Nunca gostei do Carlos Queirós. Como treinador teve a melhor equipa do Sporting que me lembro e não foi capaz de ser campeão. Como seleccionador foi o catalisador para a novela do anão porco ao não convocá-lo para o Mundial. Porém, há dois serviços que prestou ao futebol português aos quais estarei sempre agradecido: o primeiro, pouco importante, foi ter vencido o Mundial de sub-20 com aquela fantástica equipa que mais tarde seria conhecida como a geração de ouro. O segundo, este sim muito mais relevante, foi ter enfiado duas solhas ao Jorge Baptista.

Depois do jogo nos Barreiros, estive a ouvir os Três Estarolas do comentário desportivo em Portugal (Joaquim Rita, Ribeiro Cristóvão e Jorge Baptista). Centrando-me, para já, apenas no Baptista, nunca percebi as razões de tanta azia. Não é apenas em relação ao Sporting (embora quando se trata do nosso clube se manifeste mais). Jorge Baptista fala sempre como se o Mundo inteiro lhe devesse dinheiro e não quisesse pagar. Então quando o assunto é Jorge Jesus aquilo assume níveis de inveja verdadeiramente impressionantes. É verdade que Jesus é um tipo com muita bazófia e os comentadores gostam pouco de treinadores assim, sobretudo se não se chamarem José Mourinho mas há limites para tudo. Curiosamente, para o Baptista e muitos comentadores da mesma estirpe vale mais um humilde medíocre do que um competente arrogante. Deve ser a habitual solidariedade entre pares, neste caso, os medíocres.

Depois deste jogo, e após uma pergunta sobre aspectos tácticos da equipa do Sporting, Jesus disse em conferência de imprensa que a pergunta era interessante (elogiando o jornalista) e acrescentando que existiram mais nuances tácticas que os jornalistas não perceberam. E foi aqui que o Baptista foi aos arames demonstrando tiques de puto mimado que não admite que alguém lhe diga que não sabe absolutamente tudo sobre futebol. “Não vou comentar porque Jesus é que sabe tudo e mais ninguém sabe nada!” foi um dos amuos em directo acompanhado pela já corriqueira crítica ao endeusamento de que Jesus era alvo. Bom, começando pelo fim, se Jesus é endeusado ou enxovalhado é culpa de quem? Dele e da sua classe que aproveitam todas as oportunidades atrás de um microfone para promover alguém ou para alimentar uma polémica, conforme a sua agenda. Depois, será que é assim de uma arrogância tão grande um treinador profissional que por acado até é dos melhores que por aqui anda, que trabalha todos os dias com uma equipa dizer que há coisas que escapam a um jornalista que se limita a comentar jogos sempre conforme o resultado? Acho que não. Arrogância é achar que mesmo não trabalhando com os jogadores, não os conhecendo com detalhe nem sequer sabendo o que lhes foi pedido pelo treinador, se consegue perceber todos os comportamentos que as equipas apresentam durante um jogo de futebol. E, por fim a hipocrisia suprema, o Baptista e seus pares têm, quase diariamente, uma oportunidade nova de falar de futebol, de questões tácticas, de aspectos técnicos, de tudo aquilo que eles se queixam de não se falar mais vezes e o que é que eles fazem? Qual é o seu contributo? Alimentar polémicas, comentar declarações e falar de tudo excepto o que acontece dentro do campo. Quantas vezes não vemos o rescaldo de um jogo do Sporting centrar-se na novela Carrillo, em declarações passadas de BdC ou no ego de Jesus? São tantas que já lhe perdi a conta. E aqui, das duas uma: ou sabem da poda mas não lhes apetece falar ou não sabem e camuflam a sua ignorância com as polémicas, os chavões e os clichés. Em qualquer dos casos, é o futebol e o telespectador que sai a perder. Como sempre.

É nestas alturas que eu considero-me um felizardo por ter o privilégio de acompanhar os programas de comentário, antevisão e rescaldo da SkySports em relação à Premier League. Ali fala-se de futebol! De polémicas também, mas o foco é sempre o jogo, os jogadores, a táctica. Do resto falam o mínimo indispensável e sem branquear nada.Um exemplo disto é que o Mourinho andou este tempo todo a ser criticado nesse painel por justificar derrotas com arbitragem quando a sua equipa, claramente, é das que pior joga na Premier League e quando essas críticas à arbitragem nem sempre correspondiam à realidade. Por outro lado, quando a qualidade do comentário é alta, isso abre outras portas como é o caso de Gary Neville. A sua inexperiência como técnico é largamente compensada com o seu conhecimento sobre o jogo e que era frequentemente exibido na SkySports no programa Monday Night Football. Se puderem, passem pelo youtube e façam uma pesquisa. Vale mesmo a pena!

Infelizmente, esta não é a primeira nem será a última vez que escrevo um post sobre comentadores desportivos e toda a merda que debitam. Acredito que a forma como se fala de futebol e as prioridades que se estabelecem quando alguém tem a oportunidade de falar sobre o jogo é tão importante como a qualidade do jogo que se pratica dentro do campo. Quem quer um futebol atractivo não pode elogiar constantemente uma equipa que não produz um lance de ataque só porque defendeu bem. Quem quer promover a modalidade não pode classificar o anti-jogo e as lesōes inventadas para perder tempo como “natural” ou como sendo “as armas dos pequenos”. Quem quer falar do jogo não pode perder 2/3 de um programa a falar de coisas extra-futebol para dedicar uns míseros minutos a falar da arte ou dos artistas. Não tenho nada contra a polémica, faz parte do jogo e tem de ser comentada. O que me faz espécie é aquilo que referi no início deste parágrafo: as prioridades, as agendas e aquilo que estes “profissionais” definem seja para enfatizar ou branquear. O comentário desportivo tem de evoluir e tem de ser uma mais-valia para o futebol ao invés de ser palco para os clubes promoverem a sua agenda de comunicação. A solução é simples: correr com os jornalistas todos e colocar treinadores e ex-jogadores com um conhecimento técnico e táctico que lhes permita acrescentar alguma coisa de útil ao debate. Os consumidores, mais do que tudo, querem perceber os porquês de terem jogado bem ou mal, pormenores que o seu treinador não quer ou não pode explicar numa conferência de imprensa. Queremos mais do que a previsível justificação da exibição com o resultado. Queremos saber o que está bem e o que está mal na nossa equipa. Queremos muito mais do que isto que nos oferecem. Estamos fartos da mediocridade das sanguessugas que vivem à volta do futebol. Queremos um Gary Neville na SicNotícias, um Jamie Carragher na RTP e um Thierry Henry na TVI. Ou qualquer coisa remotamente parecida que não envolva gajos ultrapassados como o Manel Zé ou o Henrique Calisto. Acabo de escrever isto e deparo-me com mais uma demonstração de azia em directo, desta vez do Ribeiro Cristóvão pela vitória do Sporting contra o Besiktas. Deixo-vos uma dica: quando o Sporting ganha e ele é chamado a comentar, se puderem ignorem tudo porque dali não sai nada de útil. Ribeiro Cristóvão é daqueles comentadores que, não percebendo nada sobre o jogo, fala como se os clubes grandes, neste caso o Sporting, tivesse a obrigação de ir para o intervalo a golear todas as equipas. Coisas menores como a valia do adversário, a imprevisibilidade das estratégias dos treinadores e as circunstâncias do próprio jogo não entram na sua limitadíssima linha de raciocínio. Quem não saiba o resultado e veja este medíocre a fazer o rescaldo fica logo desanimado. Ribeiro Cristóvão é um especialista em pegar nas coisas negativas e amplificá-las ao ponto de parecer uma derrota mesmo quando a equipa ganha. Só alguém muito mal intencionado é que depois de uma reviravolta europeia épica, dedica 90% do seu tempo de antena a falar daquilo que não estava a correr bem e deixa 10% para a reacção fantástica do Sporting. A forma como ele crucifica o Montero não é nova, já o fazia com Carrillo nos anos anteriores. Curiosamente, nos jogos em que eles brilham…são convidados outros comentadores. E ontem, la piéce de résistence, as críticas ao festejo de golo do Teo. Ribeiro Cristóvão deve ser um tipo muito infeliz para transformar num episódio cómico, que sacou gargalhadas ao Mundo inteiro (inclusive ao árbitro) em mais uma arma de arremesso contra o jogador. Confesso, ouvir o RC desperta a minha faceta mais sombria, tendências homicidas e sentimentos repugnantes. O que não deixa de ser estranho após uma vitória do Sporting…

Voltando à vaca fria, devia haver uma categorização do comentário desportivo. Por exemplo, o Rui Santos, que nem sequer colhe a minha simpatia, encontrou o seu lugar. Como de futebol percebe pouco, encontrou o seu espaço nas questões extra futebol como: arbitragem, disciplina, negócios, etc. Foi capaz de perceber o seu espaço e especializou-se na análise a todas estas questões e fá-lo, umas vezes bem outras mal, com suporte de dados e produzindo algumas mais-valias como a Liga Real e outras formas de organizar dados. Nem sempre está correcto mas louvo-lhe o esforço em tentar distanciar-se daquilo que é norma no comentário desportivo. Todos os outros comentadores, seja em que canal for, primam pela mediocridade. Seja por clubismo primário, falta de fairplay, ignorância pura ou agenda premeditada, acabam por nos fazer sentir, a nós telespectadores, como os seres mais inteligentes à face da Terra. A maior derrota do comentário desportivo é o facto de todos os programas, quase sem excepção, atingirem audiências absurdas pelo entretenimento que proporcionam. E quando a mais-valia está apenas no entretenimento como se de uma Casa dos Segredos se tratasse, é a prova de que o futebol fica esquecido num canto. Nenhum telespectador é capaz de se recordar de uma análise futebolística bem feita mas todos se lembram do programa em que o Dias Ferreira saíu em directo, do arrufo entre o Rui Santos e o Simões, das broncas com o Pedro Guerra ou da ida de Bruno de Carvalho ao Prolongamento. No dia em que os directores destes programas perceberem que concorrem com um filme, série ou qualquer outro conteúdo de entretenimento, vão chegar à conclusão que precisam de acrescentar mais alguma coisa ao debate. Por outro lado, enquanto continuarem a ter estas audiências, se calhar teremos todos de assumir que gostamos da mediocridade.

* todas as sextas, directamente de Angola, Sá abandona o seu lugar cativo à mesa da Tasca e toma conta da cozinha!