A participação da equipa principal do SCP no Campeonato Nacional BPI da 1ª Divisão do Futebol Feminino, depois de um primeiro arranque na Madeira, a 5 de Setembro, com vitória sobre o Marítimo por 0-2, teve a sua “retoma”, após 3 semanas de “intervalo”, logo com o derby dos derbies. O Sporting recebeu, às 17 horas do dia 26 de Setembro, a equipa do Benfica, actual campeã nacional e recém qualificada para a Fase de grupos da Women’s Champions League. Não se afigurava tarefa fácil. Mas as leoas já haviam batido as águias no jogo inaugural das competições oficiais portuguesas, conquistando a Supertaça.

Nesse jogo, uma vitória por 2-0 construída no segundo tempo desenhou logo boas perspectivas sobre o trabalho da equipa liderada por Mariana Cabral. Essa vitória e a personalidade e atitude demonstradas pela equipa destacaram o seu potencial (particularmente face às naturais dúvidas resultantes da enorme renovação do plantel). Notoriamente importante foi o grande capital de confiança conquistado pelas jogadoras e pelo colectivo. Essa conjuntura ainda apimentou mais o derby deste domingo. Importava confirmar o bom começo de temporada para ajudar a continuar o trabalho de consolidação da equipa e dos seus processos colectivos em ambiente de tranquilidade e alegria, sem deixar de manter alto o foco e a concentração (tarefa esta sempre difícil num ambiente competitivo tão desnivelado e onde, para Sporting e Benfica, o objectivo único desta Fase – o lugar na Série de Apuramento de Campeão – já estaria teoricamente “garantido” à partida).
E, entrando na análise ao jogo, essa parece ter sido a primeira diferença entre as duas equipas: a atitude em campo e a forma como encararam o jogo.

A Mariana Cabral, quase repetindo o 11 da Supertaça (a única alteração foi a inclusão da Joana Marchão no início da partida em vez da Alícia Correia), “deixou” logo vários sinais: primeiro, que “abria o peito às balas”, indo a jogo com as mesmas armas sem temor de qualquer perda de “efeito surpresa” que alguns “comentadeiros televisivos” apontaram como “chave” do desfecho no primeiro derby da época (sinal de coragem dado pela equipa técnica); depois, que está a construir uma base nuclear da equipa e que essa base será utilizada, no mínimo, nos encontros considerados mais “decisivos” nesta primeira Fase (sinal de confiança e coerência); depois que encara esta fase com o rigor competitivo que deve ser apanágio de qualquer equipa profissional (sinal de respeito pela competição). Do outro lado, a composição do 11 foi sinal de sobranceria, de falta de coerência estratégica e de um enorme e muito pouco profissional desrespeito pela competição (as declarações de Filipa Patão no final do encontro apenas acentuam esse “desnorte estratégico”).

Após um começo (de apenas 5 minutos) em que até parecia que as encarnadas iriam querer dominar o encontro carregando ofensivamente, o Sporting começa a aprimorar a saída de bola defensiva, libertando-se da pressão que as jogadoras mais avançadas do Benfica procuravam exercer. Mélisa começa a acertar o início da transição defesa/ataque porque Joana Martins, Fátima Pinto e até Andreia Jacinto começaram também a oferecer-lhe (à Mélisa, calaro) muito mais linhas de passe tornando essas transições mais fluidas (e desgastando as 3 jogadoras mais avançadas do Benfica, retirando-lhes muito da sua potencial eficácia). Ao “desactivar” tão cedo a arma que o Benfica pretendia apresentar em jogo (aposta na pressão alta para desequilibrar o adversário e criar situações de perigo eminente) foi o Sporting quem desestabilizou o adversário.

Aos 8 minutos uma boa transição com uma simulação de Joana Martins a desmarcar Marta Ferreira na esquerda e esta, com uma diagonal curta a isolar Diana Silva que desvia de primeira para uma boa defesa com os pés de Carolina Vilão. Aos 10 minutos, dois deliciosos pormenores técnicos da Brenda Perez (primeiro na finta, depois no remate em chapéu milimetricamente confeccionado) produziram um golo para ficar na retina de qualquer amante de bom futebol e, dinamitaram qualquer réstia de confiança que ainda pudesse persistir na equipa de Carnide.

Pouco tempo depois é Diana Silva, muito bem servida por Ana Borges, quem (agora no lado direito) semeia o pânico na defesa encarnada. Aos 18 minutos uma ótima saída da zona de pressão da Joana Martins, largando a bola para Ana Borges que serve a meio a Brenda Perez que noutro rasgo de génio faz um passe de morte para Marta Ferreira que fica na cara de Carolina Ferreira e remata na passada, proporcionando mais uma boa defesa com os pés à “keeper” das águias. O Benfica procurava pressionar como podia mas à medida que o tempo corria ia crescendo o desnorte e o recurso ao contacto físico, muitas vezes irregular, mas sempre contando com uma “estranha” mas já usual permissividade da árbitra Sandra Bastos (uma espécie de João Capela do FF).

Aos 36 minutos, 2 insistências de Andreia Jacinto, primeiro na recuperação de bola e depois no esforço para evitar que esta saísse pela linha lateral, colocando-a “jogável” na frente a que se juntou uma rápida desmarcação de Diana Silva a acorrer à solicitação in extremis da Anderia e a chegar primeiro à bola que a lenta Carolina Vilão, sendo derrubada pela guardiã vermelha e provocando, assim uma grande penalidade. Chamada à conversão, Joana Marchão não tremeu e, com uma bomba para o canto superior direito da baliza de Vilão, não deu a esta qualquer hipótese de defesa. Chegar àquela bola nem com Red Bull!

Aos 39 minutos, um choque a meio campo sem bola provocado por Catarina Amado (que não deu cartão nem sequer falta) acaba por causar a lesão da defesa direita e uma interrupção de 13 minutos (!!). Pouco depois do reatamento, um desentendimento entre Ana Borges e Carolina Becker desconcentra esta que faz um atraso disparatado para a Dóris que fica a meio caminho do destino desejado e é aproveitado pela Valéria Cantuário para reduzir para 2-1, a 3 minutos do intervalo.

A partida parecia estar relançada para a 2ª parte mas logo no recomeço, aos 47 minutos, Joana Martins (excelente jogo, mais um, da média leonina) tira mais um “coelho da cartola” e marca o 3º para as leoas com um bonito chapéu sobre a infeliz Carolina Vilão que passou boa parte do jogo a “apanhar bonés” … que é como quem diz … a sofrer chapeladas de levantar o Estádio. Se o Benfica foi para o intervalo com esperança de recuperar, sofrer um golo destes logo 2 minutos após o recomeço deve ter cortado essa ilusão (para mais após Filipa Patão ter levado a jogo para essa 2ª parte a Kika Nazareth).

Aos 55 minutos, a técnica adversária retira uma já estourada Valéria Cantuária para fazer entrar a Nicole Raysla, procurando dar mais poder atacante à equipa (a entrada de Marta Cintra para a defesa direita ainda na primeira parte em substituição da lesionada Catarina Amado já havia dado mais velocidade e discernimento na ala). Só que, pouco depois, aos 61 minutos um passe de maestrina da Marta Ferreira rompe toda a linha defensiva encarnada e desmarca a Diana Silva que se desloca entre linhas numa diagonal da direita para a esquerda e, à entrada da área, vê o adiantamento da Carolina Vilão e remata em diagonal oposta (da esquerda para a direita) retirando reação à Guarda Redes das águias que vê, assim o seu “espaço aéreo” violado pela 3ª vez por via de mais um chapéu de belo efeito.

Aos 68 minutos Filipa Patão tenta “pôr ainda mais carne no assador” chamando a jogo a Christy Ucheibe, mas ou o barbecue era pequeno ou o braseiro não acendia. E, mais uma vez, é o Sporting quem aquece o ambiente com mais um golo de fino recorte técnico, quer na finta e passe longo da Brenda Pérez (não sei se já disse … mas que jogadora!!), quer na desmarcação e remate na passada ao canto superior esquerdo de uma Carolina Vilão que ficou outra vez a ver os aviões a passar. Estava feito o resultado e sentenciado de vez o jogo.

De referir, entretanto, que:
– o Sporting apenas tinha 3 estrangeiras no 11 e efectuou 5 substituições mas fazendo entrar apenas jogadoras portuguesas. Já o Benfica usou 4 brasileiras (uma delas “formada localmente”), 1 canadiana, 1 espanhola e 1 nigeriana;
– Rita Fontemanha entou aos 71 minutos para sair aos 82 (é caso para dizer que sempre houve algumas jogadoras encarnadas – Pauleta, Cameirão e Ucheibe – que conseguiram causar estragos nas leoas; a Lacasse, que parece ter muito mau perder também deu 3 encostos bem maldosos na Brenda Perez, mas a classe da jogadora espanhola é tanta que nem dava troco, não caindo nas “provocações”);
– as declarações pós-jogo da Filipa Patão procurando desvalorizar os jogos desta fase, “coincidem” com o onze “sobranceiro” que fez iniciar a partida, mas “colidem” com as alterações em “desespero” que foram mudando esse onze à medida que o resultado negativo se avolumava;
– tão patéticas quanto essas declarações, só as loas exageradas ao feito do Sporting, que contêm o enorme perigo de cantar de galo antes de tempo, quando o que mais se exige a esta equipa neste momento é manter os pés bem assentes na terra, continuar o foco e a concentração no máximo, nunca perder a atitude de garra e compromisso e, sobretudo respeitar a competição e TODOS os adversários. A Mariana Cabral sabe-o e basta ouvir as suas declarações para perceber que reagir adequadamente ao sucesso pode revelar-se tão ou mais importante do que saber reagir face ao insucesso.

No próximo fim de semana o Sporting vai a Torres Vedras defrontar a única outra equipa que ainda não perdeu pontos na nossa Zona. Pelo discurso da equipa técnica e ds jogadoras estou seguro que disputarão o jogo com o mesmo rigor e atitude (e acredito que com a mesma inspiração) que têm demonstrado até aqui. Para podermos continuar a desfrutar do sucesso. E para nos isolarmos na liderança da Zona Sul.

* dos Açores com amor, o Álvaro Antunes prepara-nos um petisco temperado ao ritmo do nosso futebol feminino. Às terças!