Vocês sabem lá o estado de nervos em que acompanhei o jogo de ontem. Sem hipótese de estar no dragão por motivos pessoais e profissionais, senti-me nervoso como há muito não me sentia. Não por temer o adversário, cada vez mais um amontoado de pseudo-craques a fazer lembrar a lista do Godinho, mas por temer que tanta coisa boa que está a ser feita terminasse em mais um jogo cheio de qualidade com resultado adverso. É que se eu (e há muitos outros, felizmente) consigo olhar o trabalho para lá dos resultados, há quem não dê margem (o típico, caguei se joguei bem, eu quero é ganhar!). É uma postura válida e era essa postura que me assustava. Porque em termos de futebol, estava eu descansado.

E mais descansado fiquei ainda, com o nosso início de jogo. Parecia que o que tinha desejado por palavras, que fossemos um só sangue, se materializava no estádio onde a água fica fria em balneários seleccionados. Lá estava aquela enorme mancha verde e branca de cerca de quatro mil Leões, vergonhosamente aprisionados num espaço para cerca de metade dessa lotação (há que fazer uma queixa, já!), a abafar tudo e todos. Em campo, partilhando essa força, a equipa entrava com tudo! Nani atirava ao poste ainda antes dos 40 segundos de jogo e deixava o recado: este jogo é meu! E foi, foi tanto dele, o melhor em campo, uma vez mais brindado com um amarelo patético que, mais semana menos semana, o deixará fora do onze.

Mas porque assim se chama, onze, existiram outros dez, perdão, outros treze a seguirem o destemido patrão Nani. Não admirou, por isso, que o capitão Patrício voltasse a mostrar que é um dos melhores do mundo, com três momentos de luxo (mancha à Schmeichel, penalti defendido com a calma de quem está na praia, felino como Damas a enviar para canto aquela cabeçada); que Cédric fosse de uma competência extrema; que Paulo Oiveira conseguisse estar em todo o lado, à excepção do lance que deu golo (mérito para a jogada adversária, digo eu); que Maurício tivesse incorporado o central da época passada; que Jonathan voltasse a sorrir como o pequeno Conan, depois de lixar a vida aos fruteiros; que William voltasse a ser do Carvalho ao longo de todo um jogo; que Adrien fizesse a maratona com um toque de classe; que João Mário abdicasse da fantasia em prol do trabalho; que Capel fosse um jogador experiente e consciente de tudo o que tinha que fazer, a atacar e a defender; que Montero fosse um craque em modo guerreiro; que Slimani entrasse para deitar por terra o pouco sossego que a defensiva azul e branca pudesse ter; que Carrillo saísse da toca para dar a mordidela venenosa que colocou um ponto final da eliminatória; que Rosell segurasse o que faltava segurar e ainda estivesse perto de marcar.

Todos eles colocaram em prática o plano traçado por Marco Silva: «quero lá saber se jogamos no dragão! Somos o Sporting e esta merda é para ganhar!». E ganhámos. Ganhámos a jogar bem! Ganhámos a jogar à grande! Ganhámos a jogar à Sporting! Ao longo de 90 minutos, apenas durante dez, na segunda-parte, perdemos o controlo da partida. Podem vir os analistas, os paineleiros, o raio que parta mais velho ou aquela triste figura do Pategui que devia era ficar calado depois de não aproveitar o good mood do Quaresma, sublinhar os erros do fcporto para desvalorizar a vitória do Sporting; a verdade é que ganhámos porque fomos melhores em 80 dos 90 minutos! Dominámos, jogámos, deixámos o adversário sem bola e à procura dela. E quando não a tínhamos, mesmo a ganhar e a ver o tempo caminhar, não recuámos nem apostámos numa táctica de contra-ataque. Quando vejo, para lá dos 75 minutos, o William surgir como um dos nossos dois homens mais adiantados e procurar entrar em drible pela defesa espanhola, perdão, fruteira, sorri. Sorri tanto, no meio dos nervos porque isto de jogar bem também precisa de vitórias, ao ver o meu Sporting jogar como me contavam que jogava e poucas vezes o vi jogar.

Ganhar assim, tem outro sabor. Arriscaria dizer que, ontem, o Sporting, deu um enorme passo na luta por recuperar a sua identidade. Num dia em que também o andebol festejava, o hóquei voltava à europa com uma vitória e o rugby, acusado de louco por se oferecer para jogar o nacional, arrecada a terceira vitória em três jogos, a equipa de futebol, expressão máxima de um ecletismo que nos apaixona, rugia de forma assertiva, tanto no campo como nas bancadas (façam-me o favor e esgotemos Alvalade, no domingo). Que me perdoe o pequeno Godo, homem das cartilhas maravilha, mas, agora sim, o Sporting está de volta!