De regresso à Champions, o Sporting voltou a jogar taco a taco com um dos gigantes do futebol. Colocou Turim em sentido, mas quando parecia ter a Juventus controlada alterou a estratégia e sofreu um golo a seis minutos do final. O incrível falhanço de Doumbia, sobre o apito final, deixa os adeptos divididos entre a vitória moral e a azia descomunal

Sporting's forward Daniel Podence (C) fights for the ball with Juventus midfielder Miralem Pjanic and Juventus' midfielder from Germany Sami Khedira during the UEFA Champions League Group D football match Juventus vs Sporting CP at the Juventus stadium on October 17, 2017 in Turin. / AFP PHOTO / Miguel MEDINA

 

Lana del Rey tinha tudo para ser um caso de sucesso à escala planetária: um som muito próprio, quase cinematográfico, capaz de fazer-nos viajar para diversas dimensões; uma voz inconfundível; uma aparência invejável; uma legião de haters que comprovam o quão boa ela é. E a verdade é que, volvidos cinco anos sobre o brutal sucesso do incessantemente aplaudido Born to Die, Lana de Rey continua a ser isso tudo e, recorrentemente, quando falamos sobre música, o nome dela vem à baila como aquela que vale a pena ouvir, mas que nunca conseguiu efectivamente saltar para a fila da frente das nossas memórias, muito por culpa de um percurso sólido, digno de enormes aplausos, mas sem o rasgo que lhe permite subir para o pódio quando anda sempre ali à volta.

Ontem, uma vez mais, o Sporting foi uma Lana del Rey: uma entrada mandona num campo onde o dono da casa não perde, para a Champions, desde 2013; um futebol personalizado, capaz de fazer-nos viajar para diversas dimensões; uma personalidade marcante que valeu conseguir não ceder quando esteve por baixo na partida; uma aparência invejável ao longo de 30 minutos de uma segunda parte onde agarrou o jogo, deixou os haters a espumar e esteve tão próximo de poder ser a maior sensação destas primeiras três jornadas desta edição da Champions. No fundo, a la Lana, digno de enormes aplausos, mas sem o rasgo que lhe permite subir para o pódio quando andou sempre ali à volta.

É um filme já visto. Madrid, Dortmund, Barcelona… Um filme que, diga-se em abono da verdade, se tem tornado recorrente e consistente muito por culpa do realizador, Jorge Jesus. Hoje, ter o Sporting a jogar com um qualquer colosso europeu não nos deixa a pedir aos deuses do futebol um resultado digno; deixa-nos a desejar ter um jogo com uma arbitragem que não incline o campo a favor de quem tem mais dinheiro e que nos permita bater-nos até à última gota de suor pela vitória. Foi o que voltou a acontecer em Turim, inclusivamente com esse pormenor da arbitragem ter aquele momento pró UEFA, transformando um penalti contra a Juve num fora de jogo de Coates que, 10 horas depois eu ainda não consegui ver (às tantas não vi as repetições certas).

A entrada em campo foi sem receios, a partida disputava-se a meio-campo, William e Bruno Fernandes davam as notas a uma orquestra apostada em explorar a profundidade e que tinha em Dost o homem tabela que permitia dar tempo a Gelson ou Acuña para acelerarem e serem lançados (e tanta vez que o holandês recuou para jogar para a equipa). Sem oportunidades de golo para um lado ou para outro, Gelson recebeu um passe açucarado de Brun8 e viu-se cara a cara com Buffon. Sentiu na pele o que os avançados costumam sentir quando enfrentam as manchas de Patrício (que raio de equipamento é esse, meu?) e falhou, mas a bola ressaltaria em Alex Sandro e anichar-se-ia no fundo da baliza.

O Sporting ganhava vantagem, a Juve ganhava mais uma dor de cabeça quando atravessa um período de menor confiança. Estranhamente, o Sporting baixou linhas e deixou de conseguir voltar a sair em transições rápidas, excepto numa belíssima jogada onde Dost baixou outra vez, devolveu a Bruno Fernandes e este lançou Gelson. Só faltou que o cruzamento do 77 desse tempo a Dost de posicionar-se na área. Antes disso, já a Juve tinha empatado, num golaço de livre marcado por Pjanic após falta disparatada de Battaglia. Era altura do Sporting sofrer e de Rui mostrar-se em casa de Gianluigi, parando os remates de Dybala e Higuain (que defesa do cacete à bomba deste último).

O Sporting chegava vivo ao intervalo e do intervalo veio com tudo corrigido. Com uma defesa concentradíssima e sem dar hipóteses nem las alas nem no meio, William e Battaglia tomaram conta do meio-campo, Acunã teve menos peso nas recuperações para aparecer mais a estorvar na frente, Bruno Fernandes encontrou espaço para pegar na batuta. O Sporting agarrou o jogo pelos tomates e a equipa italiana não criava lances de perigo, expondo-se cada vez mais a um possível contra golpe. Faltavam 15 minutos. Era hora de tomar decisões.

E quando teve que decidir, Jesus olhou para o banco e mandou avançar Palhinha para tirar Gelson. Podence ficou, Doumbia ficou, quando qualquer um deles, nomeadamente o puto, seria colocar os nervos em franja ao adversário (e até dava para trocar Acuña para a direita e apostar nas diagonais). Bruno Fernandes descaiu para a direita e o Sporting perdeu mão no jogo. O maestro estava longe da zona onde desequilibrava, a equipa já não se esticava e convidava os laterais adversários, até então manietados, a subirem no terreno. Depois veio a lesão de Coentrão (não mão, no braço, na perna, sabe-se lá onde, mas assim é complicado) e a entrada de Jonathan. E o Sporting já não atacava e veio o cruzamento, veio a incapacidade doentia de um lateral para defender bolas metidas por dentro e veio o único remate italiano em toda a segunda parte que daria golo e a cambalhota no marcador.

Depois entraria Doumbia para o lugar de Battaglia e naqueles minutos que faltam o avançado falharia um golo tão incrível que até Buffon levou as mãos à cabeça quando percebeu que o Sporting não tinha chegado ao empate. Levou ele e levámos nós. Outra vez. Porque esta cena de jogar taco a taco é gira, mas chega a um ponto que, sem se traduzir em algo, enjoa. Principalmente quando, mesmo sabendo que não temos um plantel equilibrado e nem todas as opções que saem do banco estão ao nível do onze inicial, não percebemos essas opções. Pior, quando sentimos que, mais do que ganhar, quisemos preservar um empate e acabámos por estragar o que de bom tinha sido feito. E se ainda havia dúvidas da nossa pinta de Lana del Rey, basta ouvi-la cantar Fucked My Way Up To The Top…