Nos últimos dias tenho ouvido gente, que muito respeito, dizer enormidades como “ah e tal, é jogar cada jogo com os melhores” ou “em Inglaterra jogam 2 vezes por semana e não se queixam”. Pois, acho tudo muito bonito, encarar tudo e todos de peito feito e ligar o achómetro a alta velocidade, o pior é que nem tudo se resolve com fezada e dois pés no analfabetismo fisiológico.

Cada vez mais, o futebol é velocidade. É choque. É estar sempre no sítio certo, sendo que este é por todo o lado a toda a hora. O mediatismo e imediatismo do desporto e a velocidade a que a informação circula, tudo provoca uma pressão constante e muito intensa na psique dos atletas. Somando estas 4 componentes, podemos concluir, sem ter jogado no Damaiense, que um jogador de futebol titular de uma equipa que dispute títulos numa Liga do top 8 europeu…é um enorme atleta no mínimo e com uma fortaleza de carácter assinalável.

Diego Costa é o avançado referência do Chelsea, um dos mais utilizados na Liga Inglesa, tem 2.686 minutos de jogo. Slimani tem 2.663 minutos. Rui Patricio tem 3.046 minutos e se compararem com os guarda-redes dos 6 ou 7 primeiros classificados (Joe Hart, DeGea, Ceh, Mignolet) posso vos dizer que é um dos mais usados. Conclusão? Sim, em Inglaterra, a terra dos futebolistas que não precisam de descansar…também já se gere o plantel. Então, perguntam vocês, se é assim tão normal fazer alguma rotatividade nos plantéis e se em todo o lado isso já faz parte da realidade competitiva, porquê tanta discussão no Sporting sobre quem e quando poupar? Pois…na verdade só posso responder que talvez devido a dois fenómenos externos, os media tenham criado em Portugal uma espécie de tópico só válido para uma equipa, neste caso, o Sporting.

Os dois fenómenos que mencionei são obviamente a exagerada rotatividade do mestre Lopetegui (um esquema aritmético e cego aos ciclos de forma e desempenho dos atletas) e a falta de rotatividade no Carnide (que tarde descobriu um onze base e agora não consegue criar nuances alternativas aos titulares). Estes dois fatores e porque os nossos media afunilam sempre que podem os problemas todos para Alvalade…têm criado uma espécie de debate fetiche, onde cabem todas as teorias e cenários menos o óbvio. Os atletas não podem, sem que acusem perda exibicional ou provocar lesões de fadiga, jogar as partidas todas que se deseja.

Eu sei que dá muito jeito atacar JJ por “rodar” o plantel na Liga Europa. Dá para criar um cenário de falta de coragem competitiva ou erro de julgamento. Juro que ouvi um palhaço lampião qualquer noutro dia qualquer a dizer que “JJ disse que era um sonho conquistar a LE!” como se isso fosse uma conta para pagar. Como se fosse um crime encarar a LE como exatamente o que é – menos importante que o título nacional. Vamos lá ver, ninguém gosta de perder. Em nenhum jogo. Mas lembro-me de um certo jogo no dragão na temporada passada…em que depois de um jogo desgastante europeu com o Wolfsburgo, quebrámos à grande na segunda-parte, resultado, perdemos 3-0…no final da partida, Marco Silva afirmaria que a equipa…estava cansada. Elementar.

Acho que em vez de andarmos a contribuir para as críticas (intencionais ou não) sobre a gestão do plantel por parte de JJ, devíamos todos enaltecer a coragem deste treinador, que goste-se ou não, pelo menos assume que mais vale ter hipóteses de ficar com um pássaro na mão do que provavelmente ver dois a voar. Na alta competição a palavra “arriscar” já não consta em nenhum dicionário, tudo é previsto e as apostas incidem sempre no cenário que prevê mais concentração de capacidade e nos jogos mais prioritários. Ninguém tem garantias de nada, mas quando vencemos o Carnide por 3 golos na Luz, muito poucos se dedicaram a reparar como nos exibimos sempre mais desenvoltos fisicamente que o adversário, ou como contra o Porto da hiper-rotatividade de Lopetegui, não ficou visível a ninguém que fossemos inferiores em disponibilidade atlética. A poupança de jogadores não vence partidas, provavelmente até faz com que não se ganhem algumas, mas a verdade é que se não for feita…perder-se-ão algumas mais. É que nem todos os clubes beneficiam de colinho e sendo que o Sporting enfrenta dois crónicos utentes desse serviço…é só juntar as peças e entender que o nosso clube, mais do que outros, tem de prever todos os cenários. Até os que ninguém analisa.

Vou ser mesmo sincero, se tivesse que escolher entre vencer em Guimarães e passar a eliminatória frente ao Bayer, preferia os 3 pontos na cidade-berço. E para ser coerente com tudo o que escrevi antes, não dá para dizer “eu quero os dois cenários, sem fazer escolhas”. Gerir um plantel é sempre fazer escolhas e nesta fase da época não há “tempo” para recuperar de “más escolhas”. Para mim a equipa titular na Alemanha seria: Patricio; Schelotto, Jefferson, R.Semedo e Ewerton; William e Adrien (metade do jogo cada um), Aquilani e A.Martins; Matheus, Mané e Teo. Não chegam para ganhar? Azar. A equipa para Guimarães tem de ser protegida (R.Patricio, Pereira, Zeegelar, Coates, R.Semedo, William, Adrien e J.Mário; Ruiz, Gelson e Slimani.

Pode haver quem discorde e eu respeito, mas nesta hora de decisões há que atirar ao prémio mais elevado sem hesitações e para mim o título ou apuramento directo para a Champions são inquestionavelmente os objectivos mais importantes da época.

p.s. – Fiquem com um apanhado dos jogadores com mais de 360 minutos (4 partidas completas) contabilizando todas as provas oficiais da época 2015/16 (*saiu do clube)

Sporting > 25 jogadores
Rui Patricio, Boeck*, Esgaio, Schelotto, J.Silva*, Jefferson, Zeegelar, J.Pereira, Naldo, R.Semedo, T.Figueiredo, P.Oliveira, Ewerton, Aquilani, Adrien, B.Cesar, Gelson, J.Mário, William, Carrillo, Matheus, Ruiz, Montero*, Slimani, Teo e Mané
Com menos de 4 jogos completos: Zug, Coates, Barcos e A.Martins

Benfica > 20 jogadores
J.Cesar, Jardel, A.Almeida, Lisandro, N.Semedo, Luisão, Eliseu, Silvio, Lindelof, Talisca, Samaris, Pizzi, Fejsa, G.Guedes, Carcela, R.Sanches, Gaitan, Jimenez, Jonas e Mitroglou
Com menos de 4 jogos completos: Ederson, P.Lopes, Grimaldo e Salvio

Porto > 24 jogadores
Casillas, Helton, Indi, Maicon*, Maxi, Marcano, Layun, Angel, V.Garcia, Imbula*, Herrera, R.Neves, A.André, Danilo, Evandro, S.Oliveira, Brahimi, Tello*, Corona, Aboubakar, Osvaldo, Varela, Suk, Bueno
Com menos de 4 jogos completos: Sá, Chidozie, Marega e A.Silva

 

*às quartas, o Leão de Plástico passa-se da marmita e vira do avesso a cozinha da Tasca