Em vésperas de derby com o rival de sempre e olhando para a tentativa hipócrita e desesperada do mesmo em construir uma imagem falseada de que o Sporting está a ser beneficiado pelas arbitragens, é preciso desmontar esse mito e denunciar o que toda a gente sabe mas poucos dizem: O Sistema está vivo e bem vivo. Provavelmente, nunca foi eliminado. E como qualquer cancro que não é extirpado a tempo, acaba por regenerar-se, criar defesas e, eventualmente, proteger-se daquilo que o ameaçou no passado.

Qual a diferença do Sistema antigo para este? Na essência, nenhuma. O objectivo continua a ser a prática de influência sobre os órgãos de poder que regem o futebol português e daí retirar vantagens que aproximam os clubes dominadores dos seus objectivos desportivos e, consequentemente, financeiros. O que mudou foi o método para exercer essa influência e o clube que a pratica. Mas já lá vamos.

Como é óbvio, quem domina o Sistema domina a FPF e os dois órgãos com maior poder de influência e decisão no futebol: Comissão de Arbitragem e Conselho de Disciplina. Um dia, o presidente do Carnide disse que ter lugares nos órgãos de poder é mais vantajoso do que comprar bons jogadores. E foi aqui que o Orelhas investiu. O Orelhas apanhou os cacos de um Sistema destruído com o Apito Dourado e construiu outro, mais sofisticado, refinado e mais capaz de se defender contra as suspeitas de corrupção. Começou por levar ao poder o actual presidente da FPF, Fernando Gomes, que tinha saído a mal dos fruteiros e com ele “enfiou” toda a entourage vermelha que lá gravita, entre eles Humberto Coelho, João Pinto. Tudo isto foi feito numa altura em que os fruteiros ainda sofriam as consequências do Apito Dourado, o que motivou um normal distanciamento de todos os que, na altura, lhe eram leais e com a maior crise da história do Sporting que, no meio das suas disputas internas, não foi capaz de perceber e acompanhar esta mudança do tabuleiro. Sim, é verdade que durante estes anos o Carnide construiu algumas grandes equipas e teve o mérito de ter um grande treinador nas suas fileiras. Porém, a maior obra do Orelhas foi mesmo este Sistema, porque garante o sucesso mesmo quando a sua equipa é obrigada a desfazer-se dos seus melhores jogadores inclusive, dando-se ao luxo de os vender em Janeiro, exactamente o contrário do que uma equipa que quer ser campeã normalmente faz. Aquilo que o país chamou de “colinho” no ano passado e no ano anterior. No fundo, aquilo que o presidente encarnado esperava continuar a ter este ano e que até estava a correr bem não fosse o Sporting estar a responder, de forma agressiva e eficaz, tanto dentro do campo como fora dele.

Voltando ao método, o que realmente mudou? A forma de se praticar corrupção. Provavelmente, devido a esta sofisticação nos métodos, já nem esse nome lhe podemos chamar. Hoje, em vez de termos árbitros a viajar para o Brasil ou a receberem “conselhos matrimoniais” dos dirigentes, temos árbitros que vivem sob coacção permanente de verem a sua carreira por um canudo. Está aí Marco Ferreira para o confirmar, um árbitro que em determinado(s) jogo(s) não cumpriu as “directrizes” do patrão Vítor Pereira, prejudicou pontualmente agremiação vermelha e acabou escorraçado e excomungado da arbitragem. Portanto, é aqui que está o grande reforço do Carnide, Vítor Pereira. O presidente da CA é o único que tem o poder de “gerir” (leia-se, manipular) as classificações dos árbitros e, consequentemente, o único que pode punir ou premiar um árbitro por determinada prestação num jogo e, como tal, tem as carreiras de todos eles nas suas mãos. Nunca, nem mesmo na altura do domínio fruteiro, um gajo tão incompetente e tão criticado por todos os clubes foi tão protegido e tão acarinhado por um só clube. E isto é algo para a lampionagem reflectir. Porquê agora a súbita defesa da arbitragem? Porquê este apoio visceral a Vítor Pereira? Os mesmos que disparavam, com razão, contra tudo o que representou o Apito Dourado são os mesmos que agora disparam contra os “incendiários” e os “condicionadores” dos árbitros. A hipocrisia do Carnide é total e descarada. Como o seu Sistema lhe agrada e dá frutos, hoje falar dos árbitros já é uma “falta de respeito”. Antes, quando eram as vítimas, era um “combate pela regeneração do futebol português”.

Um bom exemplo desse domínio verificou-se há bem pouco tempo na AG da Liga onde a maioria dos clubes votou a favor do sorteio condicionado dos árbitros, uma espécie de cartão vermelho ao Vítor Pereira. O assunto foi remetido para a FPF ratificar e o que é que aconteceu? Chumbou. E Vítor Pereira continuou no cargo. Ou seja, o Carnide exerceu a sua influência onde realmente a tem, na FPF, e nem sorteio nem despedimento de Vítor Pereira. E tudo continuou na mesma, como tanto convém ao clube do Sistema.

Porém, dois novos acontecimentos surgiram. Primeiro, o Kit Cortesia do Carnide, denunciado por Bruno de Carvalho. E depois, as pressões de Vítor Pereira aos árbitros dos jogos do Carnide, denunciadas pelo ex-árbitro Marco Ferreira. Estamos a falar de duas situações que, oprovavelmente, já ocorrem há muito tempo mas que só agora foram denunciadas. E esta é a principal característica deste Sistema recauchutado, a cultura do medo e o temer de represálias. O medo de denunciar, o medo de descer na carreira, o medo de perder um emprego muito bem remunerado numa altura de crise, o medo de agitar as águas. Foi preciso um árbitro ser despromovido para se saber de alguns podres deste Sistema. Por aqui se vê também a falta de qualidade e imparcialidade do jornalismo em Portugal, e o papel fundamental de um dos braços armados do Sistema. Em circunstâncias normais, os jornalistas são os primeiros interessados a escavar fundo até chegar à verdade. Neste, onde o jornalismo é o primeiro a enfatizar, ignorar ou branquear conforme a cor clubística, acabam por ser um Key Player na estratégia encarnada e um elemento fulcral para o funcionamento do Sistema. Na maioria das vezes, a imprensa acaba por matar o mensageiro em vez de investigar a mensagem. A maior vítima disto é Bruno de Carvalho que, não fosse ele tão resiliente e persistente na defesa do Sporting e das suas convicções e não estivesse a ter resultados tão positivos em tão pouco tempo de mandato, e provavelmente, já teria caído pela imagem fabricada dos jornalistas e comentadores avençados.

São estes novos dados que, temporariamente, acabaram com a vergonhosa tentativa de eliminar o Sporting da luta pelo título nas primeiras jornadas. A estratégia estava perfeitamente montada (5/6 primeiros jogos do campeonato consecutivos a prejudicar o Sporting). O problema é que não contaram com a competência dos jogadores e treinador, que foram capazes de ultrapassar esses obstáculos e não contaram com a denúncia de Bruno de Carvalho feita na televisão. Hoje, já custa mais a um árbitro marcar um penalty contra o Sporting em todo e qualquer lance de contacto dentro da área. Mas isto é sol de pouca dura. A Comunicação Social, fiel escudeiro do Carnide, já vai passando a teoria de que o Sporting está a ser beneficiado, algo que as primeiras jornadas se encarregam de desmentir. E quando os assuntos do Kit Cortesia e das pressões do Vítor Pereira antes dos jogos do Carnide morrerem, porque vão morrer, retomar-se-á o rumo habitual.

A questão dos vouchers, sendo difícil provar corrupção (apesar de ser fácil estabelecer uma relação causa-efeito porque o “colinho” apareceu precisamente na mesma altura em que este Kit começou a ser oferecido, uma relação que ainda nenhum comentador televisivo teve a coragem de fazer) não é mais do que a arrogância e a soberba do Carnide em demonstrar que domina o Sistema e que pode fazer praticamente tudo sem quaisquer consequências. Não tenhamos ilusões, só “arrisca” oferecer este tipo de prendas, com esta natureza (jantares de luxo) e aos alvos que foram (árbitros, delegados, observadores) quem sabe que tem a máquina muito bem montada e domina as instâncias disciplinares do futebol português. É um pouco como a Máfia que tem a polícia no seu bolso e continua a operar a seu belo prazer com a segurança de saber que ninguém vai preso. E para simplificar a questão, pelos últimos inquéritos e notícias, já sabemos que os vouchers existem, já sabemos que ultrapassam o valor estipulado e já sabemos que uns utilizaram e outros não. Mas o que interessa à FPF é saber como se sentiram os árbitros ao receberem essas ofertas e, numa manobra muito inteligente, imiscuir-se de punir uma irregularidade provada por não se conseguir provar outra (corrupção). É isto que está em questão, o simples acto de oferecer algo acima do valor estipulado pela Uefa é ilegal e tem uma pena prevista, independentemente de estados de espírito, de sentimentos ou de qualquer outra granada de fumo que atirem. Mais um episódio que vai figurar nos anais da impunidade do futebol português.

A pergunta que se põe é a seguinte: o que ganham os dirigentes comprometidos com o Sistema?Se os árbitros, delegados e observadores recebem jantares de luxo, o que receberá, por exemplo, o verdadeiro ponta de lança do Carnide, Vítor Pereira? Esta é fácil! Apoio político, um emprego bem remunerado e a oportunidade de continuar a ter o poder de influenciar os destinos da arbitragem portuguesa. Coisa pouca. Esta é a nova corrupção. Com a crise financeira surgem novos incentivos. Aquilo que antes era resolvido com uma viagem, uma prostituta ou uma mala de dinheiro hoje custa muito menos e o simples apoio político juntamente com o exercício de um poder real chega e sobra para se “formar” um ponta de lança. Hoje, mais do que o pagamento em dinheiro ou em géneros, vale mais um apoio político, a manutenção de um cargo influente, um emprego na televisão ou nos diários desportivos.

Portanto, é isto que temos. Um Sistema renovado e que já não precisa de prevaricadores apanhados em escutas mas antes de dirigentes sedentos de se perpetuarem nos cargos que ocupam e que sobrevivem à custa dos apoios que os clubes lhes dão. Um Sistema que abarca tanto o dirigente cuja voz ninguém ouviu, como o observador que ninguém conhece, como o árbitro que quer subir na carreira, como o jornalista que escreve a peça ou o comentador avençado instruído à prori. Um Sistema que começa nos silêncios da Estrutura do Carnide mas acaba nos soundbytes e na berraria dos seus avençados na televisão. E no meio destes silêncios e berrarias, o Orelhas lá vai exercendo a sua influência nos órgãos que controla, nomeadamente na FPF. No fundo, está a mostrar ao Bufas como se faz. Sem escutas, sem castigos, sem compromisso…sem espinhas! Eis o Sistema 2.0. Mais robusto, mais abrangente, mais sofisticado e com uma cor bem mais viva do que o seu predecessor.

Assim sendo, deixo um conselho a todos os sportinguistas. Esta teoria que estão a tentar vender cai por si própria, de tão forçada e ridícula que é através daquela manobra clássica de relembrar apenas o último jogo ou a última imagem e esquecendo tudo o que se passou antes. Ainda no último Prolongamento a Morsa tentou vendê-la ao preço de um penalty perdoado em Arouca, de um penalty fruto de um lance em offside contra o Estoril ou de uma expulsão de um jogador do Nacional. Felizmente o Pina, desta vez bem preparado e documentado, demonstrou que até nos jogos que o badocha referiu existiram irregularidades claras e evidentes que prejudicaram o Sporting. Aquilo que se passou nas primeiras jornadas está à vista de todos. E já agora, aquilo que se tem passado nos últimos anos também.

PS: Para provar quem domina o Sistema dei o exemplo da não ratificação dosorteio na FPF quando a maioria dos clubes da Liga votou a favor, da provável não punição do Kit Cortesia ou da não averiguação das palavras de Marco Ferreira. Mas podia falar dos castigos preventivos ao presidente do Sporting, do diferente tratamento nos casos das tochas, do castigo “preventivo” ao Naldo, da divulgação de classificaçōes dos árbitros nuns jogos e do total secretismo noutras. Ainda estou à espera do castigo relativo aos mesmíssimos factos que ocorreram em Madrid na Champions e que por muito pouco não foram punidas com jogos à porta fechada, factos esses cuja única diferença foi terem acontecido em Alvalade há cerca de 1 ano atrás. Ou do castigo célere aplicado aos factos que ocorreram no Bessa (tochas lançadas para o relvado) mas que, vá-se lá saber porquê, não mereceram o mesmo tratamento no jogo da Supertaça que até ocorreu há mais tempo. Entre muitos outros exemplos.

* todas as sextas, directamente de Angola, Sá abandona o seu lugar cativo à mesa da Tasca e toma conta da cozinha!