Por mais voltas que tentemos dar, por mais que tentemos agarrar-nos ao que podia ter sido e não foi a primeira parte, a verdade é que o Sporting sai vergado a uma das mais pesadas e humilhantes derrotas da sua história e da história dos dérbis. Há quem ache que não há motivos para preocupação, mas a verdade é que as consequências para nova época são imprevisíveis

Benfica vs Sporting

Começamos pelo melhor, certo? Falemos, então, do Sporting que esteve em campo entre os 5 e os 39 minutos da primeira parte.

Mesmo com a surpreendente aposta em três centrais jamais testados juntos ao longo da pré-época, o Sporting avançou para aquela que seria a melhor exibição num jogo grande. O bloco começou baixo e foi subindo, subindo, até ao total encaixe de peças que permitiam a pressão alta sobre os jogadores do benfica. À direita, mesmo com essa insistência em colocar extremos de pé trocado, Raphinha ensaiava arrancadas que provocavam desconforto. Do outro lado, a estratégia passava por jogar nas costas do jovem Nuno Tavares, claramente a acusar a estreia.

E foi por aí que, logo aos 3 minutos, Bruno Fernandes foi lançado na perfeição por Matheieu e cruzou mal para um Dost bem posicionado. Ferro, central encarnado, meteu-se no meio e o seu corte só não deu golo porque Vlachodimos fez uma grande defesa. O redes encarnado haveria de voltar a brilhar aos 29′ e aos 38′. Primeiro, desviou para canto uma bomba de Bruno Fernandes, após exemplar saída da pressão em futebol directo, de Coates para Dost e do holandês para o camisola 8. Depois, fez a mancha suficiente para que a bola rematada pelo isolado capitão leonino ficasse presa nas pernas, num momento de duplo desespero para os adeptos do Sporting, que não só viram a oportunidade ser desperdiçada como ficaram a chorar a opção de Bruno Fernandes, que optou pelo individualismo quando tinha Dost completamente sozinho a olhar para a baliza deserta.

Depois, veio aquela célebre máxima de que quem não marca arrisca-se a sofrer. E o Sporting sofreu, totalmente contra a corrente do jogo e fruto de uma inexplicável falha de uma equipa que estava com três centrais. Pizzi virou o jogo colocando a bola nas costas da defesa e Neto esqueceu-se de acompanhar Raúl de Tomás, deixando o jovem Thierry Correia a ter que fazer a compensação. Resultado? Rafa ficou solto e encostou, num lance em que Renan também não fica nada bem na fotografia.

E já que falamos em Thierry Correia, aproveita o escriba para dizer-vos que o miúdo foi o nosso melhor jogador ao longo dos 90 minutos de ontem, revelando tal personalidade que, numa altura em que o pesadelo já tinha começado, era ele que assumia a condução de bola e tentava agitar as águas para lá do meio-campo. E já que falamos em Thierry Correia, aproveita também o escriba para dizer-vos que é inexplicável que se tenha colocado a hipótese de entregar o lugar a Ilori ou que um Thierry seja alguma vez na vida tapado por um Bruno Gaspar. Inexplicável e sintomático do que tem sido prática ao longo dos anos.

E seria o jovem Thierry, aos olhos esbugalhados de terror do companheiro Max, que não susteria as lágrimas assim que a bola entrou pela quinta vez na nossa baliza. Parece mentira, não parece? Depois daqueles 60 minutos da primeira parte em que a desvantagem era uma injustiça, veio o prolongamento e foi um descalabro espoletado por um desentendimento inacreditável entre Coates e Mathieu, com o francês a arriscar sair a jogar e a borrar a pintura toda.

Não sei o que se terá passado pela cabeça dos nossos jogadores, mas sei que a equipa morreu nesse momento e ainda teve que levar com a total falência da dupla Doumbia-Wendel, subjugada pelas alterações tácticas promovidas por Bruno Lage ao intervalo. Quando veio o terceiro, de livre directo, Keizer lá meteu Luiz Phellype e Diaby em campo. O primeiro ofereceu maior capacidade de pressão, o segundo ofereceu a mesma mão cheia de nada de sempre, sendo inexplicável que seja o eleito que impede Matheus Pereira, Jovane Cabral ou Plata de jogarem.

O Sporting abandonava os três centrais, Phellype até desperdiçaria uma oportunidade clara de cabeça, na sequência de um canto, mas isso em nada mudava o descalabro, nomeadamente de cada vez que a equipa tinha que reagir a uma transição rápida do adversário que, em noite de eficácia elevadíssima (5 golos em 7 oportunidades claras, num jogo onde, estatísticamente, o Sporting até teve mais duelos ganhos, mais cantos e a mesma eficácia de passe) acabaria por chegar à mão cheia de golos e remeter ao Sporting a derrota mais pesada dos últimos 33 anos.

E se uma derrota destas é marcante, o mais preocupante será perceber que a mesma resulta de um conjunto de sinais que vão sendo deixados. Podemos recordar, por exemplo, que há não muito tempo, perdemos com este mesmo benfica por 2-4, em Alvalade, numa noite que podia ter sido tão ou mais humilhante do que esta. Também podemos recordar que esta pré-época foi patética ao nível de resultados e de exibições e que soa a desculpa esfarrapada o treinador queixar-se da ausência de alguns jogadores ao serviço das selecções: o treinador está cá há oito meses e aquela lufada de ar fresco aquando da sua chegada parece ser cada vez mais fruto do acaso. Podemos perguntar, também, porque raio é que nós parecemos ter dado o estouro fisicamente muito antes do benfica? Ou podemos questionar o porquê de arrancarmos para mais uma temporada com a ideia de que os reforços vieram apenas para fazer número, com o treinador a passar a mensagem de que nem um tem condições para ser titular (a aposta em Neto foi circunstancial)? E, ao fim de oito meses, como é que continuamos incapazes de mostrar evolução ao nível do processo defensivo?

O “interrogatório” poderia continuar, mas, por momentos, lembro-me da intervenção do Presidente do Sporting Clube de Portugal, Frederico Varandas, dizendo que os Sportinguistas deviam estar chateados, mas não preocupados. Muito bem. Vamos então esperar que o Sporting consiga ter primeiras partes de 90 minutos e que misérias como a da noite de ontem não façam parte das novas experiências que justificaram o aumento de preço das gameboxes…