Surpreendentemente, a mbc apresentou-se aos treinos com uma semana de antecedência, ou seja, hoje há pipis a dobrar!

«Gostava muito mais de me estrear a solo na cozinha da Tasca com um texto sobre a minha paixão inflamada pelo Sporting ou sobre o quanto sonho ver o nosso clube campeão, mesmo num mundo (sujo) de capeladas, motadas, manhas e afins.
Infelizmente, a última semana tem sido fértil em acontecimentos que nos mostram que os tentáculos do sistema continuam bem vivos. Como disse aqui na sequência do jogo com o Nacional, parece-me nitidamente que o “sistema” está, este ano, mais refinado e complexo. Lembro-me, em outras épocas, de o Sporting ser descaradamente roubado logo nas primeiras jornadas – e assim se ceifavam os objectivos de uma época, assim se cortavam, pela raíz, as ambições de um clube. Com os maus resultados que advinham da roubalheira, a instabilidade instalava-se: a equipa ficava insegura e ansiosa, os adeptos descontentes e rolava a cabeça do treinador. Fácil. Este ano, o sistema, mais sofisticado, dá-se ao luxo de nos beneficiar em jogos em que ganhamos por margens claras, para se sentir na legitimidade de nos roubar escandalosamente na semana seguinte.

O Mota entrou em cena com o Nacional, a fazer-nos ver, com estrondo, e em plena quadra natalícia, que o Pai Natal não existe mesmo. E este foi o ponto de partida para que, nos vários programas desportivos e nas tascas espalhadas por este país, se desse ordem de soltura à hipocrisia. Resolvi juntar umas quantas (hipocrisias) e tentei dar-lhes porrada:

– O golo anulado ao Sporting foi polémico e até a comunidade da arbitragem ficou dividida.
Como bem assinalou o Pedro Guerreiro na sua coluna semanal no jornal das manhas, este golo não é polémico… porque é limpo. Foi anulado e é limpo. Ponto final. Muitas vozes se levantaram ao longo da última semana:  “o Montero fez falta antes e se ela fosse assinalada já não havia golo”. O ex-árbitro Pedro Henriques, baseando-se na tal lei 12, é muito claro ao explicar que um simples agarrão não é falta; só o é quando daí se retira uma vantagem concreta para a jogada, o que não acontece neste caso. Se os árbitros estão divididos é porque não conhecem as leis que devem fazer aplicar. E só na República das Bananas em que Portugal se transformou é que a opinião pública argumenta que Slimani empurra um jogador que…cai para trás.

– O populismo do presidente.
Mais uma forma de desviar o assunto do que interessa. Deter-se na forma e no estilo é, aliás, muito típico dos profissionais do comentário que enchem o mundo do futebol com o seu verbo.
Um populista é alguém que se serve de todos os recursos para obter apoio popular – especialmente de promessas irrealistas e de linguagem simples e acessível. Ora, desde o primeiro momento, Bruno de Carvalho sempre se pautou por um discurso ultra-realista e avesso a promessas não alcançáveis. Ainda na campanha, fez questão de dizer que não era um milagreiro e, já no seu mandato, sempre reforçou que a estratégia era ganhar jogo a jogo, porque não se podia passar da pior época da história para a melhor. Linguagem simples também não é seu apanágio. A ironia e as metáforas estão quase sempre presentes – o caso mais paradigmático terá sido uma das suas primeiras intervenções enquanto presidente, na sequência de um Sporting B x Benfica B (em que, ao intervalo, já jogávamos com nove). Até hoje, os comentadores estão para perceber a que “pássaros” se referia Bruno de Carvalho.

– O Sporting é tão beneficiado pelas arbitragens como Porto e Benfica.
Esta é a hipocrisia-mor. Digam-me um jogo – um! – em que o Sporting tenha pontuado com erros de arbitragem. Foras-de-jogo milimétricos deram-nos golos válidos em jogos em que ganhámos por três e por quatro. “Ah, o penálti escandaloso que foi marcado no jogo com o Belenenses embalou-vos para a vitória”. Quem pode provar isso? Quem pode provar que, não fosse aquele lance, o Sporting perdia ou empatava? Quem pode provar que, quando uma equipa marca um golo, seguem-se logo dois ou três, porque está “embalada”? O golo irregular do benfica, nessa mesma jornada, embalou os lampiões para quê? Para ganharem à rasquinha à Olhanense com a mão do árbitro. Ponham na vossa cabeça, comentadores: o Sporting ganhou por três, o lance do penálti não teve influência no resultado (assim como não tiveram influência “benefícios” da arbitragem a nosso favor, em nenhum outro jogo desta época) e os nossos colegas de liderança não podem dizer o mesmo. “Ah, mas no jogo com o benfica, à terceira jornada, empataram porque o Montero marcou um golo em fora-de-jogo”. E o Markovic marcou um golo a partir de uma falta inexistente sobre o Cortez, no meio campo. E o Maxi acabou esse jogo. E o André Martins ficava isolado num lance de fora-de-jogo mal assinalado. E que me lembre, o Cardozo também nos marca um golo em fora-de-jogo milimétrico, no célebre jogo da Taça de Portugal, e não vi nenhum benfiquista (nem nenhum comentador) indignado.

– A equipa não joga o suficiente.
Dizem os doutos comentadores que, se o Sporting tivesse jogado bem, não havia erro de arbitragem que o tirasse do caminho da vitória. Mas uma equipa tem de marcar sempre quatro golos para prevenir eventuais erros de arbitragem? É o árbitro que tem de decidir que, lá porque uma equipa não está a fazer um jogo brilhante, deve perder ou empatar? Mais importante – porque se está a jogar mal um erro de arbitragem vale menos? E digam-me lá quem foi o último campeão que ganhou a jogar sempre bem e sempre com muitos golos de diferença? Diz-nos a experiência que há sempre cinco ou seis jogos ganhos sem convencer, pela margem mínima – e este seria, provavelmente, um desses.

Com tanta coisa que se comentou esta semana, com tantos programas que abriram com o tema Sporting, houve uma questão que não vi respondida: que penalização vai ter este árbitro? A resposta, muda mas conhecida de todos nós, obriga-nos, uma vez mais, a gritar: “Fight and Resist!”

by mbc

 

* duas cozinheiras, dois temperos. O toque de Leoa, dado pela Maria Ribeiro e pela mbc. Às terças, na Tasca do Cherba.