quaresmaDurante muito tempo, mais do que o desejado, temos vindo a discutir a necessidade do Sporting formar não apenas grandes jogadores, mas também homens, que tenham em si os valores desportivos que a nossa instituição tanto apregoa. E se é verdade que nos temos vindo a destacar no âmbito desportivo, com jogadores de classe europeia a saírem das nossas escolas ano após ano, muitos têm sido os desaires e as desilusões, já discutidas e muito esmiuçadas nas paredes da Tasca.

Eric Dier, Ilori, Bruma, Moutinho, Simão e até numa escala menor como Zé Turbo, José Postiga, Agostinho Cá ou Alexandre Guedes, foram nomes que nos ficaram marcados por aspectos mais negativos do que positivos. Não foi apenas por terem saído do Sporting, todos os jogadores têm direito de procurar uma vida melhor e querer ganhar mais dinheiro ou títulos, foi sim a forma como escolheram sair. Recusas em renovar ou treinar, palavras pouco simpáticas para com o clube que lhes deu praticamente tudo a nível profissional, e o arrastar de novelas na imprensa, com tentativas de prejudicar a imagem do seu clube, fizeram com que muitos duvidassem da necessidade de uma escola de elite que forma homens de distrital.

Ricardo Quaresma foi, em tempos, a grande promessa do futebol nacional e um dos pilares essenciais do último título conquistado pelo Sporting. Saiu por uns milhões para o Barcelona, onde esperavam o novo Figo e o pintaram como o próximo Bola de Ouro. Não aconteceu. Quaresma teve de refazer a sua vida num rival, onde foi ídolo dos adeptos e da bancada, onde marcou e deu a marcar e onde regressou aos olhos da Europa como craque renovado.
O resto da sua carreira foi acontecendo como a conhecemos. Nunca atingiu o potencial esperado, nunca foi o Quaresma que vimos em Portugal e o acumular de problemas disciplinares despertaram em todos nós a sensação de que estaria perdido. O regresso ao Porto de Paulo Fonseca correu tudo menos bem. Seguiu-se Lopetegui, que via nele um portista demasiado acesso para o seu gosto mais mediocre e ponderado. A obsessão táctica do espanhol não dá grande espaço a artistas do gabarito do Mustang e muito menos permite que um jogador se realce no campo não só pelos golos mas também pelas atitudes. Ainda assim, sem ele teria sido impossível vencer o Bayern de Munique e parecia até o único inconformado com um empate na Luz que foi aceite pelo mundo azul com uma tranquilidade chocante.

Quaresma aprendeu a amar outro clube. E por muito que nos doa perceber isso, a verdade é que o próprio Sporting tem culpas no cartório ao não recuperar (por duas vezes) um dos maiores talentos saídos da nossa escola de valores. Mas o Mustang nunca se pronunciou contra o clube que foi dele e que fez dele aquilo que é. Nunca foi capaz de por o dedo na ferida em momento de maior aperto para o mundo verde e branco. Nunca provocou Alvalade, nunca falou dos adeptos e a todos os assobios baixou a cabeça e continuou o seu jogo.

Em muitos sportinguistas ficou o sentimento de que a história de Quaresma de verde e branco é um conto inacabado, que talvez merecesse um desfecho bem diferente daquele que já se veio a confirmar. E é por isso que a cada rumor de regresso, a cada fotografia tirada em Alvalade, a cada comentário no Twitter o mundo verde exalta e aguarda pela chegada de Quaresma, para que acabe a carreira onde mais sentido faria acabar: junto de quem o viu nascer para o futebol. Provavelmente nunca será possível e Quaresma vai terminar os seus dias profissionais bem longe de terras lusitânas e bem longe das nossas bancadas. Mas fica a certeza de que, neste caso, o Sporting cumpriu a sua missão bem cumprida: incutiu naquele jogador, se não o amor eterno, o respeito imenso à instituição de todos nós. Para mim basta-me isso, pois não posso pedir a um futebolísta que seja adepto nem a um adepto que seja jogador. A cada parte o seu papel e o de Quaresma foi cumprido com uma elevação que me orgulha.
Será bom ver-te de novo, Mustang.

*às terças, a Maria Ribeiro mostra que há petiscos que ficam mais apurados quando preparados por uma Leoa