É só fechar os olhos e imaginar esta equipa a jogar à bola. Michel Preud’homme, Jorginho, Márcio Santos, Paolo Maldini, Dunga, Krasimir Balakov, Gheorghe Hagi, Tomas Brolin, Romário, Hristo Stoichkov e Roberto Baggio. Whaaat? Foi assim mesmo, o dream team escolhido no Mundial 1994, nos Estados Unidos.

Pelo meio, estava um tal de Balakov, um génio que bailava em Alvalade. O homem faz esta terça-feira 50 anos, mas será eterno, nem que seja para quem suspira pelo Sporting. O búlgaro jogou de leão ao peito entre 1990 e 1995. Apesar da muita magia, dos muitos golos e assistências, daquela chapelada a Preud’homme, do golo ao Benfica aos 20 segundos, dos dribles impossíveis, da jogada à Maradona contra o Vitória de Setúbal, conquistou apenas uma Taça de Portugal. Foi em 1995: 2-0 ao Marítimo, com bis de outro búlgaro, Iordanov.

A sua melhor época de verde foi precisamente aquela que culminaria no EUA 94, no qual chegaria às “meias” com a super Bulgária, mas já lá vamos. Nessa temporada, Krasimir marcou a muitas equipas: Vitória de Setúbal, Estrela (2), Belenenses (2), Vitória de Guimarães (3), Sp. Braga, Paços de Ferreira, Gil Vicente (2), Boavista, Estoril Praia e Benfica, no famoso 3-6. Foram 15 no total. Na época anterior havia festejado 11; na última seriam apenas sete.

Claro que a decisão de Sousa Cintra substituir Bobby Robson por Carlos Queiroz terá sempre lugar em qualquer conversa de café mais calorosa, mas aquela era uma senhora equipa e surpreende como ganhou tão pouco. Afinal, a canhota poeta de Balakov juntava-se a meninos como Paulo Sousa, Peixe, Cherbakov, Capucho, Pacheco, Iordanov, Cadete e Juskowiak, por exemplo.

“Estou orgulhoso. O meu trabalho durante cinco anos, afinal, deu frutos. Sinto-me muito feliz. Quero aproveitar aqui para dar os parabéns aos adeptos do Sporting, que apoiaram durante todo o jogo e durante os cinco anos. Quero dizer que este clube fica no meu coração para toda a vida”, disse Balakov aos microfones da TVI, após a conquista no Jamor.

Lá fora, com a camisola 10 do Estugarda também não seria muito mais feliz. Ganharia apenas uma Taça da Alemanha também — conseguiu um digno segundo lugar em 2003. Foi em junho de 1997, perante quase 77 mil adeptos no Olímpico de Berlim, que Krasimir e companhia bateram o Energie Cottbus, por 2-0. Um bis de um craque chamado Élber. O treinador era o atual selecionador alemão, Joachím Löw.

A glória europeia quase chegou a 13 de maio de 1998, mas não seria dessa que o palmarés do génio da Bulgária chegaria aos calcanhares do seu talento. O Chelsea roubou a Taça das Taças ao Estugarda, em Estocolmo. O herói dos ingleses foi o suplente Gianfranco Zola, um italiano pequenote que driblava como era (e é) raro ver-se. E depois colocava a bola como quem encolhe os ombros, era uma brincadeira. O treinador-jogador dos blues era Gianluca Vialli. Conclusão: as únicas vitórias europeias de Balakov resumiram-se à Taça Intertoto, em 2000 e 2002.

Mas o universo reservar-lhe-ia um conto de fadas. Foi em 1994, no tal Campeonato do Mundo na terra do Tio Sam. Nesta peça da BBC fica bem explícito o nível daquela seleção búlgara, assim como o estatuto e talento de Balakov. Passemos a bola à BBC: “Depois do temperamental Stoichkov, o sagaz Balakov era considerado de longe o segundo melhor jogador da Búlgaria, o seu ritmo e olho para o passe assinalou-o como uma grande ameaça. Já no Sporting na altura do Campeonato do Mundo, mudou-se para o Estugarda em 1995, com 29 anos de idade, e desfrutou do feitiço estelar durante os oito anos em Die Roten.”

O tal conto de fadas começou no Grupo D, juntamente com Nigéria, Argentina e Grécia. E a história até começa com uma derrota pesada por 3-0 contra os africanos, com golos de Yekini, Amokachi e Amunike. O caráter daquela gente treinada por Penev viria ao de cima em Chicago. A Grécia pagou a fatura: chapa 4! Stoichkov (2), Letchkov e Borimov trataram da limpeza.

A seguir era a vez de Sensini, Redondo, Simeone, Batistuta e Claudio Cannigia sentirem a pujança dos homens que seguiam o dedo de Balakov — Maradona estava fora de combate, graças ao escândalo de doping. Dois-zero à Argentina de Basile, com golos de Stoichkov e Sirakov. O sonho continuaria a viver lá bem alto. A seguir, os búlgaros despacharam o México com dificuldades, depois de penáltis. Épico foi o que aconteceu nos “quartos” contra a Alemanha de Berti Vogts. As coisas até começaram bem para os alemães, com um golo de Lothar Mattäus, mas Stoichkov (okay, já cansa!), de livre direto, e o careca Letchkov, com um cabezazo, dariam a volta ao texto.

O sonho teria um ponto final nas meias-finais, por causa de outro génio: Roberto Baggio. O italiano do rabo-de-cavalo, que fingia que chutava e metia para dentro, que batia livres como ninguém, que tinha velocidade e aguentava as pancadas, que deixou Florença em caos quando trocou a Fiorentina pela Juventus, bisou nessa partida. Stoichkov ainda reduziu, de penálti, mas o marcador não mexeria mais.

Ao jornal i, numa entrevista descontraída, Balakov falou do seu golo aos 90′ contra a França, que ditou o apuramento para o EUA-94. Tem a palavra um dos melhores jogadores da história do Sporting: “Foi um percurso lindo. Na fase de qualificação passámos no último minuto e depois a fase final foi um espanto. Juntou-se ali uma equipa de sonho. No mesmo Mundial ganhámos à Argentina e à Alemanha. É muito bom. Só fomos eliminados pela Itália do Roberto Baggio, nas meias-finais.” Baggio, já se sabe, chutaria para as nuvens o penálti na final contra o Brasil de Mário Zagallo.

Com poucos troféus na carreira, pendurou as botas sensivelmente dez anos depois de deixar o Sporting. Pouco depois, investiu na carreira de treinador, com passagens pelo Estugarda, Grasshoppers, St. Gallen, Chernomoretz, Hajduk Split, Kaiserslautern e Litex Lovech. Actualmente está como treinador dos búlgaros do Chernomorets.

Mas puxemos a fita atrás, na conversa do i com este homem que só queria uma camisola e só uma (a de Maradona, que falhou o Bulgária-Argentina por causa do doping). Com tanto, tanto talento, teria mesmo de ser o Estugarda o caminho a seguir? “Por acaso nunca pensei em jogar na Alemanha. Sempre sonhei com Espanha ou Itália, mas o Estugarda era o clube que me oferecia as melhores condições. Um ano depois do Mundial 94 tinha de aproveitar a onda. O Sporting estava a mudar de ciclo e de jogadores. O Figo, por exemplo, foi para o Barcelona e eu fiz as malas para Estugarda”, lembra o 10 que foi 20 no EUA 94. “Vivi lá oito anos maravilhosos. Ganhámos uma Taça da Alemanha, fui eleito o melhor de sempre do Estugarda e diverti-me com a malta, sobretudo com Bobic e Élber. Foi outra etapa da minha vida. Duradoura e proveitosa, como a do Sporting.”

texto original publicado, há dois anos, no Observador
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