João, meu querido.
Ando há algumas semanas para escrever-lhe, mas como soube que andava demasiado ocupado decidi contemporizar. E como é que eu soube que o seu tempo era curto para preocupar-se com algo mais do que com o seu Benfica? Através de um editorial escrito por si, onde, uma vez mais, procurava rebaixar o Sporting. Desta feita, ironizava com o facto de ser sábado e do jogo na Madeira, frente ao Nacional, servir, apenas, para cumprir calendário e que, dessa forma, os adeptos do seu clube tinham um dia para descansar dos festejos.

E é precisamente por aqui que gostaria de começar. João, meu querido, dou-lhe os meus sinceros parabéns! Não é para todos, conseguir chegar à direcção de um jornal de tiragem nacional e transformá-lo numa arma ao serviço do clube de que se gosta.
Sabe, a única coisa que me incomoda é o facto de isso chocar, de frente, com uma coisa chamada ética e código deontológico. Eu sei, eu sei, sou um picuinhas de primeira, não é? Efectivamente, já devia ter percebido que o meu querido João trata o jornalismo ao nível de uma casa dos segredos, cartilha tão bem partilhada pelos outros encarnados do Correio da Manhã (escrever uma notícia em redor da possibilidade do Bruno de Carvalho ser o próximo treinador do Sporting é, no mínimo, vergonhoso) e do MaisFutebol (imagino as palmadinhas nas costas que o seu camarada Sobral dá a quem escreve imbecilidades tendenciosas como «O Benfica venceu este domingo no reduto do Belenenses por 4-3 e encontra-se a uma vitória das meias-finais do play-off do Nacional de futsal. Sporting, Fundão e Rio Ave, que tinham vencido ontem, também boas perspetivas para seguir em frente»).

Mas o que é o código deontológico e a ética jornalística, face à possibilidade de alimentar as massas com pseudo-notícias de grandeza balofa, certo? Importa é alimentar a máquina de propaganda e, não há dúvida, neste aspecto o Sporting está a quilómetros de distância dos seus dois principais rivais. Não, não estou a lamentar o facto de não termos um director de comunicação do clube a trabalhar fora de portas (e sem precisar de aparecer em conferências de imprensa ao lado de Taças conquistadas ao apito); estou, apenas, a constatar um facto.

E é de factos que gostaria de falar-lhe em seguida, uma vez mais motivado por um editorial que escreveu para o jornal do benfica. Perdão. Para o Record. Escreveu o João, que «[…] o Sporting considera-se o último bastião de um futebol genuinamente português […]», mas tudo naquele tom de gozo a que já nos habituou. Ora, calha ser hoje o dia em que o seleccionador nacional anuncia os 23 que vai levar ao Brasil, sendo certo que, de fora, ficarão dois jogadores do Sporting que justificavam a convocatória: Adrien e Cédric.
Sabe o que é mais curioso no meio de tudo isto, João? É que olhando para a equipa do ano eleita pelo seu jornal, um e outro surgem entre os jogadores mais pontuados ao longo das 30 jornadas do nosso campeonato. Mais, numa lista encabeçada pelo melhor dos melhores, William Carvalho, Adrien e Cédric surgem como “os portugueses que se seguem”.

Pois é, caro João, isto não é uma questão dos Sportinguistas acharem isto ou aquilo. É uma questão de lógica, de justiça e de honestidade. Coisa que lhe vai faltando a si e ao seleccionador nacional. Acredito que ache normal a pré-selecção de Cavaleiro em vez de Mané (importa-se de publicar os números de um e de outro, sff?), a chamada do Almeida em vez de Cédric (importa-se de publicar os números de um e de outro, sff?), a surpresa André “15 milhões de tretas” Gomes em vez de Adrien Silva (importa-se de publicar os números de um e de outro, sff?). Aliás, se bem me recordo, foi o jornal por si dirigido que chegou ao ponto de aventar o nome de João Cancelo (quem?!?) como possível lateral da nossa selecção. Tal como me ri, o quanto me ri, com o folclore em torno de Bernardo “eu sou o messi do seixal” Silva, num ribombar que facilmente seria silenciado atentando, por exemplo, nos números de Iuri Medeiros (importa-se de publicar os números de um e de outro, sff?).

Nada disto importa, claro que não. Tal como não importou que Carlos Queiróz tivesse deixado Moutinho fora dos convocados, alimentando a ideia de que não era convocado por jogar no Sporting. Tal como não importou, que um tal de Nelson Oliveira fosse convocado sem ter marcado o raio de um golo ao serviço da principal equipa do seu clube. E importa lá que, sem os jogadores saídos da formação do clube que o João tenta denegrir, enxovalhar, diminuir, esta selecção valesse menos do que uma Polónia. Que o seu “glorioso” tenha tido que esperar 28 jornadas para festejar um golo marcado por um português ou que um clássico vermelho e azul não tenha um único jogador nacional a titular. O que interessa, isso sim, é promover a marca Benfica e o seu lugar entre os fiéis guardiões da águia.

Mais logo, à hora de jantar, pode ser dado mais um passo nesse engrandecimento feito de mentiras. Basta convocar três “manéis” (pergunte o significado ao seu treinador, sff) para a nação vermelha e branca se agitar num sorriso patético, vangloriando-se de ter mais convocados do que o Sporting, o único dos três grandes que defende a formação e o jogador português. Acontece que, daqui por três semanas, vão ter que ser os jogadores formados em Alvalade a segurar as pontas de uma selecção sem ponta por onde se lhe pegue. Com jeitinho e à semelhança do que fez aquando da eleição do melhor jogador do mundo, o meu querido João ainda arranja forma de trocar um brilharete do Cristiano Ronaldo pela potencial chegada de um argentino para o Dubai, com escala em Lisboa.
Mas a culpa não é sua. A culpa é de quem continua a passar-lhe a carteira profissional e de quem continua a comprar e a clicar naquilo que atraiçoa a função de um jornal. E é uma chatice haver cada vez mais gente atenta a tudo isto, não é, João?