Interessante artigo, publicado na Cortina Verde.

 

O Treinador\Observador Filipe da Costa Silva também aceitou o nosso desafio de analise à ao Futebol do Sporting Clube de Portugal (anteriormente tínhamos estado com Miguel Pontes), “Pipo” como é conhecido entre amigos respondeu ás perguntas da Cortina Verde com inteligência e destreza já reconhecida no seu trajecto profissional (com passagens pelo Bobadelense e Operário de Lisboa). Em Sacavém, em conjunto com Miguel Pontes, desenvolveram um departamento de análise de jogadores e equipas adversárias, que ajudou muito à subida de divisão do Sacavenense e à chegada à final da taça AFL… partindo daqui para a aposta nesta paixão, que hoje desenvolve, tendo descoberto e estando em cima de muitos jogadores profissionais da actualidade, inclusive um internacional A que prefere manter em sigilo.
Actualmente Filipe por iniciativa e paixão própria, passa muitos dos seus fins de semana a observar jogadores jovens e de campeonatos distritais, dedicando-se ao “scouting” puro e duro.

Cortina Verde: Fala-se em muito lado da Blogsfera que o pequeno talentoso Escocês Ryan Gauld e o virtuoso medio brasileiro Wallyson mereciam ter uma oportunidade na equipa principal do Sporting, o que vocês pensam sobre disso?
Filipe da Costa Silva: “Olá Carlos e auditório Cortina Verde, antes de mais agradecer a oportunidade que me dão em conjunto de expressar e dar-vos a minha leitura daquilo que é o “meu Sporting” e as minhas leituras desportivas do mesmo, neste desporto onde todos gostamos de saber um bocadinho. Indo diretamente à questão que me colocam, é uma discussão da qual fui parte integrante desde bastante cedo, por incluir aqui neste lote mais um jogador inclusive, de seu nome João Palhinha. O João é de longe a melhor alternativa que temos a William e um miúdo de uma qualidade incrível a todos os níveis do técnico-tático, alem dos seus índices físicos incríveis.
Wallyson por seu turno é a alternativa mais credível que temos a Adrien, pela sua maturidade na forma como se põe em campo, um sentido posicional de fazer lembrar Miguel Veloso, que pouco móvel fazia as nossas delícias, porque se colocava de forma brilhante. A sua reacção à perda da bola é agressiva e rápida, o que lamentavelmente por vezes não acontece na nossa equipa principal. Tem com isto, ainda um pé esquerdo que lhe pode dar tudo o que o mesmo queira do mundo do futebol.
Quanto a Ryan Gauld é um jovem com muito para crescer e amadurecer, tem muito potencial mas não está maturado fisicamente e taticamente para cumprir num clube como os objectivos do Sporting Clube de Portugal, terá sempre de ser alternativa após os objectivos mínimos. Uma aposta claramente para o futuro! A longo prazo, vai-nos dar muitas alegrias, garantidamente. Penso ser o jogador que estará a ser melhor gerido por Marco Silva, que ao contrário dos dois anteriores, têm sido péssimos casos de gestão do mesmo.”

Cortina VerdeO Futebol de Formação, será sempre uma solução para o presente e para o futuro do Sporting Clube de Portugal? A concorrência é continua feroz?
Filipe da Costa Silva: “Perdoem-me os fanáticos… mas aqui responderei apenas desta forma: – Somos o Sporting! O resto, será sempre resto. Venha quem vier, onde vier e com os trunfos que quiser. Deixo apenas uma chamada de atenção aos meus caros consócios neste tema que passa pelo que estes realmente querem da nossa equipa profissional, da nossa formação e do clube em geral. Apregoam e defendem a formação mas assobiam o nosso Mané? Quando William teve ”dores de crescimento táctico” … diziam que tinha acabado? O André Martins é o pior jogador do campeonato? Isto é doentio!! As pessoas têm de perceber uma coisa e afirmarem-na sempre e não mudarem de opinião, conforme o vento do barco que apanharam essa semana. Ou apostamos forte na formação e em reforços cirúrgicos para garantir a qualidade do plantel, fazendo o melhor todos os anos em termos de campeonato, reconstruindo o clube até sermos capazes de lutar por títulos constantemente, ou queremos que a nossa direcção simplesmente deixe de investir na formação que dá os melhores jogadores portugueses, do campeonato e do mundo, para investir em camiões de argentinos, sérvios e brasileiros para ganhar 1 campeonato em 5 tentativas e mais de 100 milhões gastos.
O facto de não sermos campeões não está no jogador A,B,C ou D. Está na estrutura e no facto de estarmos a anos-luz dos nossos rivais em termos de força e de vozes em sedes próprias e isto demora tempo a construir, algo que esta direcção finalmente está focada em garantir, na pessoa do presidente Bruno de Carvalho. Temos de nos preparar para ganhar constantemente e regularmente, não fazendo loucuras para ser campeão de 10 em 10 anos. Isto passa pela aposta na formação e muito poucas contratações e o que for feito, que seja de qualidade garantida, como Fredy Montero ou Islam Slimani. Passará igualmente pela continuidade da reestruturação financeira. Passará pelo construir do nosso pavilhão, para trazer vitórias e adeptos a casa, naquilo que é o nosso verdadeiro ADN… e passará sobretudo por deixarmos de ser considerados os “bananas” da FPF e da Liga.
Penso que estes factores todos estão interligados na verdadeira realidade do Sporting e naquilo que temos de exigir e cobrar de nós adeptos. Antes de cobrarmos dos miúdos que defendem as nossas cores no 11 para 11 ao domingo, da direcção, da relva, dos árbitros, da liga e de tudo o que mexe… temos de cobrar de nós adeptos, que não sabemos o que queremos e não defendemos as nossas cores em todos os momentos de forma inequívoca.”

Cortina Verde: Porque é que o tradicional nº10 moderno desapareceu do Futebol actual? um 10 actualmente também tem de ter  características de um 8?
Filipe da Costa Silva: Tenho analisado esta questão e tentado perceber o porquê da mesma e vou tentar explicá-la dando exemplos do nosso clube, sendo simples e deixando de escamotear uma realidade do futebol actual, que passa pelo medo. Os treinadores de futebol da atualidade têm medo de perder jogos. Preferem garantir que não perdem, antes de atacar, ganhar e dar futebol aos seus adeptos e com isto veio várias mudanças no futebol.
Começámos pela evolução do jogador da posição 6, para deixar de ser apenas um destruidor, para ser o primeiro jogador da saída de bola com qualidade e que entenda todos os momentos do jogo, posicionando-se e colocando o centro de jogo da forma mais perfeita possível. Nesta fase de transição de mudança de jogador tipo, destaco Pedro Mendes.. o primeiro grande 6 português que tinha futebol nos pés para dar e vender e que permitia aos centrais jogar curto e apoiado, reduzindo a sua taxa de erro e ao mesmo tempo evitar que caíssem no “chutão” onde invariavelmente as equipas eram surpreendidas no contra golpe, porque perdiam a bola com relativa rapidez. Quando digo que Pedro Mendes, foi o “primeiro grande português” nesta posição, falo da ligação com a mudança do modelo de jogo e não como qualidade inata para o futebol. Isto seria injusto para Paulo Sousa.
Posto isto, as equipas evoluíram e começaram todas a focar-se na pressão do homem que saia sempre com bola, a tal denominada primeira fase de construção e começou a ter-se novamente problemas para sair com bola controlada. Percebeu-se então que seria melhor baixar o médio 8 e assim garantir mais uma solução para a bola, mas esqueceram-se que ficava-se aqui com um fosso enorme entre cerca de 6 jogadores em momento defensivo e 4 em momento ofensivo… uma equipa que soubesse fazer pressão bloqueava o jogo e recuperava a bola rapidamente.
Como infelizmente para o nosso futebol, os ideólogos e as pessoas que perdem tempo a tentar criar dinâmicas são poucas ou nenhumas e tudo caminha de modo cavernoso e da cópia, neste caso do fenómeno Barcelona e do Tiki Taka, que apos os seus sucessos, foi copiado em todo o mundo com os tais três médios e uma linha defensiva que saía a jogar numa cabine telefónica … a solução foi abdicar do próprio jogador 10, baixar todas as linhas e abrir os extremos em amplitude para que ora pelo jogador 6 com espaço, pelo meio campo povoado em pressão ou pelos extremos no chutão, haja sempre solução de sair… e começou-se a colocar verdadeiros camisolas 10, que não têm aptidão defensiva e de coberturas para desempenharem as funções deste futebol acanhado, a extremos e médios ala. Jaime Valdés, Matias Fernandez e Labyad são casos gritantes disto mesmo, no nosso clube.
O futebol e os treinadores actuais têm de deixar o modelo do copy paste e criarem o seu próprio modelo de jogo, onde tenham rotinas e métodos próprios para que voltem a haver camisolas 10 puros, extremos puros e o verdadeiro médio box to box e assim todos serem aquilo para que nasceram. Porque como está, também não está bem. Quantas vezes vemos a nossa equipa sem soluções de sair a jogar e ter posse de bola efetiva e activa, em vez de passiva? A adaptação faz parte do futebol mas o futebol não merece que o adaptem a ser jogado sem as míticas camisolas 10… a desfilar e a “partir tudo” por esses estádios fora.