O Sporting – Marítimo, foi um compêndio do que afasta as pessoas do futebol. No relvado, nas bancadas, até fora do estádio. Ou, se calhar, sou eu que já não tenho paciência

 

Sem conseguir explicar-vos bem o porquê, sempre tive inclinação a procurar nas bandas que escuta, canções que mereciam tanto ou mais ser escutadas do que as que era escolhidas para virar hits. Ora, os Coldplay, que saltaram para a fama mundial com Yellow, enquanto eu escutava em loop a Don’t Panic, têm uma canção, que dá título a esta crónica, e que, a dada altura, tem este trecho de letra

People moving all the timeInside a perfectly straight lineDon’t you wanna just curve away?

 

Fala-se aqui de conformismo. De deixar andar. De ser parte de um todo amorfo, estafado, repetido. Foi tudo o que foi o jogo de ontem, em Alvalade.

O Marítimo, com a corda na garganta e a olhar para uma possível desproporção à segunda liga, colocou-se em vantagem à passagem dos dez minutos, aproveitando um recorrente deslize defensivo do Sporting. Ora, se a estratégia dos insulares já passava por jogar em transições rápidas, a vantagem deu-lhes ainda maior margem para colocarem o plano em prática.

E o Sporting, com Morita e Nuno Santos de fora para se precaverem de um amarelo que os tirasse do dérbi e Paulinho de regresso após lesão, foi aquilo que é em 90% dos jogos: previsível, sem rasgo, sem futebol entre linhas, com os jogadores a ocuparem as suas posições como se desse procedimento mecânico resultasse alguma coisa. Resultou: 45 minutos deprimentes e oferecidos ao adversário.

Ao intervalo, Amorim teve que fazer algo. Não que tenha sido algo que fosse ao encontro da ideia de estar a preparar o futuro (Fatawu lá foi atirado para campo em desespero, sempre fora da posição onde deve jogar e onde já mostrou que faz estragos), não que tenha sido algo que sustente a propalada aposta na formação (o Sporting iniciou a partida com zero formados na Academia e terminou com Inácio e Esgaio). Meteu Morita, meteu Nuno Santos, meteu Inácio, e a equipa lá se agitou um pouco, muito por culpa do japonês que, em passinhos de ninja, lá ia tentando fazer jogar nos espaços entre os centrais e as laterais, permitindo que Pote e Edwards percebessem que havia necessidade de fazer o mesmo.

O inglês tentou um golaço, já depois de Ugarte ter tentado, mas a mira estava centímetros desviada do poste. Nas bancadas, despidas de alma como os espíritos da tribuna gostam, olhava-se para o relógio e para tão grande miséria, até estranhando Coates ter demorado quase 80 minutos a ocupar o lugar de homem de área, esse plano B que correu bem há dois anos e que continua a ser colocado em prática como quem ganha o Euromilhões uma vez e acredita que vai voltar a fazê-lo com a mesma chave.

O golo do empate apareceu quando um cruzamento de Pote encontrou o calcanhar de um defesa maritimista; o golo da vitória apareceu aos 93′, quando um dos incontáveis cruzamentos seguiu a preceito para a cabeça de Paulinho e este rematou para Coates se atirar à bola e garantir que ela acabava anichada na rede.

O capitão compensava o erro que tinha dado o golo ao adversário, o público acreditava que o jogo terminaria assim, mas o folclore ainda nem tinha começado.

Junto à área leonina, Nuno Santos é claramente carregado em falta. O árbitro auxiliar levanta a bandeirola, o senhor árbitro, Tiago Martins, manda jogar, o Marítimo empata. O auxiliar acobarda-se, os jogadores do Sporting apontam na sua direcção, dizendo ao árbitro que o colega tinha assinalado a falta, Tiago Martins enche o peito e dá segundo amarelo ao inconformado Adán, que o retira do dérbi. Depois, vai ao VAR e vê que tanto o auxiliar como os jogadores do Sporting tinham razão, mas o cartão continua a valer e, tendo o Sporting esgotado as substituições, Paulinho vai para a baliza. Apitar é, realmente, uma arte.

Morita atrasa uma bola de cabeça, Paulinho encaixa e deixa-se cair, queimado preciosos minutos. A turba aplaude efusivamente, e celebra a vitória quando o rapaz que não mostrou os dentes, mas calçou as luvas, bate para o meio campo contrário e o árbitro apita para o final.

Do suplício que foi o jogo, falta-se o suplício de passar no funil criado pelas obras do metro, depois de uma merda de jogo, a uma hora de merda, num Estádio onde a cada partida se percebe que não há o mínimo cuidado em preparar a recepção a quem ali vai apoiar a equipa.

O Sporting – Marítimo, foi um compêndio do que afasta as pessoas do futebol. No relvado, nas bancadas, até fora do estádio. Ou, se calhar, sou eu que já não tenho paciência.