu-se ao virtuosismo e à vertigem que um rapazinho com a 77 empresta aos jogos. Esse rapazinho é Gelson Martins, mais um produto de excelência Made in Sporting, que, nessa data, recebeu um elogio da imprensa italiana maior que todos os outros: Gelson é um Cuadrado ao quadrado, escrevia-se, como forma de sublinhar a capacidade do miúdo em fazer todo o corredor direito, explodindo quando ataca e auxiliando o seu lateral sempre que é necessário.

Mas, para muitos Sportinguistas, isso não chega. Porque, para eles, o Gelson é trapalhão, não define bem as jogadas e tem essa mania de arrancar feito louco, bola colada ao pé, insistindo em partir defesas à base da “revienga”. No fundo, é uma chatice o Gelson não ser perfeito. Por isso, vai de sentirem comichões e ensaiarem aquele tratamento bonito, ao som do assobio (hoje reforçado com frases causticas nas redes sociais) com que já se brindaram jogadores como Figo, Quaresma, Nani ou Mané, outros dos nossos “filhos” que levavam um correctivo de cada vez que não atingiam a perfeição.

O que esta gente não percebe, desde logo, é que Gelson é um jogador único no nosso plantel. Mais, que Gelson caminha para fazer parte de uma elite que oferece ao jogo algo que muitos querem, mas não podem.

Venha como vier a bola – e tantas vezes que lha passam à toa – ele ajeita (conta aí as vezes que o faz de primeira e na passada) e arranca. Não importa se o defesa está a meio metro se a três metros. Arranca. Para lá, para cá, bola colada ao pé mudando de direcção à medida que o puto ganha metros em drible, como se fosse porta-voz de uma manifestação contra as amarras do futebol moderno. E nessa sua missão de dar-nos coisas que cada vez menos vezes nos dão, Gelson rebenta os defesas e rebenta-se a si próprio. Não há contenção, não importa dosear o esforço. Interessa, isso sim, oferecer vertigem e velocidade ao jogo, a mesma vertigem e velocidade que no jogo deste Sporting só-sai-dos-pés-do-Gelson!

Quem é que ganha mais vezes lances de 1×1? Quem é que ganha mais vezes a linha? Quem é que puxa mais vezes para dentro e procura as diagonais dos colegas nas costas da defesa desposicionada? Quem é que mostra tê-los no sítio para partir para cima, para sair em drible, para te fazer levantar do lugar seja qual for o adversário que apanhe pela frente? E se isto não chega é vê-lo, depois, sem quase parar para respirar, a galgar metros e metros, em sprint, para vir recuperar posições defensivas, num crescimento táctico que se nota de semana para semana, mas que, felizmente, ainda não lhe rouba o descaramento. O mesmo descaramento que outros extremos com o carimbo Rampante mostraram ao mundo, sempre com a mesma desconfiança e crítica fácil por parte de quem os viu crescer!

E tão absorvidos estão em apontar o dedo ao puto pelo facto de ele não ser um diamante lapidado e formatado, que nem reparam naquele pormaior que é ter o Gelson a fazer aquilo que escrevi acima esquecendo uma lesão que carregou durante meses, que carregou enquanto a táctica da equipa era bola no Gelson e fé no Bas Dost. E é por isso que termino o texto com uma expressão que mereceu, da parte de muitos, mais aplausos do que aqueles que dispensam ao nosso 77: Bardamerda para todos aqueles que não gostam do Gelson Martins!