Vocês pensam que estão a falar para alinhados e acham que a vossa agenda é uma coisa que se instala por osmose. No momento em que escolhes o primeiro ponto para escrever que o anterior presidente devolveu o poder aos sócios é o momento em que eu tenho a certeza de que vens para esta mensagem com o objectivo de encarneirar mais uns quantos. Mas devolve o poder a que sócios? Àqueles que, com uma palavra contrária, eram perseguidos nas redes sociais, ostracizados e hostilizados? Mas pensas que estás a falar para a carneiragem e para as bolsas de desinformados que comem qualquer link, caralho?

Há uma coisa em política que eu nunca compreendi, e essa coisa tem estado escarrapachada no último ano de tasca. Muitas vezes serve até de regozijo ou gozo. Chamo-lhe o complexo Isaltino Morais dos adoradores do rei sol. Explica-se muito facilmente. Uma vez que os croquetes roubaram aos milhões, os milhares de euros (serão mesmo milhares?) desviados para os batuques são pura pintelhice. Deixo a reflexão para que a possas fazer e vais ver que é naquela coisa que dá pelo nome de valores que está a resposta.

Há outra coisa que me causa imensa perturbação. Interiorizemos, como vocês gostam de fazer, que o Bruno de Carvalho só fez coisas boas. Vocês estão tão habituados à porcaria de vida que levam e a uma espécie de sociopatia de tal forma entranhada que acham que um presidente é eleito sem ter de prestar necessariamente trabalho, como se o trabalho que presta ou que se propõe a fazer e para o qual foi eleito, fosse uma espécie de altruísmo para com aqueles que o acabaram de eleger. Vamos ser sérios. Bruno de Carvalho, fruto das circunstâncias do então passado recente do Sporting, foi convidado a presidir o Sporting e beneficiou, fruto dessas circunstâncias, da maior agregação e conciliação entre adeptos do clube, para que o clube se reerguesse. A sua postura até certa fase beligerante ajudou a isso, porque estávamos todos ávidos de sentimento e de emoção, num Sporting que estava moribundo. Facto. Bruno de Carvalho foi eleito para isso e só foi eleito por isso. Mas vocês já se esqueceram que houve famílias que numa época de crise mal tinham dinheiro provavelmente para pôr pão na mesa e que mesmo assim foram dar dos seus salários ao Sporting? Mas vocês já se esqueceram daquelas mensagens patéticas (provavelmente o primeiro presságio de que algo não estava bem), quando BdC dizia que os adeptos e sócios estavam a dar pouco? A dar pouco? Nunca a massa adepta do Sporting deu, em nenhum momento da história, tanto ao clube. Vocês querem mesmo comparar a base de apoio deste presidente com a do presidente BdC? E no entanto, o que faz ele, num momento em que já ganhávamos após 7 ou 8 anos de vazio no futebol? Fode o dinheiro todo no pior projecto desportivo (em termos de qualidade-preço) da história do Sporting Clube de Portugal.

Vocês estão de tal forma embrenhados nessa idolatria a uma espécie de totem que esquecem que o pavilhão João Rocha, ou a inexistência deste, é uma metástase de um cancro que os sportinguistas, por sua iniciativa própria, decidiram a dada altura erradicar. É na presidência de Bruno de Carvalho que o pavilhão é construído mas é do suor dos sócios e do trabalho dos sócios e adeptos que esse pavilhão se materializa, beneficiando-se de uma presidência que foi eleita, sim, para devolver a voz aos sócios num momento de ruptura. Não foi Bruno de Carvalho que pôs o seu dinheiro na construção do pavilhão. Consta mesmo que os prémios desportivos, ou o raio, que foram auto-estipulados pelo e para o próprio, não tiveram como destino a construção desse pavilhão ou a robustez de qualquer modalidade do clube. Portanto, antes de, na vossa sociopatia congénita, atribuírem todos os méritos da construção do pavilhão (e de outras coisas) ao senhor ex-presidente do clube, considerem a ajuda determinante e indispensável de uma massa adepta que apoiou com 90% a continuidade desse presidente e seus corpos directivos num momento em que já só dava alucinação geral, mas que, meses depois, mergulhados numa completa destruição colectiva, optaram por fazer algo que ainda vai estando ao alcance das pessoas sócias de um clube que é democrático mas que quase o deixou de ser. Agora é lidar e perceber que pessoas como eu não viram um minuto de um dia seguinte ou de um programa desportivo qualquer desde aquele fatídico dia de Maio em que se deitou tudo a perder, e que não é por aí que as decisões se tomam.

Eu já meti uma coisa na cabeça e lido bem com a própria: o ex presidente do Sporting teve as condições mais vantajosas para fazer o seu caminho e para ajudar o Sporting naquilo a que se propôs e para o qual foi eleito. Só deu alucinação por sua vontade própria, pelo autismo permanente que o levou a misturar clube e vida pessoal, e pelo facto de ser um perseguidor daquele que lhe é crítico, o que no Benfica e Porto até poderia resultar bem. Colocou o clube, depois de todas as coisas boas que aconteceram, numa espiral destrutiva, onde a palavra que melhor lhe ocorria, na vez de meditar e dar a voz aos sócios por sua iniciativa própria, era o facto de ser chato. Tudo era chato. Mudou-se a página. Não é a página que eu queria, porque essa chamar-se-ia João Benedito, mas é a página que os sportinguistas escolheram e que está a ser construída. Mal ou bem, os sportinguistas pronunciar-se-ão, como sempre o fizeram, mesmo nas condições mais desfavoráveis.