“Vais levar o equipamento do Sporting, pai?”
«Talvez. Decido mais logo»
“Vai ser bué da fixe!”
Este “vai ser bué da fixe!” refere-se ao treino. Um treino diferente, que assinala o Dia do Pai, convidando o progenitores a partilharem um final de tarde com os filhos, submetendo-se aos exercícios que eles enfrentam durante a semana. E, como não podia deixar de ser, o Sporting veio à baila. Vem sempre. Onde jogamos, quando jogamos, com quem jogamos e, seja em que modalidade for, a pergunta que espera a resposta mais importante de todas: «vamos ver?».
E é perante aqueles olhos a brilhar que penso, tantas e tantas vezes, acho que cada vez mais, naquela que é a minha missão enquanto Sportinguista. Enquanto protector e transmissor de um conjunto de valores dos quais me recusarei jamais a abdicar. Enquanto guardião de memórias, como aquela de poder ver os craques, os ídolos, a passar ao meu lado em direcção ao treino, naquele campo número dois com vista para a 10-A.
De cada vez que lhe conto isto, a minha filha solta um revoltado “granda sorte!”. E ela tem razão. Granda. Sorte. Tão grande que, se fechar o olhos, ainda sou capaz de escutar o som dos pitons, os célebres de alumínio que cravavam os nossos sonhos nos pelados. Os pitons daqueles que me inspiravam e me faziam querer ser jogador do Sporting. Não era ser jogador de futebol. Era ser jogador do Sporting (e, por isso, nunca consigo controlar o sorriso quando a ouço dizer que quer ser jogadora do Sporting).
Na altura dizia-se que tinha estilo entrar em campo a mascar pastilha. Sim, mais do que afastar os nervos, tinha estilo. E um gajo, armado em parvo, também queria ter estilo, nem que para isso tivesse que usar cortes de cabelo manhosos e entrar em campo a mascar pastilha. De alcatrão, está bem visto, provavelmente uma das maiores merdas que devo ter consumido ao longo da infância, vendidas no carrinho da desgraçada, plantado à porta da escola, capazes de deixar-te a boca toda negra, mesmo a pedir uma carcaça com tulicreme para apagar os vestígios de uns centavos mal gastos.
Bem melhor do que essas pastilhas, sabiam as bolas de berlim. Na praia, claro. Porque o meu Sporting também sabe a bolas de berlim comidas na praia. Não havia diários desportivos. Quer dizer, se a memória não me atraiçoa, quase que havia, pois iam alternando no dia em que eram publicados. A Gazeta, o tal jornal que oferecia um prémios às melhores claques, com a Juve Leo a ganhar sempre, e A Bola, então num formato inacreditável, tipo A2, e que te obrigava a um verdadeiro curso para aprenderes a lê-la contra o vento. Entre pingos de sal do cabelo molhado e dedadas de gordura das ditas com creme (também não havia a mariquice do sem creme ou da massa de alfarroba), o Sporting ensinava-me a ler e fazia-me sonhar.
Qualquer marreco que fosse anunciado como reforço, era imediatamente o melhor. Não havia internet, não havia youtube, não havia o partir de pernas antes mesmo de pisar a relva de Alvalade. Os números eram de 1 a 11. Sem nome. E para eternizares uma camisola sem nome dava o dobro do trabalho. Era esse o desafio: de bola de berlim devorada e páginas do Sporting lidas, passar o resto do dia de praia a jogar à bola, alguns com brindes como aquele final de tarde em que apareceu o Marinho Peres com os filhos e eu pensei que o golo de bicicleta que marquei me valeria um convite para treinar com o Douglas…
Não valeu o convite, mas alimentou-me as memórias. Memórias que passo. Memórias às quais me agarro sempre que me sinto a sufocar por um olhar o Sporting como um campo de batalha. Mais do que romantismo isto é, para mim, a tábua de salvação. Hoje. Sempre. Quanto o barulho parece ensurdecedor, desligo o telefone com wi-fi, desligo o computador, desligo a televisão esperta, atiro o comando para o raio que o parta. Mudo de sala. E lá está ela, sem comando, ecrã com a curva para fora, sinal vindo de uma antena manhosa, apenas dois canais.
Ligo-lhe um Spectrum, depois um Amiga500, para ajudar a passar a semana. E espero pelo sábado de manhã. A minha mãe foi à praça e vai trazer-me uma saquilada de bisciotos com gluten. O meu pai vai ter que esperar, até pôr a rodar um vinil que alterna entre o Zeca, a Lena d’água ou o Comanchero. Puxo o meu irmão para o meu lado e, juntos, ensaiamos aquilo que jamais percebemos ser uma espécie “aulas de canto para aplicar na bancada”.
Ao ritmo do Pedro Malagueta, cantamos que “lá em cima, há planetas sem fim”. E quando regressamos à terra, há uma campainha a tocar chamando-nos para ir para a rua e dando início a dois dias em que somos jogadores do Sporting a raspar joelhos no alcatrão, em que pedalamos furiosamente com camisolas listadas feitas pela avó ou patinamos sem rodas com sticks de madeira prensada acertando na bola que aparece. Dois dias que só terminam com o Domingo Desportivo, espaço onde se fala de futebol e onde tens que esperar uma eternidade para saber qualquer coisas das modalidades.
Este é um pedaço do meu Sporting. Aquele que me protege. Aquele que protejo. Aquele que, enquanto pai, quero que seja o da minha filha, mesmo que adaptado a uma versão 2.0. O meu Sporting, com sabor a bolas de berlim e a pastilhas de alcatrão. E tu, ainda te lembras a que sabe o teu Sporting?
19 Março, 2019 at 16:04
Desculpa lá, mas… fuoda-se, caganda texto!
Só me ocorre dizer que “ignorance is bliss”. E o mal está aí: hoje em dia, sabemos de mais. É o reverso da medalha do progresso. E como hoje em dia as crianças aprendem mais depressa a mexer no computador do que o abc e 2×2, e ouvem os pais a discutirem assuntos que há 20 anos não discutiam, essa bendita ignorância depressa se perde. Assim como o sabor a pastilhas de alcatrão e bolas de berlim. E, sim, lembro-me bem desses sabores. E sinto nostalgia por já não os saborear.
19 Março, 2019 at 19:44
Pensamos que sabemos de mais. As redes sociais são um desfile de “achismo” que cada vez mais me constrange e afasta. Só sei que nada sei, disse um dia o filósofo e essa formulação é tão simples quão genial. É por isso que, tantos séculos depois, continua a ser válida. Cada vez mais.
19 Março, 2019 at 16:10
Não sei se este é o melhor texto que já escreveste, mas sei que voltaste a deixar-me de lágrimas nos olhos!!! E que bem me fez chorar!!! E que bem me fez recordar a cara do meu pai quando pintei um pequeno pónei às riscas verdes e brancas!!! Obrigada por uma vez mais tentares salvar-nos do sufoco!!! Isto não tem preço!!! E o meu Sporting sabe a gelado de morango e baunilha!!!
19 Março, 2019 at 16:14
O meu Sporting cheira a courato das antigas roulotes, a conversa de gente grande que falava com o meu pai entre copos de vinho, bagaço e cervejas médias (qual copinhos de plástico…). Soa aos pregões dos vendedores de cachecóis e bandeirinhas, das antigas bancas de venda, onde lá caia uma moeda para nougats ou queijadas. O meu Sporting sabe ao vento que circulava pela oval do antigo Alvalade e das massas enormes com que aquela gigantesca curva se pintava. O meu Sporting traz-me sempre de volta o antigo Alvalade (confesso que não tenho um ínfimo da sensação de grandeza neste Alvalade XXI), onde até a ferrugem e a alvenaria manchada parecia ter pinta de história e histórias. O meu Sporting sabe a camaradagem e a centenas de amigos que foram e vieram, com quem passei horas nas roulotes já depois de ter emprego e dinheiro meu para gastar nestas andanças. O meu Sporting sabe a verões inteiros a passar pela banca de jornais, fazendo um desvio do caminho para a praia, só para saber se o tal craque vinha mesmo. Sabe a editar à pata os nomes todos das equipas nos jogos de computador. Sabe a andar à porrada com outros putos só porque chamaram cagalhão ao Silas (o brasileiro). O Sporting sabe a outras tantas coisas da minha vida, boas e más, alegrias e tristezas, lágrimas de alegria e as outras. Obrigado pelo texto Cherba.
19 Março, 2019 at 16:18
eu é que agradeço a partilha. Continuo a achar que estamos mais perto de tudo que desejamos para o Sporting, se tudo fizermos para não deixar morrer tudo o que nos tornou doentes por ele
19 Março, 2019 at 17:21
que grande texto cherba.
revivi no teu texto a minha infancia e os meus tempos de teenager, acho que sou um bocadinho mais velho do que tu , fechei os olhos durante uns minutos no trabalho e foi tão bom essas imagens que descreves passar a minha frente.
não, não queria ser jogador de futebol queria ser jogador do Sporting, eu era quando jogava sozinho a bola ( as vezes acontecia ) o jordão, o manel, o oliveira e eu fazia parte dessa equipa, fazia passes imaginarios, fazia desmarcações para mim mesmo e no final era eu que marcava os golos.
esse Sporting era lindo, era belo, que saudades desse Sporting.
e tenho saudades desse sabor.
19 Março, 2019 at 17:39
e como é dia do pai, as saudades de estar colados ao radio a ouvir o relato, era a coisa mais importante nessas tardes de domingo, dos abraços após um golo e a falta do seu cheiro que sentia ao estar colado a ele, das viagens para ver o Sporting, da cumplicidade, enfim saudades.
19 Março, 2019 at 17:39
que sinto
19 Março, 2019 at 23:14
Igualmente amigo agora ate as lagrimas me vieram aos olhos eu fazia jogos de futebol eu correndo atras de uma bola com um cao pretinho que tinha o nome de Jacky a importunar-me e fazia jogos em que ate a vizinhanca do quintal dos meus avos ficavam a saber a constuitcao das equipas de um a onze e como era dos anos 80 era o Meszaros o Oliveira o Jordao e Manel Fernandes o Morato o Venancio o Damas o Litos o Xavier o Mario Jorge entre outros enfim ate o cao tinha o nome do goleador do Porto o Jacques se bem que era o Jacky mas corria para caracas e la ia eu directo ao banho depois de pingar em suor mas garanto foram grandes jogos.
Ou quando jogava Subbutteo em minha casa fazendo relatos das jogatanas.
19 Março, 2019 at 22:33
Belo testemunho do tasqueiro-mor Cherba, parabéns!
19 Março, 2019 at 16:17
Eish!
Somos da mesma idade, fdx!
19 Março, 2019 at 16:21
É pó cú, é pó cú!
Alfmufadinha pó cú!
BTW, os Hamburguers do Leoburguer sabiam-me a bife do lombo!
19 Março, 2019 at 22:46
Ahahahah, essas almofadinhas com a mola…. fdx.
“…Onde o hamburguer é mais hamburguer e basta ser do Sporting.”
19 Março, 2019 at 16:22
Yap, devemos andar todos na casa dos 40, agora jogar à bola na rua é impossível
19 Março, 2019 at 18:23
EIsh, é mesmo a geração dos 40! Iamos de férias para o Algarve em Julho e de manhã eu e o meu irmão esperávamos ansiosamente que o meu pai viesse das compras com a Bola debaixo do braço, para ver as “trutas” que chegariam! Na altura em que o Record era underdog…
Lembro-me bem da batalha pelo Amunike, uma autêntica novela todos os dias! 🙂
19 Março, 2019 at 16:20
Revi-me em tudo, mas em tudo, desde a bola de Berlim, ao spectrum, à campainha para ir para a rua jogar à bola até aos desenhos animados do era uma vez… Um post soberbo Cherba
Muito do meu sportinguismo foi incutido nas futeboladas de rua com os amigos e amigas
19 Março, 2019 at 16:22
Eu tenho a agradecer ao meu pai não ligar a ponta de um caralho á bola 🙂
Sim, apesar de ser um simpatizante que não liga nada do Porto nunca se meteu nas escolhas dos filhos, nem tão pouco influenciou.
Aliás 4 filhos: 2 lampioes, 1 portista e eu Sportinguista, sócio, adepto e louco pelo clube.
Fodasse!! 🙂 Sportiiiing
19 Março, 2019 at 16:23
Quem me diria que às quatro da tarde do dia 19 de Março de 2019, estaria a cantar “lá em ciiiiiiiiiiiiiiima” com um enorme nó de nostalgia na garganta!
Oh Captain, my Captain! Que nunca te falte alma para nos guiares de volta a este sentimento incrível a verde e branco pintado! O Sporting é do caralho, a Tasca é do caralho e tu és do caralho!
19 Março, 2019 at 16:32
O meu Sporting sabe a 6 dias de ansiedade em que, depois de chegar da escola, ia ao supermercado do bairro cravar rolos das maquinas registadoras para levar um saco cheio para o jogo. Sabe a acordar ao fim de semana e ir comprar um desses tais jornais desportivos mesmo antes do pequeno almoço. Sabe a sair de casa às 11h quando jogo era às 19h. Sabe a entrar no estádio 4 ou 5 horas antes do jogo com duas sandes e uma maçã na mochila e a ficar ali, ao sol, ao vento e à chuva, com o rabo quadrado na bancada de cimento, vestido de sacos do lixo pretos em dias de tormenta. Sabe a “a Mini Foto estúdio oferece um desconte de 10% aos sócios do Sporting”. Sabe a “a Mako Jeans oferece um par de jeans ao primeiro jogador do Sporting que marcar um golo”, sabe a
“Olha o Lagarto estendido ao sol,
que bicho esperto, campeão de futebol!
Joga tão bem, tem jogadores tão famosos,
que os seus rivais dizem todos receosos:
Lagarto! Lagarto! lagarto!”
19 Março, 2019 at 16:41
E as camisas do Vitor Emanuel também! A quem marcasse o primeiro golo!
19 Março, 2019 at 16:46
E publicidade ao “cóifer” costa…Textualmente
19 Março, 2019 at 16:36
O meu Sporting sabe a distância, seja la qual for o sabor da distância.
Sabe a tudo o que falas, sabe a Gorila e a tentar meter um pacote inteiro das super na boca de uma vez até não conseguir mexer o maxilar.
Sabe a torcer para que o Portimonense não descesse para conseguir ir de Lagos a Portimão e ver o Sporting uma vez no ano.
Sabe a trocar as gorilas e o spectrum, por litronas e semanas academicas, e tar todos os fins de semana batido no S. Luis a ver o Farense e esperar que fosse o fim de semana do Sporting.
Sabe a saudade porque gostava de voltar a esses tempos em que só se ligava à bola e não a emprestimos obrigacionistas e agentes e dividas e merdas que só servem para me afastar cada vez mais do futebol. Não do Sporting, mas do futebol.
19 Março, 2019 at 16:46
Grande Cherba, como me revejo nas tuas palavras. Aliás atrevo a dizer que plagiaste os meus pensamentos, ainda o jogo com o Santa Clara foi a prova provada deste maldito estado de alma.
Grande texto, com uma profundidade medonha.
Abraço Fraterno
SPORTINGGGGGGG
19 Março, 2019 at 16:48
Isto era um estádio
https://ibb.co/q5QvLjq
19 Março, 2019 at 17:14
Digam o que disserem, a sensação de entrar no Alvalade XXI não se compara à grandeza que era entrar no velhinho Alvalade. Cheirava a glória, conseguias sentir o peso da história e das conquistas que foram festejadas ao longos dos anos naquele estádio.
Tinha 7 anos quando o meu pai me levou a Alvalade pela primeira vez, jamais esqueci aquela sensação de ver aquele relvado verde a brilhar sob os holofotes…foi aí mesmo, nesse momento, que me apaixonei por este clube.
19 Março, 2019 at 17:25
Totalmente. Nem tem comparação
19 Março, 2019 at 20:40
100% de acordo! Na lateral sul, subia-se uma rampa para aceder a uma das entradas da bancada. Era cá um feeling essa pequena subida… ainda mais aí com um 1,30m de altura… Escuro… e depois WOW, o grande estádio aos nossos pés!
19 Março, 2019 at 20:41
O nosso estádio é feio, ponto!
19 Março, 2019 at 23:25
Exactamente como eu me lembro!
Aquela ansiedade de chegar lá a cima e WOW!
Topo sul,sempre.
19 Março, 2019 at 17:43
muito mehor do que o novo.
saudades do caralho
19 Março, 2019 at 17:47
Puta de nostalgia.
19 Março, 2019 at 22:37
Q nostalgia, q bela chapa!
19 Março, 2019 at 16:53
Saudades, saudades de tudo, de sentar o rabo no cimento, de apanhar molhas quando chovia, até de ver o Leal a jogar tenho saudades…
19 Março, 2019 at 17:12
Boa tarde Sportinguistas! O meu Sporting foi vivido ao longe porque vivo no Algarve e sou quarentão, ou seja, na minha altura não havia acesso rápido nem muito disponível a Lisboa. Tornei-me Sportinguista pela loucura do meu avô materno que quando me apanhava de férias da escola em Lisboa levava-me sempre ao estádio embora sem jogo porque era na altura da pré-epoca. Injectou-me sportinguismo nas veias e eu aprendi a adorar o meu clube!
No Algarve o meu avô paterno tudo fez para que eu fosse lampião mas havia algo que me dizia que não era o clube certo para torcer até porque desde cedo comecei a ouvir os relatos dos mais velhos que repetiam vezes sem conta que os títulos lampionicos não eram merecidos pela intrujice de que se revestiam! Viver o Sporting quando se está longe era nesses tempos de rádio colado ao ouvido e a sofrer só de imaginar cada lance! Ainda me lembro do verão em que cheguei a casa do meu avô em Lisboa e ele tinha um disco de vinil do plantel do Sporting a cantar depois de nessa época terem sido campeões… Meszaros, Jordão, Manuel Fernandes, Oliveira and so on and so on!
Saudades grandes desses tempos! O meu pai, que nem ligava muito à bola embora Sportinguista, nesse ano comprou-me a minha primeira camisola do Sporting… Era de um material super agressivo e picava que se fartava mas eu usava-a como se fosse de seda!
Só eu sei o que chorei nos 3-6 já com 21 ou 22 anos! Como é possível este amor platónico à distância? É assim… É ser Sporting!
19 Março, 2019 at 17:14
E as bandeiras e cachecóis que todas as mães tinham que fazer?
19 Março, 2019 at 17:30
E avós…
Ainda tenho uma viva com 102 anos que bordava Sporting em tudo o que era roupa.
19 Março, 2019 at 17:15
O meu Sporting sabe a finos e a caracóis, isto porque a primeira vez que bebi um fino com o meu pai foi a ver o Sporting e estas coisas, por mais pequenas que sejam, marcam.
Era o único da turma a ser do Sporting, isto no norte não é fácil, andava inchado quando ganhávamos e a ter a esperança que enquanto matematicamente fosse possível tínhamos que acreditar.
Sofri mais do que festejei, senti-me o maior com o bis do Yordanov ao Marítimo, chorei no 3-6 e toquei no céu em Vidal Pinheiro.
Cresci a achar que qualquer tosco que comprávamos era o maior do mundo, quem não se lembra do Ouattara ou do Missé-Missé, e que o Maradona não chegava aos calcanhares do Balakov.
Tornei-me adulto com o Acosta e “voei como o Jardel entre os centrais” enquanto estudava em Coimbra.
Fiquei rouco com Miguel Garcia na altura da queima, para um tal Daniel Carvalho me estragar a fase dos exames, ainda mais que um qualquer Vital Moreira ou um Aníbal de Almeida.
Depois… depois cresci, amadureci, fiquei menos romântico, fui-me curando com Soares Franco, com Bettencourt; com Godinho Lopes fiquei quase bom, tive uma recaída com Bruno de Carvalho sendo que o Doutor me tem aproximado da cura, mas a doença… a doença pelo Sporting está lá, e independentemente do timoneiro não passa…
Acabo como comecei, o meu Sporting sabe a finos e a caracóis, com o meu pai e o meu irmão, num qualquer jogo de pré época, ainda no século passado…
PS: Vejo sempre o futebol com o meu pai, sempre, é aquele hábito que criei, aquele momento nosso, só nosso, que espero que dure por muitos anos.
Feliz dia do pai, para o meu, para quem o seja e para todos os vossos.
19 Março, 2019 at 17:33
Grande texto, pá.
Vou a caminho de uma aula de dança contemporânea (fui engatado), mas a seguir vingo-me no treino do puto.
Hoje levo a 12.
19 Março, 2019 at 17:39
Grande Cherba, gostei!
A minha nostalgia verde leva-me:
– Ao velhinho estádio de Alvalade a ver e rever uma noite inesquecível contra o Dínamo Zagreb, com Antònio Oliveira (nada inferior a Bruno Fernandes, aliás muito parecidos) a fazer um hack-trick memorável.
https://m.youtube.com/watch?v=I_xk7ztyYbk
– Estar na bancada a ver um treino em que Josefa Venglos resolve tornar a perna esquerda de Futre “incapacitada” com uma ligadura até ao joelho (tipo gesso) para que ele aprendesse a chutar com a direita…Ele que poderia ter sido um dos melhores de todos os tempos foi um dos maiores traidores, que o diga o Manuel Fernandes!
– Ver jogar juntos Oliveira, Manuel Fernandes e Jordão era único, sem esquecer o Keita.
– Ver Luisinho em pés de algodão e senhor de uma técnica incrível para um central, a tratar a redondinha como poucos
– O imperturbável Meszáros a saltar num cruzamento e a tirar a bola de um adversário e a ficar com ela numa só mão. Mas o melhor guarda-redes que passou pelo Sporting foi sem dúvidas o saudoso Damas (sempre elegante mas com uma elasticidade incrível), sem esquecer o Schmeichel, claro.
– Estar junto á Porta 10A, como se estivesse á porta da…minha casa, junto da minha família!
– Sentir-me arrepiado cada vez que entrava no estádio, chorar de alegria com um golo e de tristeza quando entrava na nossa baliza. Sentir um nervosismo incontrolável sempre que escutava o relato(!) de qualquer jogo do Sporting. Faltar ás aulas para ouvir o relato do descaramento do Ivkovic a desafiar o Maradona no penalty contra o Nápoles e a defendê-lo. Naquele momento senti-me como que se tivesse sido campeão do mundo…em amor ao meu clube, que entretanto se vem esfumando, graças á corrupção que o mundo do futebol se transformou. Hoje por vezes fico confuso quando estou a ver um jogo do Sporting e nem um único cabelo dos meus braços se arrepiam e me mantenho mais calmo que um Kuala adormentado…
19 Março, 2019 at 23:20
Os relatos porra!
Que sofrimento atroz era ouvir relatos na rádio quando era criança.
Relembro os 4-2 de Southampton mas também os 0-5 no Celtic…
19 Março, 2019 at 17:53
Siga desviar o importante ao som do batuque.
19 Março, 2019 at 19:59
Classe.
SL
19 Março, 2019 at 17:56
Também o meu pai era do SCP, aliás esteve mesmo para ser jogador do SCP ou do fifica … Contudo, o futebol naquela altura não era o que é hoje e o meu avô não o deixou ir … O meu pai foi jogador da CUF e, em junior já era chamado para treinar e jogar pelos seniores … E atenção que a CUF naquela altura tinha uma excelente equipa … até ia às competições europeias …
Obrigado pai, pelos principios e valores inquebrantáveis que me transmitiste, por me mostrares o caminho da verdade, e também por me indicares o caminho do Sporting Clube de Portugal!!!
Um dos primeiros grandes jogos que tenho memória no velhinho José de Alvalade, foi os 7-1 aos lãpiões!!! Ainda tenho o bilhete!!! E tantos, tantos jogos em que as emoções falavam mais alto! Alguns anos depois, o meu pai deixou de ir ao futebol, não acreditava mais … Foi uns anos depois do inicio da frutaria … E eu comecei a ir com amigos e amigas … Entrei para a Torcida Verde, pois tinham um cartão que dava descontos para os bilhetes … DEpois Juve Leo …
Obrigado pai, nunca mas nunca esquecerei as palvras que escreveste numa fita do primeiro curso que terminei … Do teu melhor amigo de sempre e para sempre …
Também o meu pai nos deixou cedo, tinha 61 anos … Que descanses em paz pai, mas eu sei que continuas a sofrer pelo SCP!!! E como deves andar a sofrer novamente!!!
19 Março, 2019 at 18:08
1992 de férias em portugal, praia, sol etc.
onde vais pergunta a mãe ?
vou apanhar o comboio no porto para lisboa para ver a apresentação contra o psv eindhoven.
sozinnho ?
claro
e como regressas ?
não sei mas volto.
perdemos por 1:2 mas não estava triste, estive em Alvalade.
19 Março, 2019 at 18:23
Ganda POSTA !!
“se fechar o olhos, ainda sou capaz de escutar o som dos pitons, os célebres de alumínio que cravavam os nossos sonhos nos pelados. Os pitons daqueles que me inspiravam e me faziam querer ser jogador do Sporting. Não era ser jogador de futebol. Era ser jogador do Sporting”
Revi-me em praticamente todas as memórias, mas esta… é como se fosse hoje.
19 Março, 2019 at 18:26
Bem eu sou mais de peão, contra o Porto com o grande Keita.
Cheba tu que és de Sintra ainda és do tempo do Zé Maria dos Bolos a porta da escola? e na praia do Magoito?
SL
19 Março, 2019 at 18:28
isto ao vivo, pela radio ainda era pior que o brunovl. Na vila do Bispo era complicado na altura.
19 Março, 2019 at 18:39
Vila do bishop. Respect
19 Março, 2019 at 18:45
Uma pequena obra de arte, com comanchero e tudo, para não dizer Jordão, Manuel Fernandes e o jovem Oceano a jogar em semanas em que alternavam infinitamente no top o “life is life” do magnífico “one shot” Opus e o “money for nothing”….
Obrigado.
19 Março, 2019 at 19:02
respeito o texto mas recuso o papel de statler & waldorf do Sporting.
guardar memórias não é o espírito deste clube.
– fight and resist.
19 Março, 2019 at 19:03
Cherba, ganda posta, esqueceste-te de dizer que a Abosta era A2 e que cagava as mãos todas e no verão no Algarve quem não reserva-se estava feito que não a comprava.
Aterrei em Portugal em 1975 e fui viver para uma vila no meio do Algarve, nunca tinha visto o SCP ao vivo, só os relatos da emissora nacional.
Passado uns anos o Portimonense sobe à primeira e o meu pai diz, “quando o SCP cá vier nós vamos ver o jogo”, grande esforço para pagar 2 bilhetes pois a vida era complicada e no dia do jogo, carrinha Ford Transit com os adultos à frente e os putos todos atrás.
Passados uns anos, a primeira vez em Alvalade contra o Varzim, com o trio maravilha Jordão, Manel, Oliveira e um puto esquerdino que nos traiu, mais uma vez com o meu pai ao lado.
O meu pai deu-me esta doença, que passei aos meus dois filhos.
19 Março, 2019 at 20:17
Muito bom, deves ser da minha geração pelo que dizes…
19 Março, 2019 at 20:11
O meu Sporting tem aquele cheiro metálico quase sangue, misturado com o odor quente e suave do couro, de quem encosta um daqueles rádios “á séria” de transistores e proteção de cabedal, á orelha durante horas sem fim, a ouvir o hoquei e o futebol, o basket e o ciclismo…
O meu Sporting cheira a tinta de jornal usado (sim porque o pessoal do meu tempo, tinha mais coisas em que gastar o dinheiro…que é como quem diz que não tinhamos cheta para comprar um jornal) do vizinho Sportinguista do 3º andar que metia religiosamente a Bola do dia anterior na nossa caixa do correio…
O meu Sporting cheira a suor e a lágrimas, a cerveja choca e queijadas, cheira a boi e ao sal da Caparica, cheira aos posters do Yazalde, do Diniz e do Dé que saiam no Diário Popular ou era noutro qualquer que nem me lembro…(lá em casa só se compravam jornais desportivos com goleadas de 3 para cima ao carnide, tripeiros, ou estrangeiros)
O meu Sporting cheira a óleo de matraquilhos e a farturas “manhosas” cheira a tudo e não cheira a nada!!!
O meu Sporting, é o meu Sporting, não cheira a nada e quando vejo aquela listada verde e branca, sinto todos os cheiros do mundo…
SL
19 Março, 2019 at 20:13
by the way grande, grande, grande texto o teu Cherba…abco e se calhar vemo-nos amanhã, não?
19 Março, 2019 at 20:20
Grande texto, Caro Cherba!
Props!
SL
19 Março, 2019 at 20:26
O 6 jogava a 6 e o 10 na posição 10.
Havia liberos.
E guarda-redes de calças.
Jogos à mesma hora.
Futebol de pregos. Subutteo para os ricos. E F1 com caricas.
Abençoado Cavaco, por tua causa dava para jogar à bola até às 22.
Não percebo é como tanta gente sobreviveu, comendo glúten todos os dias.
20 Março, 2019 at 7:36
O problema não é o gluten, mas a paneleirisse.
Há uns anos se o Sporting estivesse a ser destruido o pessoal saia em peso à rua e protestava, dava porrada, tomava o clube de volta.
Agora o pessoal prefere continuar a assobiar e a dizer “só passaram 6 meses/12 meses/2 anos vamos dar tempo”…..
O maior entrave ao progresso é o comodismo, o luxo, a boa vida, porque o ser humano gosta de se conformar e deixa de lutar.
19 Março, 2019 at 20:38
Esta posta näo podia deixar de comentar…. a paixäo genuína. Era isto e mais algumas coisas, tempos que näo voltam, mas que é täo bom recordar. As peladinhas na escola Sporting vs Corruptos do sul, que nem importava quantos eram, podiam ser 3 contra 10, as idas a Lisboa , religiosamente quando havia jogo caseiro, etc etc etc… Boa posta Cherba
19 Março, 2019 at 20:49
Nasci em Matosinhos e sempre aqui vivi. Aos seis anos vi, pela primeira vez, em Braga, o Sporting ao vivo na companhia do meu avô. Era guarda redes o Carlos Gomes, pelo que podem imaginar há quantos anos vai. Trouxe uma foto autografada por ele a fazer um voo extraordinário. Igualmente, na qualidade de atleta tive o prazer e orgulho de representar o Nosso Grande Clube na modalidade de bilhar (3 tabelas), a convite do Jorge Theriaga. Desde criança que o Sporting C. P. me fez tremer de ansiedade, me fez gritar de euforia, me fez chorar de alegria. Nestes últimos 5 anos a emoção voltou e como exultei com as vitórias nas modalidades. Confesso que chorei e senti que finalmente temos um presidente sportinguista. Recordei a Nave num jogo de hóquei contra o Oeiras, nosso principal rival, com jogadores notáveis (ex: Livramento) que foram campeões europeus. Estive presente, sempre de pé, com a Nave lotadíssima. O texto está magnífico, sendo importante que não deixemos regredir o Nosso Sporting. Vivendo junto ao mar, o Sporting sempre me soube a mar, sempre foi a visão de um horizonte extraordinária de paixão e poesia que nos aquece o coração. Viva o SCP