João Pedro Cordeiro, jornalista e autor do site MÅL!, dedicado ao futebol nórdico, coloca tudo em pratos limpos, numa entrevista ao jornal A Bola

— Quais são as principais características de Conrad Harder?

— É um avançado centro puro que garante presença física, potência e capacidade de finalização, impressionando a facilidade com que dispara. Tem um remate fácil e potente. É muito forte no choque e a segurar a bola de costas para a baliza. Protege muito bem a bola e é difícil ser desarmado. Impressiona a forma como se impõe fisicamente e usa o corpo para ganhar superioridade perante o adversário. É também forte sem bola, sendo muito ativo na tentativa de a recuperar.

— Que posições pode fazer no ataque?

— Pontualmente poderá ser utilizado como avançado interior, descaído para um dos meios espaços laterais, mas eu vejo o Conrad Harder essencialmente como jogador de corredor central seja a liderar a frente de ataque, seja em dupla com outro jogador, mas neste último caso como elemento mais fixo, mais posicional, não tão móvel. Harder é um bom pivô. Chama a si a marcação e fixa os defesas-centrais adversários abrindo espaço para um companheiro mais móvel.

— Pode encaixar bem no Sporting e no futebol português?

— A forma como se impõe fisicamente e a atitude competitiva que tem deixam antever uma transição mais tranquila do que noutros casos recentes de jogadores vindos dos países nórdicos — Schjelderup e Tengstedt, neste caso. O seu perfil deixa antever potencial para ser um jogador de impacto em pouco tempo, não devendo sofrer com a falta de espaço que habitualmente os avançados dos principais clubes em Portugal têm para jogar dados os processos defensivos das equipas menos competitivas, dado o seu perfil. Portanto, sim, tenho confiança que seja um jogador capaz de encaixar no jogo de blocos baixos dos adversários e um jogador capaz de jogar e fazer a diferença dentro desses blocos. No jogo do Sporting será importante para oferecer apoios aos avançados interiores, e depois como finalizador, ao jeito daquilo que já faz Gyokeres. Parece-me que é bastante complementar ao modelo de jogo de Amorim, pelo que deverá encaixar perfeitamente na equipa.

— Será mais um substituto de Gyokeres ou podem até jogar juntos?

— Mesmo tendo em conta o valor despendido pelo Sporting na sua contratação diria que chega para ser o substituto de Gyokeres, crescendo na sua sombra com tranquilidade, mas que terá também muitos minutos, já que irá permitir descansar Gyokeres mais vezes do que aconteceu na temporada passada — algo que o Sporting terá também considerado como importante quando definiu este tipo de perfil de jogador como alvo prioritário neste mercado. Pontualmente poderão jogar juntos, claro, mas isso iria obrigar a uma mudança pouco habitual nas rotinas e dinâmica do ataque do Sporting. Imagino que isso aconteça apenas em contextos muito específicos e que Harder seja essencialmente utilizado numa ótica de rotação.

— Como será a adaptação dele, poderá ter dificuldades?

— Há sempre esse risco, claro. Apesar de tudo, há uma subida clara do patamar competitivo saindo da Dinamarca para Portugal. Veja-se o caso de Schjelderup, que chegou a Portugal como um dos melhores jogadores da liga dinamarquesa e a dificuldade que tem sentido em impor-se. Harder, apesar do bom início de temporada, não estava ainda nesse patamar. Porém, como disse anteriormente, pela mentalidade competitiva que o dinamarquês tem aliado ao seu perfil como jogador, a transição poderá ser mais tranquila, já que me parece que o seu jogo é bem mais traduzível para um contexto superior e de maior competitividade. O próprio contexto interno que vai encontrar no Sporting poderá ajudar a uma adaptação e a transição muito mais pacífica.

— O Sporting faz bem em explorar este filão nórdico?

— Sem dúvida que sim, mas pelos valores que se começam a praticar na Dinamarca, não só o Sporting, mas o futebol português no geral, chega com algum atraso à questão. Hoje em dia é mais difícil encontrar aquela relação qualidade preço que fazia a diferença há dois ou três anos, além da concorrência que já chega de clubes ingleses e alemães. Claro que vai sempre depender do clube ao qual se vai contratar e em que estado de maturação se encontra o jogador a contratar, também. Mas sem dúvida que o jogador nórdico, principalmente o dinamarquês, o norueguês e o sueco, são cada vez mais apetecíveis pela conjugação de fatores técnicos, mentais e físicos que geralmente apresentam, pelo que será sempre um mercado ao qual convém dar atenção máxima. Na Suécia e na Noruega continua a ser possível contratar a preços acessíveis, sendo mais complicado não pagar valores premium em clubes como o Nordsjaelland ou o Copenhaga.

— Tendo em conta a idade e o contexto dinamarquês, os €19 milhões pagos surpreendem ou poderemos no futuro considerar o negócio barato?

— 19 milhões parecem um choque à primeira vista, mas é simplesmente o valor básico para o qual tende o mercado para este tipo de jogador, com o seu perfil e enorme potencial. Basta ver que nos dois últimos anos, fossem os jogadores mais ou menos estabelecidos, foi por valores semelhantes que saíram muitas das principais promessas a atuar no futebol dinamarquês: Ernest Nuamah, Ibrahim Osman, Sulemana Kamaldeen, Orri Oskarsson, Hákon Haraldsson… Em caso de sucesso, não será difícil ao Sporting duplicar ou triplicar o valor investido em Harder e nessa altura muitos estarão a falar de forma bem diferente deste negócio. Ou seja, é um valor que não deve surpreender. É o preço a pagar para ter um jogador com este perfil e potencial, nos tempos que correm, e que é necessário investir para jogar em antecipação.