Antes de lerem o que vou escrever a seguir, tenham bem presente que guardo memória bastante vívida do muito que o FcPorto contribuiu durante décadas para que tenhamos um futebol acicatado por discursos extremistas, por ódios e estratégias de vilanização de terceiros, de esquemas de orquestração de interesses com fins anti-desportivos. Essa é a história verdadeira da ascensão do clube azul e branco e custe o que custar aos seus adeptos, a verdade é que o Império de Pinto da Costa não foi só erigido em cima de grandes equipas e grandes treinadores (que os teve). Não. A hegemonia do FcPorto teve como passadeira vermelha, as texturas e os pigmentos da corrupção e do compadrio.

Hoje em dia, salta à vista a decadência dessa outrora esplendorosa máquina de aliciamento e silêncios e por mais que os traumas nos obriguem a levantar sobrancelhas e a resguardar as costas em alguma parede próxima, a verdade é que o aprendiz Vieira suplantou (e muito) o engenho e a extensão do compromisso que Pinto da Costa conseguiu criar sobre os agentes reguladores do futebol português (arbitragem, disciplina, justiça, polícia, etc). Realisticamente, desconstruindo a personagem de Luis Filipe Vieira e relacionando a sua “escola de vida” com a ascensão no Benfica, só se podia esperar os resultados que estão hoje à nossa frente.

Depois de 4 campeonatos seguidos, tanto Porto como Sporting tiveram um duro acordar para uma realidade onde já pouco resta dos seus poderes…e o que se vai mantendo é um reduzido espaço natural dos dois clubes, garantido pela pressão social dos seus adeptos, afinal de contas nem todos os cargos, em todas as empresas pertencem a adeptos encarnados, nem todas as funções, em todos os organismos estatais estão “reservados” a afiliados do clube da Luz. O mesmo já é mais difícil de dizer na Comunicação Social e nos vários lugares de poder dentro do futebol especificamente.

Aos dois emblemas restava uma de suas soluções: caminhar sós e de costas voltadas, permitindo ao Benfica continuar o autêntico passeio que tem feito pela Liga (dando-se ao luxo de ter um treinador pouco carismático, taticamente mediano e plantéis cheios de soluções que não teriam lugar nos clubes rivais) ou tentar conjugar forças em alguns pontos fulcrais que podem fazer mossa nos cordões que puxam as marionetas do poder. Ao contrário de muitos Sportinguistas, não receio qualquer aproximação institucional ao clube nortenho, o que nos podiam atingir estando mais próximos fá-lo-iam muito melhor estando distantes e se formos completamente honestos, o que podem obter com uma estratégica congregação de posições, não favorece apenas o interesse de ambos e estará muito mais perto de atingir sucessos que se aproximem do significado de “justiça” ou “verdade”.

O FcPorto, neste momento, é o “menor de dois males” para o Sporting e rejeitando convictamente palavras como “alianças” ou “parcerias” para lá do que são medidas concretas, não devemos (se calhar nem podemos) dar-nos ao luxo de repetir tiques de “nobre decadência” impoluta e imaculada, vista por quem decide o que quer que seja no futebol português como um salvo conduto para nos continuar a tratar como os verdadeiros culpados dos males que graçam no futebol português. Sem repararmos estamos a escrever a nossa história recente com a fama e sem qualquer tipo de proveito e isso é algo que nos deve revoltar e obrigar a uma resistência feroz. Calando e obrigando-nos uns aos outros a estarmos calados, adiaremos por tempo indeterminado a nossa própria legitimidade em nos considerarmos candidatos a mais do que os restos, a mais do que Vieira já não consegue comer.

Na cabeça dos dirigentes leoninos deve estar sempre a certeza do que é “justo” fazer em cada ocasião, o que vai beneficiar o futebol português a longo prazo, o que nos aproximará de outros futebóis mais dinâmicos, bem geridos e bem disputados, mas também onde estão os podres da “máquina lampiã” e como se limpam. Consigo imaginar facilmente a nossa incapacidade (e a dos dirigentes portistas) para começar sequer a “ver o mapa”, quanto mais mudá-lo. Consigo facilmente imaginar o quão escudado e impermeável é este esquema montado por Vieira ao longo de 10 anos. Talvez o capital de experiência de portistas em decifrar os códigos dos compadrios e a energia (e legitimidade) dos sportinguistas em denuncia-los acabe por ser exactamente o que o nosso futebol precisa nos tempos mais próximos.

Quem destrói um poder, quer ocupá-lo e mais tarde mantê-lo. E até neste sentido é bom que Porto e Sporting não destruam e construam poderes sozinhos ou que se venham a reconhecer como um poderes exclusivos. A minha eterna ingenuidade e crença no ser humano, faz-me sempre acreditar que os bons prevalecem, nem que seja na história das coisas e na memória das pessoas. Para Pinto da Costa essa oportunidade já passou desaproveitada, tão titulado e jubilado de glórias como símbolo da podridão e vergonha. BdC ainda tem todo o caminho disponível e o cadastro limpo, que assim o mantenha. Por agora a aproximação favorecerá apenas o que é certo, depois…logo veremos.

*às quartas, o Leão de Plástico passa-se da marmita e vira do avesso a cozinha da Tasca