Regra geral, empatar em casa de um adversário directo não é um mau resultado. Vendo as coisas dessa perspectiva, o ponto arrecadado ontem – resultado que acaba por ser justo – é uma conquista. Acontece que nem todos os empates são iguais e, muito sinceramente, ontem era o dia certo para colocar um ponto final, de forma inequívoca, na série de maus resultados que acompanham as nossas deslocações ao lampiódromo. É por isso que eu continuo a não conseguir deixar de pensar que conquistámos um ponto… mas deixámos escapar dois.

E começo, precisamente, por aqui. Pela ideia do deixar escapar. É patética a tentativa de passar a ideia que foi o Artur que ofereceu o empate ao Sporting. Patética e nojenta. Típica, portanto. O erro do frango brasileiro deu-se antes do minuto 20′, não aos 90. Aliás, aos 90, estava esse mesmo Artur a defender por instinto o segundo golo do Sporting e o ponto final no dérbi. Claro que o episódio marca o jogo, mas achar que um jogo não tem mais para oferecer depois dele é bastante redutor. E já que falamos em deixar escapar, permitam-me dizer aquilo que sinto que nos fez deixar de conquistar dois pontos: a intensidade. Se aquele bando de pardais com que jogámos tem três jogadores realmente bons, a verdade é que senti, quase sempre, que tanto esses bons como os matrecos que os acompanham procuravam a bola com maior intensidade e metia o pé onde quer que fosse. E é isso que está a incomodar-me.

Porque, em termos de jogo jogado, creio ter ficado explícito que temos matéria humana para formar uma equipa francamente superior à deste adversário e rival. Mesmo com um Adrien em esforço (não me parece ter entrado a 100%), com um William a precisar de óleo nas dobradiças para voltar a ser a aranha da época passada, com André Martins a suar a camisola sem efeitos práticos e com Maurício na sua pior versão, a verdade é que foram vários os períodos em que dominámos o jogo e não tivemos receio em assumi-lo (Jesus, as tuas análises ao jogo são do mais patético que existe). Depois de quase termos entrado a ganhar, com Slim a emendar mal um canto (tanto canto contra uma defesa aos papéis têm que resultar, pelo menos, num golo), tivemos dez minutos de “vamos lá ver o que isto dá” e o que deu foi merda. Inadmissível a forma como levamos o golo às tabelinhas, pese a boa circulação de bola adversária. Não sei quantos passes foram, mas isto é um futebol de adultos e a regra é simples: troca um, troca dois, troca três, já não fazes outra vez. Acordem, porra!

E acordaram, muito por culpa de um Carrillo cada vez mais artista a jogar para a equipa. A bomba, em fantástica posição para marcar, saiu sem direcção; o monumental pique, que deixou toda a gente pregada ao relvado, acabou com um centro em esforço. Mas o esforço foi compensado, pouco depois, ao pressionar o guarda-redes e ao acabar por oferecer o golo a Slimani. Em seis minutos o Sporting sacudia o jogo e chegava ao empate, ainda por cima com a colaboração adversária, o que dinamitou, mais ainda, a auto-confiança dos encarnados. O Sporting tinha o domínio e carregava pela esquerda. Jeffersson, entretanto acordado, subia pela esquerda e cruzava para ninguém aproveitar. E Slimani, isolado, tão isolado que eu ainda tenho o golo atravessado na garganta, tinha pena de Artur e mandava-lhe a bola para as mão num remate bufa (desculpem a alfinetada, mas independentemente de Slimani ter feito um bom jogo, o que se diria de Montero se tivesse falhado três golos em que tudo dependia da sua perícia?).

O jogo endurecia, os amarelos começavam a sair mais depressa. Esgaio (grande jogo, miúdo, foste um dos nossos três melhores) fazia-se um homem frente a Gaitan. Sarr (que monstro! Sou cada vez mais tem fã! Só faltou o golo, mas com a quantidade de cagadas que tiveste de limpar tinhas mais em que pensar) deitava as mãos à cabeça, depois de mais um canto em que os manéis andaram aos papéis e nós não fomos capazes de aproveitar. Aliás, no espaço de dois ou três minutos, o Sporting ganhava uma mão cheia de cantos, coisa que pode fazer toda a diferença em alta competição.

O intervalo chegava e eu suspirava pela entrada de alguém capaz de esfrangalhar a frágil organização defensiva adversária, ali algures entre o meio-campo e a entrada da área. Bola cá bola lá, Adrien cada vez mais presente, até levar uma passa. 15 minutos da segunda parte. Carrillo, já amarelado, dá o seu lugar a Capel e a equipa ressente-se (quem diria, no início desta época, que o esqueleto táctico do Sporting abanaria com a saída do peruano? giro). São os piores dez minutos do jogo para o Sporting, pessimamente colocado em sem conseguir ter bola em condições (Jesus, palhaço platinado, a tua equipa é que só jogou à bola durante dez minutos). E numa altura em que a tripulação ameaçava não conseguir segurar o barco, emergiu o capitão. Rui, grande Rui, no campo e na baliza onde, há um ano, te quiseram crucificar, fizeste duas defesas que a todos mandou calar!

Livre a favor do Sporting. Jefferson tenta surpreender pelo lado de fora da barreira. Nani (o Maxi Pereira ainda está à procura da verruga, depois daquela cueca) coloca em prática um canto ensaiado com Adrien, mas o remate deste último, sem deixar cair, sai demasiado por alto. E o mesmo Nani rouba uma cabeçada a Slimani, que morre nas mãos do redes adversário. O Sporting voltava a pegar no nojo, principalmente depois da boa leitura de Marco Silva, ao lançar Mané para o lugar de um Adrien em inferioridade e Rosell para o lugar de um André fantasma. Com o meio-campo seguro, e pese uma fuga de Sávio que encontra o peito cheio de Patrício, são os verdes e brancos que terminam a carregar sobre um adversário fechado no seu meio-campo. Já só seu ouve «eu quero ver, a turma de Alvalade a vencer!», entoado pelos cerca de quatro mil Leões que, uma vez mais, silenciaram 55 mil adversários (aliás, o cântico inclui a passagem “somos a curva sem igual”). E é com essa banda sonora que Nani tira um cruzamento a regra e esquadro, para a entrada furiosa de Slimani. Artur redime-se dos pecados e vê a bola sair, caprichosamente, por cima. Canto. “Bora lá, caralho!”. Saaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaarrrrrrrrrrrrrrrrrrrr. Puta da bola que bate nas costas do cabeçudo mor, em vez de anichar-se nas redes. E tu bem merecias o golo, Naby.

Apito final e o sentimento que não consigo ultrapassar. Estes três pontos tinham que ter sido nossos, deixando um adversário directo em queda e não dando avanço de quatro pontos ao outro. Agora haverá uma pausa de quinze dias, para jogarem as selecções. O raio do mercado fechará e tudo se definirá. Incluindo o que fazer para, por exemplo, tentar resolver um problema que já irrita: aquele vazio na posição dez. A culpa não é do André, nunca será, até porque o lugar dele não é aquele (Martins é o suplente natural do Adrien. Ponto). Tem que perceber-se porque razão João Mário não é lançado (ó Marco, que raio de ideia foi aquela de só ter um médio no banco?) ou então tem que lançar-se o jogador. Em última instância, deixamo-nos de mariquices com o “tem que perceber o país e adaptar-se aos poucos” e lança-se o Ryan. Ou, então, aproveita-se o facto de termos um ponta-de-lança puro e lança-se o Montero o ou Mané para o seu lado. Alguma coisa tem que ser feita, Marco, porque o bom caudal ofensivo tem tudo para tornar-se óptimo. Lá atrás, há que estabilizar. William recuperará a forma, o que fará enorme diferença. Saar está de pedra e cal e, dentro em breve, será cimento puro. Falta encontrar um tijolo sem cantos lascados, para se formar a parede.

É isto. Que o mercado feche depressa e que aproveitemos o melhor possível esta paragem, para corrigir problemas sublinhados num dérbi com tanto para dizer, que nos deu um ponto que sabe a (muito) pouco.