Um pouco por todo o mundo, clubes voltam à sua vida normal. Novos treinadores entram, reforços conhecem as instalações, jogadores regressam, emprestados são avaliados, adeptos renovam os seus lugares anuais, discutem contratações e dispensáveis.

No Sporting, no entanto, fazemos questão de ser muito mais filosóficos do que isto. Porque para nós gostar de um clube de futebol tem-se revelado um esforço muito mais complexo do que a simples presença no estádio, do que a celebração ou crítica. E enquanto outros iniciam mais um ano de projecto desportivo, o Sporting discute nesta altura, tal qual um adolescente, o seu lugar no mundo, o seu propósito e o que quer fazer quando crescer.

Não é por isso de admirar que o anúncio das novas camisolas tenha sido feito de forma discreta, sem grande entusiasmo da nossa parte. Que os reforços sejam absolutos desconhecidos para todos nós. Que o treinador se tenha transformado mais num “meme” do que num homem competente e que, se alguém nos perguntar no café quem é o presidente do Sporting, bom… não sabemos bem.

Neste momento, e desde há um tempo para cá, o Sporting é o clube que odiamos amar. O nosso ADN diz-nos que são aquelas cores, aquelas camisolas, aquelas pessoas que merecem o nosso apoio, mas por algum motivo o nosso corpo fica tenso, constrangido, sem grande reacção. E respiramos fundo até nos lembrarmos que até Setembro teremos este sentimento tão presente.

Já tivemos os nossos problemas. Já estivemos absolutamente fartos de apoiar um clube que se recusa a cumprir o seu desígnio. Já nos cansámos mil vezes da capacidade que o Sporting tem de se ferir constantemente a si mesmo. Mas normalmente a coisa passava entre cervejas, num dia de bola, com uma tacinha aqui e ali, uns reforços porreiros e uns jogadores da formação. Desta vez nada passa. Porque sempre que ao fundo do túnel vemos um mínimo sinal de estabilidade, tudo cai com estrondo outra vez. Sempre que uma modalidade vence o mais pequeno troféu, o futebol profissional tem mais um espectáculo montado na praça pública, que nos impediu e impede de desfrutar de uma temporada histórica que terminou com tanta alegria.

Não elegi as pessoas que estão a “gerir” o Sporting. Não lhes vejo competência, credibilidade ou ideias que me permitam estar confortável com a sua presença. Cada intervenção é um momento tão embaraçoso que já desisti de me interessar sequer. Mas exijo que assumam estes papéis a que se Auto propuseram com seriedade e que se esforcem, pelo menos, para nos dar uma ideia de normalidade. Essa normalidade inclui recusar as ofertas do Super Agente, inclui uma pré-temporada preparada e competitiva, inclui oportunidades aos jogadores da nossa formação e, nesta realidade paralela em que vivemos, a resolução dos processos com os jogadores que rescindiram.

Quando começaram a sair os nomes destes jogadores, desejei com todas as forças que fossem arrastados a tribunal, que tivessem de pagar cada cêntimo do contrato que acabavam de rasgar com o clube que, a mal ou a bem, tantas condições lhes deu de jogar futebol. Cedo se percebeu que a intenção destes atletas nunca foi a de rescindir mas sim forçar uma transferência “a bem” do Sporting, por valores manifestamente inferiores ao seu real preço, aproveitando-se do momento turbulento e do sofrimento de milhões de leões por todo o mundo.

Hoje, talvez a quente, só quero que cada um deles seja colocado noutros clubes, que o Sporting seja pago e que nunca mais regressem a Alvalade. Deixei de me importar com o valor, com o que vamos ganhar. Quero que tenham aquilo que tanto queriam, que tão ardentemente desejam, e que um dia olhem para trás na carreira e se lembrem daquele clube simpático, em Lisboa, onde disputaram grandes jogos, onde jogaram competições europeias e lutaram por títulos, foram tratados como filhos da casa e que nunca mais na carreira jogaram num clube com tanta paixão e com adeptos tão loucamente dedicados. Precisamos que a sombra de todos eles desapareça, para permitir a normalidade aos que ficaram.

paulinho

*às quintas, a Maria Ribeiro mostra que há petiscos que ficam mais apurados quando preparados por uma Leoa